segunda-feira, 20 de maio de 2019

Número de presos em São Paulo quadruplica sob governos do PSDB, FSP

Estado atinge recorde de quase 236 mil pessoas presas; no mesmo período de 25 anos, população cresceu só 33%

Rogério Pagnan
SÃO PAULO
O número de presos do sistema carcerário de São Paulo mais que quadruplicou nos últimos 25 anos e atingiu, neste mês, a maior população de sua história, 235.775 pessoas, segundo dados do governo paulista.

Nesse período, o estado foi administrado praticamente apenas pelo PSDB, partido do atual governador João Doria, com exceção das breves passagens do PFL, de Cláudio Lembo, e do PSB, de Márcio França.

São Paulo atinge essa marca em meio ao processo de concessão à iniciativa privada, pela primeira vez, da gestão compartilhada de quatro unidades prisionais no estado.

Até o final do próximo ano, o governo Doria pretende destinar quase 20 unidades a parcerias, incluindo por meio de PPP (Parceira Público-Privadas), como já ocorre em outros estados do país.

O total de detentos inclui as prisões cíveis, como as por não pagamento de pensão alimentícia (responsabilidade da Segurança Pública), que somavam 1.979 pessoas.
Pavilhão de penitenciária feminina na capital paulista em 2010, durante o período em que a população carcerária do estado quadruplicou
Pavilhão de penitenciária feminina na capital paulista em 2010, durante o período em que a população carcerária do estado quadruplicou - Marlene Bergamo - 17.mai.2010/Folhapress
Sem elas, são 233.796 presos criminais —condenados ou provisórios—, população equivalente à estimada para a cidade de Araraquara (233.744 habitantes).

Quando o governador Mário Covas (1930-2001) foi eleito pela primeira vez em 1994, a população carcerária do estado de São Paulo era de 55.021 presos. Desse total, 42% do detentos (23.179) ficavam em delegacias e cadeias públicas --grande parte na capital e na Grande São Paulo.

Nesses últimos 25 anos, o número de pessoas presas subiu sem parar, ano a ano (com a exceção de 2017), até atingir o recorde atual e um crescimento acumulado de 328,5%.

Já população total do estado, nesse mesmo período, cresceu cerca de um décimo disso: 33,3%. O número de habitantes foi 33,2 milhões, em 1994, para os atuais 44,3 milhões habitantes, segundo dados do Seade.
Em mais da metade dessas duas décadas e meia, São Paulo foi governado pelo médico Geraldo Alckmin, atual presidente nacional do PSDB, que atribui parte da queda da criminalidade no estado às prisões realizadas.

"O estado de São Paulo mostrou que prender diminui criminalidade. Somos um exemplo prático. Nós tínhamos [uma taxa de] 35 homicídios por 100 mil habitantes ao ano, e reduzimos para 7. De 13 mil assassinatos, reduzimos para menos de 3.000", disse ele.

"O que estimula o crime é a impunidade. Então, o fato de você prender, tirar o criminoso da rua, tem resultado. Muito estado não prende porque não tem aonde pôr", afirmou o ex-governador.
Atualmente, o número de pessoas em cadeias e distritos policiais foi praticamente zerado, limitando-se a presos em trânsito e a casos relacionados a pensão alimentícia.

Nos últimos 25 anos, o número de unidades do sistema penitenciário (sob o guarda-chuva da Administração Penitenciária) pulou de 43 para as atuais 173 unidades, elevando o número de vagas de 23.801 para 144.600 —crescimento superior a 500%.

Ainda assim, o déficit de vagas do sistema cresceu o dobro disso. Foi de 8.041 para 89.196 —elevação de 1.009%.

A população carcerária paulista é a maior do país. Em 1994, segundo dados do Ministério da Justiça, o país tinha 129 mil presos. Não há dados deste ano disponíveis para o país, mas, em 2016, estimava-se 726.712 presos —cerca de 33% do total em São Paulo.

Para especialistas, a queda no número de presos em 2017 pode estar ligado à implantação das audiências de custódia no estado (concluída naquele ano) e, ainda, à publicação de leis como aquela que permitiu —em alguns casos— a prisão domiciliar de mulheres com filhos menores de 12 anos.

PRISÕES EM FLAGRANTE PELA POLÍCIA NO ESTADO REGISTRAM QUEDA

[ x ]
O recorde da população carcerária em São Paulo ocorre mesmo com a queda do número de prisões em flagrante realizadas pela polícia. Nos últimos 27 meses —ou desde janeiro de 2017— houve menos prisões em 23 deles.

Para magistrados e promotores ouvidos pela Folha, não há uma explicação única e conhecida para o aumento no número de presos nos últimos 25 anos.

Para a desembargadora Ivana David, do Tribunal de Justiça de SP, a expansão pode estar ligada —além de a questões processuais— ao maior trabalho de ações de inteligência da polícia contra o crime organizado, e um incremento de casos de tráfico de drogas.
"O que a gente tem pego de droga na rua é um absurdo. Aquele negócio de prender com dois papelotes não existe mais. São 50 gramas, 100 gramas, um tijolo de maconha. Isso dá muita diferença. Aquele que pegava um ano e oito meses [de cadeia] com dois papelotes, agora, com 400 gramas, 500 gramas, acaba tomando cinco anos e o regime é fechado", diz a magistrada.

Já para o juiz Ulysses de Oliveira Gonçalves Junior, corregedor dos presídios da capital e Grande SP, as prisões em flagrante são uma porta para o sistema prisional, mas existem outras tão importantes.

Ele lista entre os fatores: casos de procurados capturados, pessoas que vão para o sistema após descumprimento de medidas cautelares e, até, a decisão de prender pessoas quando condenadas em segunda instância, entendimento decidido pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em 2016.

"Se está caindo o número de prisões em flagrante, e está aumentando o número de presos, só podem ser fatores processuais que estão contribuindo para esse fenômeno", disse. "Não é porque a pessoa não foi presa em flagrante que não vai ser presa mais."

O procurador Márcio Sérgio Christino, do Ministério Público de São Paulo, disse não ter havido nenhuma mudança significativa da lei para que houvesse o maior encarceramento. "Pelo contrário, as mudanças ocorridas foram na direção contrária, para soltar mais", disse. 

"A única explicação que vejo é as pessoas estarem ficando presas por mais tempo. Pode ser por crimes mais graves, mas seria necessário um estudo para saber", disse ele.

Colaboraram Mariana Grazini, Daniela Arcanjo e Guilherme Garcia

Quem é Tarsísio de Freitas, o 3º ‘superministro’ de Bolsonaro, OESP


Titular da pasta Infraestrutura impõe novo ritmo a concessões, ganha elogios no governo e entra no ‘time’ de Paulo Guedes e Sérgio Moro; críticos veem perfil centralizador

André Borges e Breno Pires, O Estado de S.Paulo
20 de maio de 2019 | 05h00
BRASÍLIA – Integrante de um governo ainda sem avanços em temas como o combate ao desemprego ou a melhoria de indicadores na Educação, o ministro Tarcísio de Freitas tem sido elogiado pelo presidente Jair Bolsonaro com uma frequência pouco vista na Esplanada dos Ministérios. No comando da área de Infraestrutura, ele passou a reunir em sua pasta tudo aquilo que Bolsonaro gostaria de encontrar nas outras: entregas de promessas, resultados para festejar nas redes sociais e batidas de martelos em leilões na Bolsa de Valores. Só nos 100 primeiros dias de governo, foram 23 leilões de ativos – incluindo aeroportos, terminais portuários e a ferrovia Norte-Sul –, com previsão de gerar R$ 8 bilhões em investimentos.
Formado pela Academia Militar das Agulhas Negras, com Engenharia Civil pelo Instituto Militar Engenharia (IME), o ministro de 43 anos é descrito como alguém bom de conversas de gabinete e em audiências públicas, mas também faz questão de meter o pé por estradas lamacentas e negociar preço de frete com caminhoneiros. Também ganhou pontos com o chefe ao adotar uma postura mais pragmática em relação a demandas de ambientalistas e de comunidades indígenas que eventualmente cruzam o caminho de projetos de infraestrutura.
Tarcísio de Freitas
Antes de trabalhar com Bolsonaro, Tarcísio passou por governos Dilma e Temer Foto: ADRIANO MACHADO/REUTERS
“Fazer algo objetivo, mesmo que seja de sua própria rotina, tem feito toda a diferença num governo tumultuado”, diz o professor Marco Antônio Teixeira, da FGV-SP. “É um ministério que faz o que se espera dele: toca os projetos.” 
Os elogios do presidente têm sido retribuídos na mesma moeda. Para Tarcísio, Bolsonaro não chegou ao Planalto só porque venceu seus opositores nas urnas. Foi mais do que isso. Católico fervoroso, o ministro diz ter convicção de que Bolsonaro foi ungido por Deus. “Ele não só foi um escolhido pela população brasileira. É um escolhido de Deus”, afirmou em seu discurso de posse. 

Ministro é egresso do governo Dilma

Diferentemente do que se vê em quase toda a equipe escolhida a dedo por Bolsonaro, Tarcísio é um egresso dos ex-presidentes Dilma Rousseff e Michel Temer. Ele chegou à cúpula do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) em 2011, quando Dilma prometia fazer uma “faxina” no órgão, depois da revelação de esquemas de corrupção. À época, era funcionário de carreira da Controladoria-Geral da União (CGU). Tarcísio foi o número dois do general Jorge Fraxe, que ocupou o posto de diretor-geral do Dnit com a missão de resgatar a imagem do governo. Em 2014, ele sucederia Fraxe no comando do Dnit. 
No governo Temer, atuou na Secretaria Especial do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), no anexo 2 do Palácio do Planalto. Com sua nomeação para comandar toda a área de infraestrutura, Tarcísio passou a ser visto como mais um “superministro” do governo Bolsonaro, somando-se ao time de Paulo Guedes(Economia) e Sérgio Moro (Justiça). 
Tarcísio
O ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, comemorou o resultado do leilão dos portos, em março; total arrecadado foi R$ 219,5 milhões Foto: Dida Sampaio/Estadão
Quando Bolsonaro, ainda em dezembro, pediu uma prévia do que receberia em sua mesa assim que chegasse ao Planalto, Tarcísio usou o trabalho anterior no governo para apresentar um pacote de concessões que estavam engavetados ou com contratos para assinar. “Esse resultado é fruto de trabalho, não nasceu do dia para a noite”, diz Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura. “Ele vem atuando de maneira pragmática. Não era uma pessoa conhecida popularmente e está surpreendendo.”
Servidor de carreira vinculado à consultoria legislativa da Câmara, Tarcísio mantém no dia a dia o perfil flexível adotado na política. “Flamenguista roxo”, sabe tocar cavaquinho e diz ouvir de funk carioca à opera. Entre as leituras de cabeceira, tem preferência por aquelas que tratam do período do Império. 
A indicação de seu nome para Bolsonaro não foi defendida apenas pelos amigos de caserna e generais que estiveram com ele no Haiti, quando chefiava a seção de engenharia da missão de paz da ONU. Tarcísio também seria elogiado por membros do Tribunal de Contas da União, que ele próprio gosta de criticar. 
Em dezembro, Bolsonaro fez uma visita ao tribunal. Teve uma conversa com os ministros, entre eles, o decano da Corte, Walton Alencar Rodrigues. Na conversa, Walton sublinhou o trabalho de Tarcísio e de seu parceiro na condução das concessões do PPI, Adalberto Vasconcelos. Ambos vinham liderando os projetos e o cronograma dos leilões. Bolsonaro ouviu com atenção e guardou os nomes. Pesou ainda o fato de Tarcísio ter currículo militar. Adalberto, por seu lado, já tinha atuado como auditor do TCU e tinha trânsito com os militares alçados para liderar a transição do governo. A aprovação de seu nome pelo setor privado foi decisiva.

Elogios, no entanto, não garantem uma unanimidade

Os elogios feitos até agora, porém, não garantem uma unanimidade. Na área ambiental, ele é visto como alguém impaciente e capaz de “tratorar” qualquer um que não concorde com suas propostas. Dentro do TCU, muitos técnicos veem uma pressão descrita como exacerbada do ministro para que o órgão libere seus projetos. No ano passado, traços dessa pressão ficaram bem evidentes.
Tarcísio, então secretário do PPI, tentava liberar a concessão da Rodovia de Integração do Sul (RIS) – atacado por auditores, que enxergavam irregularidades no edital. Tarcísio, então, acusou a Corte de levantar suspeitas sem apresentar provas. “Os auditores do TCU não são os ‘papas’ do universo. Tem muito absurdo nesse relatório, faz insinuações e não apresenta evidências. Vamos rechaçar. Estamos seguros do que colocamos lá e vamos nisso até o fim”, atacou ele, na época. Ambos acabaram cedendo e os ponteiros se acertaram. A concessão da estrada aconteceu em novembro de 2018, com a assinatura do contrato marcada para este ano.
“É um ministro objetivo, que vai direto ao ponto e que tem uma agenda com começo, meio e fim”, diz o presidente da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), Eduardo Sanovicz. / COLABORARAM MATHEUS NASCIMENTO e CÍCERO COTRIM, ESPECIAL PARA O ESTADO, e PAULO BERALDO