terça-feira, 21 de julho de 2015

Numa hora dessas? - MÍRIAM LEITÃO


O GLOBO - 19/07

No Brasil, prosperam ideias e decisões que merecem a pergunta: numa hora dessas? A equipe econômica tem projeto de repatriação de recursos que foram para fora sem declaração à Receita. No meio de uma operação de nome "Lava-Jato", é hora de correr o risco de anistiar crime de lavagem de dinheiro? O Congresso aumentou despesas públicas, em valores bilionários, no meio da votação do ajuste fiscal.

A Petrobras mantinha nos cargos os indicados do senador Fernando Collor, e um deles, inclusive, trancava a porta da sua sala na companhia. Tanto que a Polícia Federal teve que arrombar para cumprir o mandado de busca e apreensão. E isso, apesar de a Operação Lava-Jato ter mais de um ano, outros indicados políticos estarem na prisão, delatores já terem citado o senador como suposto beneficiário de dinheiro, e a nova diretoria da Petrobras dizer que agora está implantado um sistema de controle mais rígido.

A presidente Dilma foi ao casamento da filha do senador Eunício Oliveira. O senador beijou-lhe as mãos. Até aí, tudo bem. Mas, em seguida, a presidente deu, de mãos beijadas, ao genro do senador uma diretoria da Anac, sem que se conheça suas qualificações para o cargo. Isso é uma insensatez, se lembrarmos o que houve em período não muito distante na mesma Anac, em que os indicados políticos colocaram em perigo os passageiros.

A dívida pública está subindo, o déficit nominal é gigantesco, o governo não vai cumprir a meta fiscal. Isso já se sabe. O problema é que, em plena era da incerteza sobre a trajetória das contas públicas, o Ministério do Planejamento defendeu a "meta flexível". Se algum analista quiser saber como estará o déficit ou a dívida no futuro, concluirá que tudo depende de qual nível da meta estará valendo. Não precisamos de mais incerteza sobre o Brasil neste momento.

O Fundo de Amparo do Trabalhador (FAT) terá que receber novos aportes, o governo adiou o pagamento do abono salarial. Mesmo assim, a melhor ideia que teve para estimular o emprego foi fazer um projeto em que o FAT paga 15% do salário dos trabalhadores de empresas privadas que aderirem ao programa.

O endividamento das famílias está em alta há muito tempo e a inadimplência está crescendo. O Congresso aprovou o aumento do limite do empréstimo consignado de aposentados. O governo teve o bom senso de vetar e explicou que a inflação está alta, e o endividamento, também. Dois meses depois, com inflação mais alta ainda, o governo propõe fazer o que havia vetado e com um inovação: pode-se usar empréstimo consignado para pagar a fatura do cartão. Não é apenas o que está dependurado no caríssimo crédito rotativo, mas sim a compra feita no mês. É um produto novo: comprar com cartão e depois pegar crédito consignado para pagar a fatura.

A ideia de estimular a repatriação de recursos parece ótima e já foi defendida anteriormente pelo deputado José Mentor, numa antiga encarnação do mesmo projeto. O grande problema é que não há como separar o dinheiro que está no exterior, sem declaração à Receita, por sua origem. Quando procuradores do Ministério Público, agentes da Polícia Federal e um juiz trabalham para encontrar o dinheiro de corrupção, não é o melhor momento para se abrir uma avenida para limpeza de dinheiro. O governo diz que a anistia será apenas para o processo de envio e não para a origem do recurso. Mas o projeto passará em regime de urgência em um Congresso cujas lideranças estão ameaçadas por denúncias.

De todos, o mais lesivo é o volume de gastos que o Congresso aprovou quando deveria votar corte de gastos. Usou as MPs do ajuste fiscal para fazer mais desajuste fiscal. Aprovou aumento de despesas com aposentados, facilidade para a aposentadoria mais cedo, eliminação de impostos sobre combustíveis fósseis e até a construção de um shopping por ele mesmo, o Congresso. Já tem até nome: é o ParlaShopping.

Este é o festival de sandices que assola o país neste momento em que aumentou a dúvida sobre a capacidade de o Brasil lidar com cada um dos muitos desafios que se acumularam. Todos juntos dão a impressão de que tem muita gente sem noção do risco que o país corre. Nenhum item desta lista de acontecimentos recentes aguentaria a pergunta: mas isso numa hora dessas? 

segunda-feira, 20 de julho de 2015

IDÍLICA ESTUDANTIL (Alex Polaris)


Nossa geração teve pouco tempo
começou pelo fim
mas foi bela a nossa procura
ah! moça, como foi bela a nossa procura...
mesmo com tanta ilusão perdida
quebrada,
mesmo com tanto caco de sonho
onde até hoje
a gente se corta.

domingo, 19 de julho de 2015

10 coisas sobre o Mais Médicos que a mídia convencional não conta para você


O programa cobre 3.785 municípios, sendo que 400 deles nunca haviam tido médicos. Distritos indígenas contam hoje com 300 médicos; antes não tinham nenhum.


Cynara Menezes - Socialista Morena
reprodução
Há dois anos, no dia 8 de julho de 2013, o Brasil foi tomado por uma onda de ira corporativista contra um projeto que visava ampliar a oferta de médicos especializados em saúde da família no País. Naquele dia, o governo baixou a Medida Provisória (MP) criando o programa Mais Médicos, que previa a importação de médicos de diversos países, inclusive cubanos. O Conselho Federal de Medicina (CFM) e a oposição ao governo tentaram, de todas as formas, impedir que os estrangeiros viessem suprir a carência de profissionais em áreas rejeitadas pelos médicos brasileiros.
 
Médicos cubanos chegaram a ser vaiados e insultados por colegas em sua chegada no aeroporto de Fortaleza (CE), em uma atitude que surpreendeu os dirigentes da OPAS (Organização Pan-Americana de Saúde), parceira do governo federal no programa. “Nunca pensei que fosse chegar a este extremo de preconceito e até racismo, que fossem dizer que as médicas cubanas pareciam empregadas domésticas, que os médicos negros deveriam voltar para a África ou que eram guerrilheiros disfarçados”, lamenta o representante da OPAS/OMS no Brasil, Joaquín Molina.
 
Neste meio tempo, sempre que a mídia brasileira noticiou o programa foi para contar quantos cubanos fugiram para Miami ou os erros que porventura cometeram, ainda que nunca tenha se concretizado nenhuma condenação. Molina se queixa que, cada vez que era procurado pelos jornais para defender o programa, ganhava um parágrafo na reportagem, contra dez do presidente do CFM atacando a ideia. “Pessoalmente, acho que a mídia brasileira privilegia a notícia ruim. Nunca vi uma manchete positiva neste país”, critica.
 
Reuni neste post 10 pontos que a imprensa não destacou para que as pessoas possam conhecer melhor o programa Mais Médicos. Confira:
 
1. O número de médicos na atenção básica à população na rede pública do País foi ampliado em 36%: tinha cerca de 40 mil antes do programa e ganhou 14.462 profissionais, entre eles 11.429 cubanos e 1.187 com diplomas de outros países. A lei priorizou os brasileiros, mas apenas 1.846 se inscreveram na primeira convocatória. Este ano, a situação se inverteu e 95% das 4.146 vagas foram ocupadas por médicos brasileiros.
 
2. Além de serem reconhecidos como excelentes médicos de saúde da família, a principal vantagem dos médicos vindos de Cuba, segundo a OPAS, é que vieram todos de uma vez, em um pacote. Outra vantagem é que qualquer abandono que não seja por razões de saúde é coberto pelo governo cubano, que envia outro profissional sem nenhum custo adicional para o governo brasileiro. A OMS situa o sistema de saúde cubano entre os 39 melhores do mundo; o sistema de saúde brasileiro aparece na 125ª posição. Ao contrário dos brasileiros e profissionais de outros países, os cubanos também não escolhem para onde querem ir, é o ministério e a OPAS que decidem para onde serão designados.
 
3. Os médicos cubanos ganham R$ 3 mil por mês; os outros R$ 7 mil do salário previsto no acordo vão para o governo de Cuba. Ainda assim, o pagamento que recebem no Brasil é 20 vezes superior ao que receberiam em sua ilha natal. Além disso, os municípios arcam com todas as despesas: transporte, moradia e alimentação. Ou seja, o cubano praticamente não gasta o dinheiro que recebe.
 
4. Uma avaliação independente feita em 1.837 municípios revelou um aumento de 33% na média mensal de consultas e 32% de aumento em visitas domiciliares; 89% dos pacientes reportaram uma redução no tempo de espera para as consultas. Uma pesquisa feita em 2014 pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), baseada em 4 mil entrevistas em 699 municípios, revelou que 95% dos usuários estão satisfeitos ou muito satisfeitos com o desempenho dos médicos. 86% dos entrevistados afirmaram que a qualidade da atenção melhorou após a chegada dos profissionais do Mais Médicos e 60% destacaram a presença constante do médico e o cumprimento da carga horária. Queridos por seus pacientes, vários médicos cubanos têm sido homenageados pelas câmaras municipais por seu trabalho no Brasil.
 
5. O programa cobre 3.785 municípios, sendo que 400 deles nunca haviam tido médicos. Os 34 distritos indígenas contam hoje com 300 médicos; antes não tinham nenhum. Entre os yanomami, por exemplo, houve um aumento de 490 atendimentos em 2013 para 7 mil em 2014, com 15 médicos cubanos dedicados à etnia com exclusividade. 99% dos médicos que atendem os índios no programa são cubanos.
 
6. Um dos trabalhos mais interessantes desenvolvidos pelos médicos cubanos nas aldeias indígenas é o resgate da Medicina Tradicional, com o uso de plantas. Na aldeia Kumenê, no Oiapoque (AP), o médico Javier Lopez Salazar, pós-graduado em Medicina Tradicional, atua para recuperar a sabedoria local na utilização de plantas e ervas medicinais, perdida por causa da influência evangélica. O médico estimulou os indígenas a buscar as canoas defeituosas e abandonadas nas beiras dos rios para transformá-las em canteiros de uma horta comunitária só com ervas medicinais, identificadas com placas e instruções para uso.
 
7. Ao contrário do que os jornais veiculam, os médicos e médicas cubanos não são proibidos de se casar com brasileiros. Existe uma cláusula que os obriga a comunicar os casamentos para evitar bigamia em seu país natal, segundo a OPAS. Os casos de romances entre médicos/as e brasileiros/as são numerosos. Houve até uma prefeita em Chorrochó, na Bahia, que se casou com um médico cubano.
 
8. Desde que o programa Mais Médicos começou, 9 médicos cubanos morreram: cinco por enfarto, 3 por câncer e 1 por suicídio (em 2014, um médico de 52 anos, ainda em treinamento, foi encontrado morto em um hotel de Brasília, possivelmente por enforcamento). Até agora, somente oito abandonaram o programa e deixaram o país rumo aos EUA.
 
9. O programa Mais Médicos virou modelo no continente e países como a Bolívia, o Paraguai, o Suriname e o Chile, que também sofrem com falta de profissionais, já planejam fazer projetos semelhantes.
 
10. Além do atendimento de saúde, o Mais Médicos inclui a ampliação da oferta na graduação e na residência médica e a reorientação da formação e integração da carreira. A meta é criar, até 2018, 11,5 mil novas vagas de graduação em medicina e 12,4 mil de residência médica, em áreas prioritárias para o SUS. Os municípios onde serão instalados os novos cursos de medicina foram escolhidos de acordo com a necessidade social, ou seja, lugares com carência de médicos.