domingo, 18 de outubro de 2015

Maioria das “pedaladas” foi para grandes empresas e agronegócio


15 de outubro de 2015 
Dyelle Menezes
As “pedaladas fiscais”, como mencionou o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, serviram para subsidiar os pagamentos de benefícios sociais, como o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida. No entanto, a maior parcela dos recursos oriundos das manobras foi destinada ao subsídio para as grandes empresas, por meio do Programa de Sustentação do Investimento (PSI) do BNDES, e empréstimos para empresas do agronegócio, por meio do Banco do Brasil.
De acordo com o relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) a “omissão dos passivos da União decorrentes de atrasos nos repasses de recursos federais impactaram as contas da dívida pública em cerca de R$ 40 bilhões no exercício de 2014”. O TCU apontou que o Bacen não computou, no cálculo da Dívida Líquida do Setor Público, passivos da União junto ao Banco do Brasil, ao BNDES e ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).
PEDALADASDo total de “pedaladas”, R$ 12,16 bilhões são referentes ao montante da equalização de taxa de juros devido pela União ao BNDES no âmbito do PSI. O programa foi criado para estimular a produção, aquisição e exportação de bens de capital e a inovação. O grande empresariado não só gostou, como fez fila para pegar recursos do PSI.
No entanto, o programa gerou essa dívida de R$ 24,5 bilhões acumulada com o BNDES, mas o custo não é só esse. O PSI é realizado com taxa supersubsidiada, porém todos os empréstimos do BNDES são com taxas mais baixas do que as que o Tesouro paga.
Já os valores devidos pela União ao Banco do Brasil relativos aos itens “Tesouro Nacional – Equalização de Taxas – Safra Agrícola” e “Título e Créditos a Receber – Tesouro Nacional”, inscritos na contabilidade da instituição financeira.
Conforme demonstra o TCU, ao final de junho de 2014, os saldos a pagar referentes às subvenções agrícolas e às demais subvenções alcançavam, respectivamente, as expressivas montas de R$ 7,95 bilhões e R$ 1,80 bilhão.
Juntos, o Banco do Brasil e o BNDES somaram omissão de registro de passivos da União na ordem de R$ 21,9 bilhões, o que representa cerca de 54,4% do total de R$ 40 bilhões das “pedaladas fiscais”.
Quanto ao FGTS, que tem como agente operador a Caixa Econômica Federal, além do saldo relativo a adiantamentos efetuados pelo FGTS à União no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida, foram identificados dois outros créditos junto à União. Um deles, com saldo de R$ 638,4 milhões ao final em setembro de 2014, representa valores relacionados à Resolução do Conselho Curador do FGTS 574/2004. O outro, com saldo de R$ 10,05 bilhões, é decorrente da arrecadação da contribuição social de que trata a Lei Complementar 110/2001.
A Lei Complementar n° 110/2001 autorizou a CAIXA a realizar créditos nas contas vinculadas do FGTS, referentes ao complemento de atualização monetária da aplicação dos percentuais de 16,64% do Plano Verão (janeiro de 1989) e 44,8% do Plano Collor I (abril de 1990).
“Vê-se, portanto, que, por parte do governo federal, restou prejudicada a ação planejada e transparente propugnada na LRF, uma vez que não foram prevenidos os riscos, tampouco corrigidos os desvios que ocasionaram o “desequilíbrio” das contas públicas da União em cerca de R$ 40 bilhões no exercício de 2014, tendo sido geradas e omitidas dívidas em desobediência às condições impostas pela mesma LRF, desrespeitando-se, pois, o princípio constitucional da legalidade, bem como os pressupostos do planejamento, da transparência e da gestão fiscal responsável”, aponta o Tribunal.
Entre as razões pelas quais esses passivos devem ser registrados na DLSP, o Tribunal menciona a existência de financiamento concedido à União, os montantes já são devidos pela União e os valores estão registrados nos ativos do Banco do Brasil, do BNDES e do FGTS.
Dessa forma, o discurso de Lula que tenta justificar o fato de o governo ter desrespeitado a Lei de Responsabilidade Fiscal, com o argumento de que o fizeram para atender aos mais pobres, é falho. Das pedaladas de R$ 40 bilhões, R$ 6 bilhões foram de atrasos à Caixa Econômica para o pagamento de programas como Bolsa Família.
Em coluna publicada no jornal O Globo, de hoje (15), Miriam Leitão afirma que as despesas do Tesouro para carregar a dívida contraída para transferir recursos para o BNDES ou as contas da equalização de taxas de juros provam que a política econômica do PT se destinou aos mais ricos.
“O discurso demagógico de pedaladas feitas para favorecer os pobres é desmentido pelos fatos. O gasto com as grandes empresas foi infinitamente maior do que com os programas de transferência de renda”, afirma.
Miriam destaca que as pedaladas não foram realizadas para pagar os beneficiários do Bolsa Família porque faltou dinheiro, mas tiveram razões eleitorais. “Mas, além disso, os números mostram a quem se destina a maior parte dos subsídios e subvenções pagos pelo Tesouro: às grandes empresas”, aponta.
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Fritura - CELSO MING


O ESTADO DE S.PAULO - 18/10

A atual política nem é de Levy, é de Dilma, que o nomeou para colocar em prática o que vem tentando, até aqui com insucesso

Desde o fim de agosto aumenta o fogo amigo, do PT e especialmente do ex-presidente Lula, para que o governo Dilma demita o ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

As justificativas não obedecem a nenhuma lógica. Isso é como a situação de técnico de futebol que perde vários jogos seguidos: cai porque tem de cair, não importando aí competência profissional nem linha de trabalho.

Há os que argumentam que a política fiscal sustentada pelo ministro Levy é negativa, na medida em que só pede sacrifícios e não aponta para o crescimento econômico e para o sonho de que precisa qualquer mortal. É bobagem pura. A atual política nem é do ministro Levy, é da presidente Dilma, que o nomeou para colocar em prática o que vem tentando, até aqui com mais insucesso do que com sucesso. Além disso, a austeridade na condução das contas públicas não é exigência de um obcecado; é pressuposto do crescimento sustentado que se quer.

Às vezes, as críticas não passam de jogo de palavras. A afirmação do ex-presidente Lula, como se viu nos jornais, de que “o ministro perdeu o prazo de validade” é moldura no vazio. Atribuir a ele a culpa por não ter convencido as agências de classificação de risco a não rebaixar o Brasil também não faz sentido. As decisões das agências foram tomadas com base na irrefutável deterioração das condições da dívida do Brasil, mostradas nos relatórios oficiais.

A recessão braba que aí está não tem nada a ver com as decisões do ministro Levy. Começou antes mesmo de sua posse e suas causas são conhecidas. Tem a ver com os graves erros de política econômica do primeiro governo Dilma, que não mostrou compromisso com a saúde das contas públicas porque deu prioridade a vencer as eleições, não se importando com as consequências.

Mas se for para sacrificar mais esse cordeiro aos deuses, ou o governo optará por alguém que conduzirá a mesma política que Levy não vem conseguindo emplacar ou jogará a toalha, desistirá do cumprimento das metas fiscais e deixará que a inflação se encarregue do serviço principal.

A substituição por outro que pense do mesmo jeito, mas que possa administrar melhor corações e mentes e arrancar algum entusiasmo dos agentes econômicos, só dará certo se o ajuste também avançar e desembocar no equilíbrio das contas públicas.

Mas se a escolha for derrubar o balde, a falta de confiança se encarregará de solapar o investimento e o crescimento futuro.

É a situação em que a inflação rolará solta e, com ela, o governo arrecadará o imposto inflacionário, que nada mais é do que a desvalorização do patrimônio e do salário dos brasileiros. Isso, por sua vez, implicará tirar do Banco Central a condição de guardião da moeda. Será deixar que a política monetária (política dos juros) perca consistência. Não é voltar a vender esperança, como alguns líderes do governo vêm afirmando. É voltar aos anos 80, desistir da estabilidade duramente conquistada com o Plano Real e reinstalar no País a luta feroz pela defesa da sua própria fatia no bolo nacional.

Pedalando o BNDES - SAMUEL PESSÔA


Folha de SP - 18/10

Muito se tem discutido as pedaladas fiscais do governo. Como argumentei em colunas anteriores, o maior estrago desta prática é encobrir a realidade e impedir ou atrasar o debate sério pela sociedade da estrutura do gasto público.

De alguma forma que não entendo, o atual governo avaliou que postergar as inconsistências orçamentárias e acumular débitos escondidos era a estratégia correta para sei lá o quê. Simplesmente me escapa.

Uma das principais práticas de adiar gastos resultou da portaria nº 357 de 15 de outubro de 2012, assinada pelo à época secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, atual ministro do Planejamento. Para entender os efeitos dessa portaria, precisamos compreender como funcionam os subsídios do BNDES.

A taxa básica que baliza os empréstimos do BNDES aos seus tomadores é a taxa de juros de longo prazo, TJLP. Na prática, o banco empresta à TJLP mais um spread para cobrir o custo da intermediação financeira e o risco da operação.

Esse tipo de operação já encerra enorme subsídio, pois a taxa pela qual o Tesouro Nacional se financia é a Selic, muito superior à TJLP. Hoje a Selic é de 14,25% ao ano, e a TJLP, de 6,5%. Os juros sobre um empréstimo de R$ 1 milhão seriam de R$ 142 mil pela Selic, ante R$ 65 mil se empregarmos a TJLP, um subsídio anual de R$ 77 mil. Note-se que a TJLP está abaixo da inflação!

O BNDES considera que seu custo de captação é a TJLP, e não a Selic. O motivo é que a Constituição Federal (CF) direciona ao BNDES os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Adicionalmente a CF fixa que a TJLP será a taxa pela qual o BNDES remunerará o FAT.

Observe-se, entretanto, que ambos, FAT e BNDES, são instituições cujo único controlador é a União. O fato de a CF estabelecer que o FAT seja remunerado pelo BNDES pela TJLP não altera o fato de que o "custo de oportunidade" dos recursos do FAT –fruto da receita das contribuições para o PIS e o Pasep– seja o custo pelo qual o Tesouro capta recursos no mercado, a taxa Selic.

Em outras palavras, o Tesouro sempre pode empregar os recursos do PIS e do Pasep para abater a dívida pública e, portanto, economizar juros atrelados à Selic.

Assim, seja qual for o discurso oficial do BNDES, quando o banco de fomento empresta à TJLP, já está transferindo enorme quantidade de recursos do contribuinte ao tomador do empréstimo.

Como resposta à crise de 2008, criou-se o programa de sustentação do investimento (PSI). No âmbito do PSI, o BNDES empresta a taxas inferiores à TJLP –foram comuns empréstimos a juros fixos de 3% ao ano! A diferença entre a taxa do PSI e a TJLP mais spread de 1% ao ano seria devida pelo Tesouro ao BNDES.

A diferença seria considerada gasto primário do Tesouro na forma de um subsídio. Esse tratamento contábil está correto. A cada semestre o Tesouro deveria transferir ao BNDES o pagamento referente à diferença entre a TJLP e a taxa de empréstimo dos programas do PSI.

Aqui voltamos ao início da coluna (ufa!). A referida portaria dispôs, no 3º inciso do 7º artigo, que os valores somente seriam "devidos 24 meses após o término de cada semestre de apuração". O pagamento do Tesouro ao BNDES foi pedalado por 24 meses.

Criou-se uma dívida do Tesouro para o BNDES que, em dezembro de 2014, estava na casa de R$ 26 bilhões, segundo o balanço do BNDES.

Esse é somente um dos itens que o TCU alega que foram pedalados em explícita violação da Lei de Responsabilidade Fiscal.