Durante anos, os presidentes passearam sob as janelas do Novo Mundo
Entre as muitas perdas que o Rio está tendo de suportar, esta é historicamente dolorosa. Fecha hoje o Hotel Novo Mundo, há 69 anos na esquina de Praia do Flamengo com a rua Silveira Martins. De suas janelas laterais, a cinco metros do Museu da República, antigo Palácio do Catete, os hóspedes podiam observar o movimento em torno dos presidentes da República que trabalhavam ali antes da mudança da capital para Brasília —pela ordem, Getulio (1950-54), Café Filho (1954-55) e Juscelino (1956-60).
Acho que a ninguém jamais ocorreu alugar um apartamento num dos andares mais altos do hotel e matar a tiros o presidente quando este saísse com alguém pelos jardins do palácio para conversarem a sós. Quero crer que a segurança oficial também nunca se preocupou com isso. Empresários, ministros, embaixadores, políticos e repórteres entravam e saíam do palácio à vontade. O Brasil era mais franco, seus bambambãs ainda não se escondiam em castelos inacessíveis e, em caso de conchavo, o bar do hotel estava ali ao lado, bem à mão.
Para mim, o fim do Novo Mundo é particularmente triste. Cidadão da Glória e do Flamengo durante anos, passei muitas vezes pela sua entrada sóbria e elegante. Mas só comecei a frequentá-lo nos anos 90, a convite de Carlos Heitor Cony, que trabalhava na Manchete, ali perto, e gostava de almoçar nele.
Certo dia, Cony, já colunista da Folha, estava me dizendo no Novo Mundo que lhe repudiava escrever sobre políticos e assemelhados. Achava que eles tiravam a dignidade da coluna. E citou o sindicalista paulista Vicentinho, então em evidência no noticiário. Assim que Cony acabou a frase, alguém entrou no restaurante. Era o Vicentinho.
Mas o importante é o Novo Mundo na literatura. Foi no balcão de sua recepção que o personagem de Cony recebeu aquele embrulho que daria início a um imortal romance —“Quase Memória”.
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