domingo, 23 de maio de 2021

Arquiteto Paulo Mendes da Rocha morre aos 92 anos; relembre trajetória, FSP

 Redação, O Estado de S.Paulo

23 de maio de 2021 | 13h39

Paulo Mendes da Rocha, um dos maiores arquitetos do Brasil, morreu neste domingo, 23, aos 92 anos de idade. Ao longo de sua carreira, recebeu condecorações importantes como o prêmio Pritzker, principal distinção da arquitetura mundial, em 2006, e o Leão de Ouro da Bienal de Arquitetura de Veneza, em 2016. 

Filho de engenheiro, Mendes se formou na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Mackenzie, em 1954. Quatro anos depois, ganhou projeção ao fazer o ginásio do Clube Atlético Paulistano, sendo premiado na Bienal Internacional de São Paulo em 1961, mesmo ano em que passou a dar aulas na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de São Paulo (USP).

Junto a Vilanova Artigas, Paulo Mendes da Rocha fez parte do grupo que formou a Escola Paulista, marcado pelas grandes obras de infraestrutura em concreto, e chegou a presidir o departamento paulista do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB) de 1972 a 1973 e de 1986 a 1987. 

O arquiteto Paulo Mendes da Rocha em foto de 2018
O arquiteto Paulo Mendes da Rocha em foto tirada em dezembro de 2018 Foto: Leda Abuhab/Estadão

Durante a ditadura militar, foi afastado do cargo de professor durante a vigência do AI-5, em 1969, voltando somente em 1980, após a anistia, como auxiliar de ensino. Só se tornou professor titular 18 anos depois, quando se aposentou compulsoriamente ao completar 70 anos.

Em 2020, Mendes optou por doar seu acervo à Casa de Arquitectura, museu e centro expositivo de Matosinhos, na região metropolitana do Porto, em Portugal. A decisão dividiu opiniões, entre críticos à atitude, afirmando necessidade de o Brasil conservar uma coleção como a dele, e os que apoiaram-no.

"Essa decisão foi tomada há dois anos, bem antes, portanto, da crise atual. Nunca procurei ninguém, foi o [diretor executivo Nuno] Sampaio que me fez a proposta de abrigar o acervo na Casa de Arquitectura e convidou Catherine Otondo para fazer o inventário da obra", contou ao Estadão, à época. O acervo tinha quase 9 mil peças, entre maquetes, fotografias e desenhos originais.

Entre suas principais obras, destacam-se o Museu Brasileiro da Escultura (MuBE), concluído em 1988, e o plano de reforma da Pinacoteca do Estado de São Paulo, além do Jockey Clube de Goiânia, completado em 1962, o edifício Guaimbê, em São Paulo, em 1964. Também recebeu prêmios na Expo70, em Osaka, no Japão, em 1969, e no concurso internacional para o Centre Georges Pompidou, em Paris, em 1971. 

No Facebook, Pedro Mendes da Rocha, filho do arquiteto, publicou uma homenagem: "Depois de tanto projetar edifícios em concreto e aço, meu pai foi projetar galáxias com as estrelas!".

Prepare-se para 3ª onda de Covid e 500 mil mortos até julho, Marcelo Leite, FSP

 Sístoles e diástoles: assim como o coração se contrai e relaxa para bombear sangue, a epidemia de Covid também segue um ritmo pulsante, ditado pelo grau de distanciamento social. Na ausência de vacinas suficientes para garantir imunidade coletiva, quer dizer.

No Brasil, a primeira dose de imunizantes mal chegou a um quinto da população, por culpa federal de você-sabe-quem. Nessas condições, unidades de saúde só veem escassear doentes prostrados pelo corona quando autoridades estaduais e municipais apertam restrições à mobilidade.

No pulso seguinte, com o enésimo relaxamento das medidas restritivas, unidades básicas, prontos-socorros e UTIs voltam a se encher. Leitos lotam, suprimentos para intubação rareiam, oxigênio passa a faltar, mais e mais mortes acontecem. Já vimos esse filme.

A repetição do colapso hospitalar é tão previsível quanto batimentos cardíacos, nesse paciente intratável chamado Brasil. A analogia para por aqui, porque sístoles e diástoles se sucedem em frações de segundos, ao passo que altos e baixos de casos e óbitos na epidemia avançam com defasagem de três a quatro semanas.

O intervalo que separa o aumento no número de infecções da subida na quantidade de mortos corresponde ao tempo de progressão da doença nos infectados sintomáticos. Entre mais pessoas entrarem em circulação, contraírem o vírus, desenvolverem sintomas, serem internadas e precisarem de cuidados intensivos, vários dias transcorrem; uma vez intubados na UTI, demora outro tanto até que 80% sucumbam.

Retomando a analogia: ao longo da vida, o coração se desgasta sob o esforço de bater 100 mil vezes a cada 24 horas, 36 milhões por ano, década após década, e um dia para; a fadiga social com idas e vindas da Covid, porém, se manifesta bem mais rápido.

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Nem saímos do segundo ciclo, e já bastou para população, governadores e prefeitos, exaustos, baixarem mais um pouco a guarda (de resto, imperfeita). Ninguém aguenta mais a falta de amigos, respeito, parentes, popularidade, sossego, recursos, vacinas, empregos, sedativos, renda, solidariedade, leitos, decência...

“Lockdown” virou palavra maldita, pecado mortal, graças aos esforços genocidas de Jair Bolsonaro. Seus adversários políticos fogem da providência como a cruz que se aparta do demônio. Nunca fizemos nada parecido com o trancamento geral.

Após tanta negligência com providenciar vacinas, testes em massa e rastreamento com separação de infectados seriam a única medida capaz de derrubar as curvas funéreas de maneira sustentável.

Na falta de tudo, torna-se fácil antever novo repique de mortes em poucas semanas. Pode parecer irresponsável tal presságio, quando o número de óbitos está em queda, mas até crianças sabem que a água do mar recua antes de tudo submergir no tsunami.

Não deveria haver espaço para alívio quando quase 2.000 brasileiros morrem por dia. Ainda por cima, a quantidade de infectados parou de cair e volta a subir em vários lugares. A lotação de UTIs ultrapassa alarmantes 80% na maioria dos estados e capitais.

Fique aqui a previsão, coisa mais arriscada para um jornalista fazer: em poucas semanas chegará uma terceira e mortífera onda. O Brasil alcançará a cifra chocante de meio milhão de mortos em meados de junho, ou logo depois.

É para anotar e cobrar a coluna quando chegar a hora. Nada dará mais satisfação do que errar, nesse caso.

Aos que acreditam em Deus, contudo, recomenda-se muita oração. Dos humanos, com ou sem poder de decisão, já não cabe esperar quase nada.

sábado, 22 de maio de 2021

Oscar Vilhena Vieira- STF Ativismo ou responsabilidade judicial?, FSP

  EDIÇÃO IMPRESSA

Tornou-se senso comum no debate político brasileiro de acusar o Judiciário de ativista. Não gosto do termo. Prefiro distinguir as decisões judiciais em boas ou más, em função de sua maior ou menor aderência às regras do direito na solução de problemas concretos. Nesse sentido, a postura mais ou menos “responsiva” do Judiciário deve ser uma consequência da complexidade dos problemas que é convocado a resolver e da natureza dos direitos que cumpre assegurar.

Na chamada “ADPF das favelas”, o Supremo Tribunal Federal foi chamado a julgar a grave omissão do estado do Rio de Janeiro em restringir o emprego abusivo da força letal pelas polícias contra as populações, sobretudo negras, que vivem em suas comunidades mais pobres, descumprindo inclusive decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

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A decisão cautelar do Supremo, em agosto de 2020, foi restringir a realização de operações policiais nas comunidades do Rio de Janeiro, durante a pandemia, que deveriam ocorrer apenas em situações excepcionais e dentro determinados limites. Como foi destacado pelo ministro Gilmar Mendes, o “tema da letalidade policial é extremamente complexo”, evidenciando a questão da “desigualdade” e da “seletividade” criminal. A consequência imediata da decisão foi não apenas a redução da letalidade policial, mas também dos índices de criminalidade, inclusive homicídios, naquelas comunidades.

Essa decisão do Supremo passou, no entanto, a ser desafiada por uma série de operações de legalidade questionável, a partir de outubro de 2020, culminando com a chacina do Jacarezinho, no último dia 6 de maio.

Nesta sexta-feira, 21 de maio, em resposta aos embargos de declaração interpostos pelas partes, o ministro Edson Fachin proferiu uma decisão não apenas importante, mas inovadora. Após destacar a gravidade das violações sistemáticas aos direitos humanos a que estão submetidas as populações das comunidades do Rio de Janeiro e exaltar a coragem de familiares e das entidades que participaram das audiências públicas –sem em nenhum momento estigmatizar o trabalho policial–, o ministro esclareceu que o Judiciário não pode se omitir face a resistência do poder público em adotar protocolos para o emprego da força letal, em preservar as cenas dos crimes, bem como as dificuldades do Ministério Público Estadual em exercer o controle externo sobre as atividades policias. Como deixou claro: “as falhas decorrentes dessas omissões custam vidas”.

Sem se substituir às autoridades responsáveis, o ministro determinou onze medidas, entre as quais destacam-se as obrigações de o Estado de apresentar, em 90 dias, um plano visando a redução da letalidade policial, que deve estar alinhado com os Princípios Básicos para Utilização de armas de Fogo da ONU e com a Constituição; a criação de um “Observatório Judicial de Polícia Cidadã”, para acompanhar esse processo de natureza estrutural; a criação de um sistema eficiente de controle da atividade policial, a ser aferido pelo Conselho Nacional do Ministério Público; e a abertura de uma investigação para apurar o eventual descumprimento da decisão do STF no episódio de Jacarezinho.

Zero ativismo. O ministro Fachin apenas cumpriu, por meio de uma decisão gerencial ou coordenadora, sua missão de magistrado, ao ser provocado a se manifestar sobre a omissão daqueles que teriam a responsabilidade primária por assegurar o direito fundamental à vida e à segurança pública da população. Espera-se agora que essa decisão seja referendada pelos demais membros do Supremo.