Para os fundamentalistas, a Bíblia é a palavra de Deus e ponto final. Tal posição tem problemas. O que fazer das inúmeras contradições das Escrituras? Não sei se Jacob Wright é ateu, agnóstico ou crente, mas, como professor de estudos bíblicos, ele se inscreve numa tradição que teve início com religiosos que se interessaram em compreender como esse corpo literário surgiu e se organizou num cânon. Para fazê-lo, costumam utilizar, além da exegese do texto, elementos de história, arqueologia, filologia e religião comparada. É, se quisermos, o mais perto que a religião chega da ciência.
Em "Why the Bible Began", Wright oferece uma interpretação original para o surgimento da Bíblia Hebraica, por aqui chamada de Antigo Testamento. Como uma pequena comunidade que vivia numa região periférica do Oriente Médio da Antiguidade elaborou uma literatura que influencia o mundo até hoje? Para Wright, a resposta é: derrota, derrota acachapante. Num intervalo de cerca de 150 anos, os judeus viram os dois reinos que criaram, Israel, ao norte, e Judá, ao sul, serem arrasados. Não poderiam, como era costume na época, encetar uma canção da vitória.
A solução encontrada pelos escribas para tentar manter a comunidade como uma unidade política foi celebrar a derrota. Foram aos poucos juntando e reescrevendo um amplo corpo de histórias e lhes dando novos sentidos, que colocavam a ideia de um povo unido por um passado e um futuro comuns acima da de Estado, isto é, de reinos que não mais existiam.
No limite, os conquistadores não haviam vencido porque eram militarmente superiores, mas porque o Deus dos judeus quis que isso acontecesse, para punir violações pretéritas de seus eleitos.
O texto de Wight é deliciosamente erudito e muito elucidativo. Explica até como Eclesiastes e Jó, livros da Bíblia que caminham muito perto do niilismo e questionam abertamente Deus, foram incluídos no cânon.
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