O GLOBO - 19/07
No Brasil, prosperam ideias e decisões que merecem a pergunta: numa hora dessas? A equipe econômica tem projeto de repatriação de recursos que foram para fora sem declaração à Receita. No meio de uma operação de nome "Lava-Jato", é hora de correr o risco de anistiar crime de lavagem de dinheiro? O Congresso aumentou despesas públicas, em valores bilionários, no meio da votação do ajuste fiscal.
A Petrobras mantinha nos cargos os indicados do senador Fernando Collor, e um deles, inclusive, trancava a porta da sua sala na companhia. Tanto que a Polícia Federal teve que arrombar para cumprir o mandado de busca e apreensão. E isso, apesar de a Operação Lava-Jato ter mais de um ano, outros indicados políticos estarem na prisão, delatores já terem citado o senador como suposto beneficiário de dinheiro, e a nova diretoria da Petrobras dizer que agora está implantado um sistema de controle mais rígido.
A presidente Dilma foi ao casamento da filha do senador Eunício Oliveira. O senador beijou-lhe as mãos. Até aí, tudo bem. Mas, em seguida, a presidente deu, de mãos beijadas, ao genro do senador uma diretoria da Anac, sem que se conheça suas qualificações para o cargo. Isso é uma insensatez, se lembrarmos o que houve em período não muito distante na mesma Anac, em que os indicados políticos colocaram em perigo os passageiros.
A dívida pública está subindo, o déficit nominal é gigantesco, o governo não vai cumprir a meta fiscal. Isso já se sabe. O problema é que, em plena era da incerteza sobre a trajetória das contas públicas, o Ministério do Planejamento defendeu a "meta flexível". Se algum analista quiser saber como estará o déficit ou a dívida no futuro, concluirá que tudo depende de qual nível da meta estará valendo. Não precisamos de mais incerteza sobre o Brasil neste momento.
O Fundo de Amparo do Trabalhador (FAT) terá que receber novos aportes, o governo adiou o pagamento do abono salarial. Mesmo assim, a melhor ideia que teve para estimular o emprego foi fazer um projeto em que o FAT paga 15% do salário dos trabalhadores de empresas privadas que aderirem ao programa.
O endividamento das famílias está em alta há muito tempo e a inadimplência está crescendo. O Congresso aprovou o aumento do limite do empréstimo consignado de aposentados. O governo teve o bom senso de vetar e explicou que a inflação está alta, e o endividamento, também. Dois meses depois, com inflação mais alta ainda, o governo propõe fazer o que havia vetado e com um inovação: pode-se usar empréstimo consignado para pagar a fatura do cartão. Não é apenas o que está dependurado no caríssimo crédito rotativo, mas sim a compra feita no mês. É um produto novo: comprar com cartão e depois pegar crédito consignado para pagar a fatura.
A ideia de estimular a repatriação de recursos parece ótima e já foi defendida anteriormente pelo deputado José Mentor, numa antiga encarnação do mesmo projeto. O grande problema é que não há como separar o dinheiro que está no exterior, sem declaração à Receita, por sua origem. Quando procuradores do Ministério Público, agentes da Polícia Federal e um juiz trabalham para encontrar o dinheiro de corrupção, não é o melhor momento para se abrir uma avenida para limpeza de dinheiro. O governo diz que a anistia será apenas para o processo de envio e não para a origem do recurso. Mas o projeto passará em regime de urgência em um Congresso cujas lideranças estão ameaçadas por denúncias.
De todos, o mais lesivo é o volume de gastos que o Congresso aprovou quando deveria votar corte de gastos. Usou as MPs do ajuste fiscal para fazer mais desajuste fiscal. Aprovou aumento de despesas com aposentados, facilidade para a aposentadoria mais cedo, eliminação de impostos sobre combustíveis fósseis e até a construção de um shopping por ele mesmo, o Congresso. Já tem até nome: é o ParlaShopping.
Este é o festival de sandices que assola o país neste momento em que aumentou a dúvida sobre a capacidade de o Brasil lidar com cada um dos muitos desafios que se acumularam. Todos juntos dão a impressão de que tem muita gente sem noção do risco que o país corre. Nenhum item desta lista de acontecimentos recentes aguentaria a pergunta: mas isso numa hora dessas?
No Brasil, prosperam ideias e decisões que merecem a pergunta: numa hora dessas? A equipe econômica tem projeto de repatriação de recursos que foram para fora sem declaração à Receita. No meio de uma operação de nome "Lava-Jato", é hora de correr o risco de anistiar crime de lavagem de dinheiro? O Congresso aumentou despesas públicas, em valores bilionários, no meio da votação do ajuste fiscal.
A Petrobras mantinha nos cargos os indicados do senador Fernando Collor, e um deles, inclusive, trancava a porta da sua sala na companhia. Tanto que a Polícia Federal teve que arrombar para cumprir o mandado de busca e apreensão. E isso, apesar de a Operação Lava-Jato ter mais de um ano, outros indicados políticos estarem na prisão, delatores já terem citado o senador como suposto beneficiário de dinheiro, e a nova diretoria da Petrobras dizer que agora está implantado um sistema de controle mais rígido.
A presidente Dilma foi ao casamento da filha do senador Eunício Oliveira. O senador beijou-lhe as mãos. Até aí, tudo bem. Mas, em seguida, a presidente deu, de mãos beijadas, ao genro do senador uma diretoria da Anac, sem que se conheça suas qualificações para o cargo. Isso é uma insensatez, se lembrarmos o que houve em período não muito distante na mesma Anac, em que os indicados políticos colocaram em perigo os passageiros.
A dívida pública está subindo, o déficit nominal é gigantesco, o governo não vai cumprir a meta fiscal. Isso já se sabe. O problema é que, em plena era da incerteza sobre a trajetória das contas públicas, o Ministério do Planejamento defendeu a "meta flexível". Se algum analista quiser saber como estará o déficit ou a dívida no futuro, concluirá que tudo depende de qual nível da meta estará valendo. Não precisamos de mais incerteza sobre o Brasil neste momento.
O Fundo de Amparo do Trabalhador (FAT) terá que receber novos aportes, o governo adiou o pagamento do abono salarial. Mesmo assim, a melhor ideia que teve para estimular o emprego foi fazer um projeto em que o FAT paga 15% do salário dos trabalhadores de empresas privadas que aderirem ao programa.
O endividamento das famílias está em alta há muito tempo e a inadimplência está crescendo. O Congresso aprovou o aumento do limite do empréstimo consignado de aposentados. O governo teve o bom senso de vetar e explicou que a inflação está alta, e o endividamento, também. Dois meses depois, com inflação mais alta ainda, o governo propõe fazer o que havia vetado e com um inovação: pode-se usar empréstimo consignado para pagar a fatura do cartão. Não é apenas o que está dependurado no caríssimo crédito rotativo, mas sim a compra feita no mês. É um produto novo: comprar com cartão e depois pegar crédito consignado para pagar a fatura.
A ideia de estimular a repatriação de recursos parece ótima e já foi defendida anteriormente pelo deputado José Mentor, numa antiga encarnação do mesmo projeto. O grande problema é que não há como separar o dinheiro que está no exterior, sem declaração à Receita, por sua origem. Quando procuradores do Ministério Público, agentes da Polícia Federal e um juiz trabalham para encontrar o dinheiro de corrupção, não é o melhor momento para se abrir uma avenida para limpeza de dinheiro. O governo diz que a anistia será apenas para o processo de envio e não para a origem do recurso. Mas o projeto passará em regime de urgência em um Congresso cujas lideranças estão ameaçadas por denúncias.
De todos, o mais lesivo é o volume de gastos que o Congresso aprovou quando deveria votar corte de gastos. Usou as MPs do ajuste fiscal para fazer mais desajuste fiscal. Aprovou aumento de despesas com aposentados, facilidade para a aposentadoria mais cedo, eliminação de impostos sobre combustíveis fósseis e até a construção de um shopping por ele mesmo, o Congresso. Já tem até nome: é o ParlaShopping.
Este é o festival de sandices que assola o país neste momento em que aumentou a dúvida sobre a capacidade de o Brasil lidar com cada um dos muitos desafios que se acumularam. Todos juntos dão a impressão de que tem muita gente sem noção do risco que o país corre. Nenhum item desta lista de acontecimentos recentes aguentaria a pergunta: mas isso numa hora dessas?