Roberto Jefferson poderia ter sido preso? Inquéritos abertos pelo STF para investigar apoiadores de Jair Bolsonaro são teratomas jurídicos? O deputado Daniel Silveira pode ser considerado um preso político? Os ministros do Supremo estão extrapolando? Essas perguntas comportam dois níveis de respostas.
Se estivéssemos numa espécie de playground kelseniano, onde as normas jurídicas são aplicadas de forma totalmente abstrata, eu faria restrições a várias das decisões da corte ou, pelo menos, cobraria fundamentações mais detalhadas. Não há dúvida de que Jefferson ameaçou ministros, mas estamos lidando com ameaças críveis ou com um caso psiquiátrico? Será que o STF não alargou demais o dispositivo do regimento interno (RI) que autoriza a abertura de inquéritos “ex officio”? O artigo 43 do RI, afinal, limita essa capacidade a infrações cometidas “na sede ou dependências do tribunal”.
O ponto é que não estamos num universo de puras abstrações. No mundo em que vivemos, essas decisões do Supremo, apesar de controversas, podem ser descritas como reações legítimas ao vandalismo institucional de Jair Bolsonaro e seus apoiadores, que não serão contidos pelo respeito abstrato à lei.
O ideal seria jamais ter posto uma pessoa com a ficha corrida de Bolsonaro na Presidência da República. A segunda melhor resposta teria sido destituí-lo por crimes de responsabilidade assim que ele os cometeu. A terceira teria sido encarcerá-lo pelas infrações penais comuns que perpetrou. O país, porém, devido a uma funesta combinação de fatores, fracassou em dar essas respostas. Assim, só nos resta aplaudir o STF por pelo menos esboçar uma resistência às pretensões golpistas dos bolsonaristas.
Os legalistas empedernidos podem dormir tranquilos. A grande vantagem do formalismo que caracteriza o mundo jurídico é que qualquer interpretação que o STF dê a um dispositivo é por definição a correta.