quinta-feira, 6 de julho de 2017

Álvaro dos Santos: O arrasador componente tecnológico da corrupção das funções de Estado, OESP


06 de julho de 2017 às 08h10

  
A ARRASADORA COMPONENTE TECNOLÓGICA DA CORRUPÇÃO DAS FUNÇÕES DE ESTADO
por Álvaro Rodrigues dos Santos, especial para o Viomundo
Em recente entrevista ao jornal Folha de São Paulo o preclaro ex-ministro Delfin Neto afirma que “o setor privado anulou a única força que controla o capitalismo, que é o Congresso”.
Um ponto culminante da eterna guerra entre o Mercado e a Política. Há que se ver, no entanto, que o fenômeno da privatização do Estado brasileiro, ou seja, do domínio do Estado, em todas suas instâncias, por interesses privados, é velho conhecido dos estudiosos da realidade brasileira.
O que talvez não fosse tão claro à população, e que somente veio à tona com os desdobramentos da operação Lava Jato, é a dimensão do referido domínio.
Ou seja, hoje o Estado brasileiro, abandonando por completo sua figura republicana de representação operacional dos interesses gerais da sociedade, expressa e representa, na pessoa de seus membros e instituições, fundamentalmente interesses privados, empresariais e corporativos.
Há que se ver, entretanto, que a expressão maior dessa disfunção republicana do Estado brasileiro não se traduz somente nos generalizados atos de corrupção ora trazidos em abundância à tona e ao conhecimento público.
Ou seja, a equação mais conhecida, composta por financiamentos privados de campanhas eleitorais, propinas pagas a membros da administração pública direta e indireta para arranjos licitatórios, sobrepreços, aprovação de leis e decisões de interesse empresarial, financiamentos facilitados, etc., etc., não é a única existente. E talvez não seja até a mais danosa ao país.
Muito mais grave, as próprias funções de Estado foram corrompidas. Vamos entender um pouco o que isso significa.
O fenômeno de corrupção das funções de Estado ocorre em todos os ramos da ação estatal, desde a engenharia de obras de infraestrutura aos programas de saúde pública, mas vamos nos ater ao primeiro ramo como exemplificador dos processos a que estamos submetidos.
Bom entender, ao início, que um empreendimento de engenharia, seja uma obra viária, uma barragem, um porto, uma linha de metrô, uma plataforma marítima, um programa de combate às enchentes, um programa de combate às secas, etc., admite várias opções tecnológicas para a concepção de seu projeto e para a execução de sua implantação.
É dentro desse leque de opções tecnológicas que o Estado contratador concebe e escolhe, ou deveria conceber e escolher, aquela de maior interesse estratégico para o país, seja no que diz respeito a aspectos financeiros, seja no que diz respeito às características fisiográficas (clima, geologia, geotecnia…), seja no que diz respeito à capacidade de mobilização e uso das vantagens comparativas regionais ou do país, e por aí segue.
Ou seja, cabe ao Estado contratante a missão de fixar, já nos termos licitatórios, as linhas e concepções tecnológicas básicas que mais interessarão à sociedade brasileira. Perde-se a autonomia dessa decisão quando se perde a competência técnica para defini-la.
O atual, e quase total, domínio do Estado brasileiro pelos interesses empresariais privados e pelos interesses corporativos é, assim, fruto de um longo e programado processo de esvaziamento desse Estado em competência política, gerencial e tecnológica.
O objetivo era óbvio: um Estado incapaz de conceber (projetar), de ter idéias próprias, de exercer capacidade tecnológica crítica, de bem contratar e de bem fiscalizar.
Do ponto de vista da capacitação tecnológica da administração pública contratante, cumpre lembrar que nos órgãos da Administração Direta o processo de enfraquecimento tecnológico, no caso dentro de uma outra, mas também perversa lógica, iniciou-se ainda nos anos 50, e de sua decorrência órgãos públicos que no passado constituíram-se em verdadeiras escolas da engenharia, hoje não são mais que meras estruturas burocráticas contratantes sem nenhuma consistência técnica.
No âmbito da administração indireta, ou seja, das empresas públicas, tivemos um período de ouro que se estendeu, com naturais nuances, dos anos 1950 ao início dos anos 1980, quando o país apresentou crescimentos médios do PIB em torno de 7%/ano.
Nesse período prevaleceu uma orientação governamental estratégica calcada no desenvolvimentismo e no fortalecimento da empresa nacional. Foi dessa época a criação de inúmeras empresas estatais federais e estaduais, as quais constituíram equipes técnicas permanentes de excelência, o que refletiu e induziu a formação de equipes técnicas permanentes no mesmo patamar de excelência em um enorme elenco de empresas de consultoria e projetos criadas e estimuladas a atender as demandas públicas e privadas que se multiplicavam na área de infraestrutura.
Institutos de Pesquisa e Universidade, de sua parte, investiram pesadamente na pesquisa e nos serviços de apoio tecnológico a todo o parque empresarial público e privado que vinha sendo criado. Foi um período de intensa efervescência tecnológica, que guindou nossa engenharia ao mais alto nível de reconhecimento nacional e internacional.
Essas equipes técnicas foram responsáveis pelo desenvolvimento de uma engenharia nacional aplicada às características econômicas, sociais e fisiográficas próprias do país e de suas diferentes regiões, compondo uma abordagem tecnológica associada à visão estratégica de um país nação.
Em período subsequente, que se estendeu de meados dos anos 1980 ao ano de 2004, o país entrou em período econômico recessivo, o que resultou em dificuldades enormes e grande número de extinções para as empresas privadas de consultoria e projetos.
Paralelamente, obedecendo novas orientações para a economia, é implementado um amplo processo de privatização de empresas públicas nas áreas de energia, telecomunicações, transportes e infra-estrutura que implicou na dissolução de equipes técnicas de altíssima capacitação e experiência, constituídas nessas empresas ao longo de décadas, assim como uma temerária fragilização tecnológica de toda uma cadeia empresarial privada mobilizada por contratação das estatais e implicada na produção de estudos e projetos, na implantação dos empreendimentos e no fornecimento de insumos gerais, equipamentos e componentes.
As consequências foram terríveis: dissolução das equipes técnicas permanentes no setor público, enfraquecimento orientado dos Institutos de Pesquisa e da Universidade. Estava sendo ferido de morte o Estado com competência tecnológica e gerencial para conceber, contratar e fiscalizar.
São agora as grandes empresas empreiteiras de obras que definem o conteúdo tecnológico das obras licitadas pela administração pública, via pré-definição de seus editais de licitação. E esses conteúdos tecnológicos, como também a própria escala de priorização dos empreendimentos a serem contratados, ou seja, o que e quando deve ser contratado, são pensados invariavelmente para atender exclusivamente os interesses específicos das empresas envolvidas, naquilo que poderão potencializar seus lucros.
O Estado pensante e assegurador dos interesses nacionais e da sociedade brasileira foi radicalmente desarmado.  Em linguagem mais vulgar, o galinheiro foi entregue à responsabilidade das raposas.
De 2005 a 2013/14, refletindo políticas nacionais e uma boa situação da economia mundial, houve, com a retomada de investimentos, com um forte ensaio de recuperação do país e da engenharia brasileira.
Nesse curto período observou-se também um início de reorganização do setor de consultoria e projetos com o advento do protagonismo de empresas de tamanho médio.
Entretanto, no período que se estende de 2014 aos dias atuais, com o retorno de aguda recessão econômica e circunstâncias onde pontuam três graves ingredientes, a falta de recursos para investimentos em obras de infraestrutura, o empobrecimento geral da população e, em especial, a obsessão neoliberal do atual governo em internacionalizar a economia nacional e demonizar tudo que se refira à administração pública, o domínio privado do estado se expande e se consolida.
O fato resultante é que na área pública vivemos um cotidiano marcado pela execução de obras e empreendimentos não exatamente prioritários frente à nossa ordem de necessidades, mal concebidos tecnologicamente frente às características da região onde se instalam, não utilizadores de nossas vantagens comparativas, não conseguindo via de regra resolver os problemas para os quais foram propostos e comumente entrando em deterioração precoce, o que vai exigir do Estado uma sobre-manutenção não prevista.
Os prejuízos advindos desse maquiavélico processo de corrupção das funções de Estado são de uma ordem inimaginável para a sociedade brasileira. É de se esperar que uma eventual oportunidade histórica de reconstrução ética e patriótica de nossa realidade os considere em sua verdadeira e dramática dimensão.
Geólogo Álvaro Rodrigues dos Santos (santosalvaro@uol.com.br) é consultor em Geologia de Engenharia e Geotecnia. É ex-diretor de Planejamento e Gestão do IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas
Autor dos livros “Geologia de Engenharia: Conceitos, Método e Prática”, “A Grande Barreira da Serra do Mar”, “Diálogos Geológicos”, “Cubatão”, “Enchentes e Deslizamentos: Causas e Soluções”, “Manual Básico para Elaboração e Uso da Carta Geotécnica”, “Cidades e Geologia”.
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A resistência a choques, Ming OESP



O campo político traz muitas tensões, mas a economia mostra-se resiliente






Celso Ming, O Estado de S.Paulo
05 Julho 2017 | 21h00
Há algumas semanas, ainda havia vaga sensação de que a economia vinha se descolando da crise política. Agora, a percepção é a de que ela está relativamente blindada.
Antes, em seus documentos oficiais e, também, nas entrevistas dos seus dirigentes, o Banco Central advertia para os riscos e para “as incertezas” da economia. A partir da semana passada, seu presidente, Ilan Goldfajn, preferiu dizer que a economia brasileira adquiriu “resistência a choques”. A diferença pode parecer sutil, mas não é.

Ilan Goldfajn, Banco Central
Ilan Goldfajn. Resiliência da economia   Foto: ALEX SILVA / ESTADÃO
Ilan concentrou a explicação na política cambial flexível conduzida sem sobressaltos, no tombo consistente da inflação e dos juros e na ancoragem das expectativas que permitiram o avanço estrutural que se viu com a queda da meta da inflação. No entanto, há mais fatores entre o céu e a terra apontando para nova resiliência da economia.
O mergulho da inflação, por exemplo, diz mais do que a sucessão de números frios. Apesar do forte desemprego, revela aumento da renda da população mais pobre, na medida em que aponta redução dos preços da alimentação e da moradia. Esse fator é mais relevante quando se leva em conta que entre 30% e 40% da força de trabalho se vira na informalidade, onde o dinheiro pingado se desvaloriza bem menos do que há 16 meses, quando a inflação estava acima dos 10% ao ano. É algo que dissemina certa sensação de alívio.
Não pode ser ignorada a força das Contas Externas. A balança comercial (exportações menos importações) deve fechar o ano com saldo positivo em torno dos US$ 70 bilhões, equivalente ao da entrada de dólares por meio dos Investimentos Diretos no País. É situação que desestimula corridas ao dólar. 
Em abril, às vésperas da divulgação dos depoimentos de Marcelo Odebrecht, propalava-se que viria a “delação do fim do mundo”. No entanto, nem a Bolsa derreteu, nem as cotações da moeda estrangeira dispararam. Veio depois a divulgação bomba das gravações de Joesley Batista. O mercado financeiro surfou sobre alguns vagalhões para, em seguida, voltar ao normal. Há duas semanas saiu a denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que, pela primeira vez, incriminou um presidente da República no exercício do cargo. E nada de relevante aconteceu no mercado financeiro.
As condições das finanças públicas se deterioram todos os dias, a dívida bruta vai disparando para a altura dos 80% do PIB, os políticos estão no modo sobrevivência, mas, aos trancos, parte das reformas avança, como se vê diante da iminência da aprovação das novas regras trabalhistas.
Apesar da crise e de tudo o que a acompanha, ninguém prevê que a atual coalizão no poder se esmigalhe e que, com ela, a equipe econômica seja substituída por saltimbancos como Arno Augustin, secretário do Tesouro do governo Dilma, que inventou as pedaladas e a desastrada nova matriz macroeconômica.
A maior resistência da economia a choques produz duas consequências práticas. Primeira, produz certa indiferença da população, já cansada das denúncias, quanto ao desfecho da crise política. É o que explica o esvaziamento das manifestações. E, segunda, cria a percepção de que a solução dos problemas econômicos está mais na observância dos manuais e da ortodoxia do que nas intervenções voluntaristas.
O quanto isso dura é outro assunto. Depende, por exemplo, de que a área fiscal não degringole de uma vez.
CONFIRA:

Petróleo
A cotação do petróleo Brent caiu 18,70% em 2017 Foto: Infografia Estadão
» Nova baixa da gasolina?
As cotações do petróleo voltaram a apontar falta de chão. O corte de 1,8 milhão de barris diários determinado pela Opep há sete meses não está sendo suficiente para reequilibrar oferta e procura diante da robustez da produção. As autoridades da Arábia Saudita apontam para a necessidade de aumentar os cortes de oferta. Nesta quarta-feira, as cotações do Brent caíram 3,67%, como mostra o gráfico. A nova política da Petrobrás de seguir de perto os preços internacionais sugere nova baixa nos combustíveis.

Brasil | MPE reabre fábrica para produzir monotrilhos no Rio de Janeiro

A MPE do empresário Renato Ribeiro Abreu reinaugurou nesta quinta-feira (28/02) a antiga fábrica da EBE – Empresa Brasileira de Engenharia – desativada há mais de 10 anos, em Paciência, subúrbio do Rio, para dar início à fabricação de suas encomendas de monotrilhos, uma em São Paulo e uma em Manaus. Serão em princípio 24 trens de três carros – que poderão ser cinco – para a Linha 17 do Metrô de São Paulo, e 10 trens de seis carros para Manaus. Todos a serem produzidos com tecnologia da Scomi, empresa da Malásia, responsável pela fabricação do monotrilho de Kuala Lumpur, capital daquele país.

A reinauguração segue a tendência surgida com a retomada das encomendas de material ferroviário, que já foi responsável pela reocupação da Cobrasma, em Sumaré (SP), por várias indústrias do setor; da oficina da FCA em Sete Lagoas (MG), pela Caterpillar/Progress Rail; e da fábrica de vagões da CCC em Deodoro (RJ), ainda em curso pela Alstom. A fábrica da EBE, antiga empresa de montagem industrial, pertencia à MPE desde 1991, mas estava desativada, servindo com o depósito.

A fábrica tem 41 metros quadrados de área, sendo 10 mil metros quadrados de galpões, onde serão montados os veículos, começando pela encomenda de São Paulo. Por enquanto o que pode se ver são apenas os jigs – suportes – de montagem, à espera do alumínio importado para a soldagem das primeiras caixas. Já está praticamente definido que os engates serão Voith, as portas de plataforma e o ar condicionado Faiveley, os freios Knorr e as cabines Pifer. O interesse da MPE é que a maior parte dos componentes seja fabricada no Brasil, para habilitar-se ao financiamento do BNDES.