O corregedor da Polícia Militar de São Paulo faz campanha eleitoral contra Guilherme Boulos, pré-candidato a prefeito pelo PSOL: "Ele não". Para a corporação, não é deslize grave: a mensagem foi compartilhada em "caráter temporário" e no perfil "particular" do oficial.
O pré-candidato a vice na chapa do atual prefeito, apoiado pelo governador e por Jair Bolsonaro, é coronel da PM.
Alunos do curso de soldados em São Paulo exaltam o massacre do Carandiru que resultou na morte de 111 presos em 1992 e são investigados pelo corregedor da PM. "Lá só tinha lixo", entoam os desinibidos novatos, décadas depois nas redes sociais, "corpos mutilados e cabeças arrancadas", canção que faz parte do currículo escolar informal.
Em 2006, o falecido coronel Ubiratan, comandante da chacina, também celebrou a "absolvição" (depois de ser condenado a 632 anos de prisão) em quartel da PM, que, em festa, exclamava "hip hurra", "hip hurra".
Com base em "critérios técnicos", o governador de São Paulo (que não se incomoda com a eliminação de suspeitos) nomeou para a assessoria da Administração Penitenciária oficial da reserva acusado de espancar presos rendidos na varredura de celas realizada após a chacina do Carandiru.
Projeto de lei que anistia os envolvidos na matança, de autoria do capitão Augusto (PL/SP), que se vangloria de ser o primeiro parlamentar a fazer uso de farda da PM na Câmara dos Deputados, tem parecer favorável do cabo Gilberto Silva (PL-PB), também oriundo da PM, na Comissão de Constituição e Justiça.
O governador do Rio de Janeiro (que não se incomoda com a eliminação de suspeitos) quer que a abordagem racista e arbitrária de jovens negros filhos de diplomatas, flagrada por câmeras de segurança, tenha investigação "séria", mas sem deixar de externar sua simpatia e compreensão: "É difícil para o policial saber quem é filho de rico".
Um dos soldados envolvidos na abordagem disse em depoimento (na presença protetora de oficial da PM e de agente da Corregedoria) que procurava por grupo suspeito que tinha "semelhança" com o grupo de jovens que inocentemente caminhava por Ipanema.
É frequente a ocultação e a plantação de provas (armas, drogas, "testemunhas") por policiais militares. Os comandos não afastam policiais que atiram e abusam.
Ainda no Rio, são absolvidos os autores da morte do garoto João Pedro, de 14 anos, por "legítima defesa". Licença judicial para matar, desde que "sem intenção".
Há pequena redução em relação ao ano anterior (0,9%), mas em 2023 o número de mortos por intervenções policiais no Brasil é 6.393, cerca de 17 por dia. Desde 2013, o crescimento é de 189%, informa o Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
A matança não tem cor partidária. A polícia da Bahia, estado governado pelo PT desde 2007, é a que mais mata, 1.467 em números absolutos. Para o governador baiano (que não se incomoda com a eliminação de suspeitos), as forças de segurança atuam lá com firmeza e legalidade. A do Rio de Janeiro se mantém em segundo lugar.
Cada dia mais poderosa e influente, a PM é uma das calamidades políticas brasileiras, aparentemente insolúvel.
Só a tolerância zero pode fazer diferença. Não há bons ou maus policiais. Há policiais que tangenciam o mundo do crime, pela certeza da impunidade, e há policiais que tangenciam, por pudor, virtude ou medo, o mundo da lei. Pela falta de controle, a fronteira é estreita.
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