Depois de 27 anos como jornalista profissional, sendo 23 deles no Jornal do Brasil, Alves se mudou para Austin, no Texas, para iniciar sua carreira acadêmica nos EUA. Desde 2002, ele dirige o Knight Center for Journalism in the Americas, que oferece cursos pela internet para jornalistas em mais de 160 países.
Como o jornalismo online evoluiu nos últimos anos?
Sempre comparo o ecossistema midiático com o biológico. Durante anos, eu dizia que o ambiente midiático evoluiria de um ecossistema baseado na escassez para um ecossistema de uma floresta úmida, baseado na abundância. Isso já aconteceu: a revolução digital foi um dilúvio e os meios de comunicação estão evoluindo para se adaptar. Nós já temos um ecossistema midiático muito diferente de antes e as empresas tradicionais já deram e continuam dando muitos passos para se modificar.
Como o sr. vê o impacto das redes sociais no jornalismo?
A essa altura do campeonato, nenhum veículo de comunicação que se preze pode se dar ao luxo de ignorar ou menosprezar o fenômeno das redes sociais. Além disso, não se pode pensar nas redes sociais como um mero gerador de tráfego para os sites. Para o bem ou para o mal, está acontecendo uma concentração forte nas redes sociais, em especial no Facebook, e há vários fatores técnicos que justificam isso.
Quais são eles?
Existe atualmente um problema tecnológico na web. O Facebook se tornou tão rápido, que raramente um usuário que está navegando na rede social vai querer esperar mais do que três segundos para abrir uma notícia. Se não abrir, uma alta porcentagem desses usuários simplesmente desiste de acessar o site. Isso mostra que há uma barreira enorme entre a estrutura que o Facebook desenvolveu e a paralisia em que a web aberta se encontra.
Quais os reflexos disso para os veículos de comunicação?
O jornalismo precisa estar onde as pessoas estão. E os jornalistas precisam entender que não podem esperar que as pessoas venham até eles, uma lógica que imperou durante anos. Esse ecossistema novo é muito mais proativo. Se está todo mundo nas redes sociais, os veículos também tem que estar lá. Toda a organização jornalística que se preze tem uma operação séria nas redes sociais. Não é brincadeira de criança, como as pessoas pensavam. Isso passou.
Com a diversidade de plataformas e a quantidade cada vez maior de informações circulando nas redes sociais, qual deve ser o novo papel do jornalista?
A importância do jornalismo nesse ambiente de hiperabundância de informação é ainda maior. Você precisa do jornalista e dos meios de comunicação com credibilidade e princípios éticos. O jornalismo é uma espécie de âncora que separa o que é verdade do que é boato.
Como você vê o aumento da disseminação de notícias falsas nas redes sociais?
As pessoas estão passando por um período meio caótico de acreditar em bobagens. É incrível o número de pessoas em nosso círculo de amizades que acreditam em coisas absolutamente inverossímeis e as espalham num ato de irresponsabilidade. Mas as pessoas estão começando a se dar conta do perigo que são as notícias falsas. E muitos jornalistas e organizações jornalísticas estão desenvolvendo técnicas para desmentir boatos. Antes, havia uma hesitação dos jornais em desmentir notícias falsas, porque, ao fazer isso, poderiam espalhar ainda mais as dúvidas. Acho que estamos perdendo esse receio. Quando encontramos um boato na internet, os jornalistas têm de ser proativos e desmenti-lo.
Como o jornalismo de qualidade ajuda a mitigar esse perigo?
Nesse ambiente, o jornalismo de qualidade – baseado nos princípios éticos, na metodologia de apuração, na disciplina de verificação – só tem a ganhar. Uma boa parte das pessoas, quando está diante de uma notícia falsa, vai procurar um veículo de comunicação de credibilidade para verificar se é verdade ou não. Uma boa maneira de checar um boato, é ver se o Estadão ou outros veículos publicaram a notícia.
O que podemos esperar para o futuro do jornalismo?
É difícil prever, mas eu acho que o jornalismo vai continuar sendo um dos principais pilares de uma sociedade democrática, livre e aberta. O problema é como esse jornalismo vai se pagar, ou seja, como vamos criar modelos de negócio que possam financiar a existência desse profissional. Teremos sucesso garantido na medida em que continuamos a ser úteis. Como estamos numa era de hiperabundância de informação, é preciso acompanhar as mudanças de hábito e ir aonde as pessoas estão. Não interessa a plataforma: o importante é que o jornalismo exerça um papel relevante na vida das pessoas.
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