A Lei
12.305, denominada de Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos, entrou em vigor em 3 de agosto de 2010, concedendo prazo até agosto de 2012 para os municípios se organizarem através de um plano de gestão integrada de resíduos sólidos (art. 55) e até o último dia 2 de agosto de 2014 para o encerramento dos lixões (art. 54). No entanto, poucos municípios no Brasil e em Sergipe cumpriram estes prazos e agora, tentam prorrogá-lo por mais 8 anos, deixando o problema para a próxima administração.
Muito cuidado com a tentativa de amenização deste grave problema não somente ambiental, pois, infelizmente, os interessados na continuidade desta omissão têm difundido informações equivocadas para confundir a opinião pública. Acabar com os lixões é uma coisa. Coleta seletiva e reciclagem, outra.
Gerenciamento de resíduos sólidos urbanos
O lixo, denominado tecnicamente de resíduo sólido, deve ser gerenciado de acordo com suas características. No caso dos municípios brasileiros, estes são responsáveis, entre outros tipos de resíduos, pelos resíduos sólidos gerados nas residências.
Esta responsabilidade consiste no correto gerenciamento deste lixo, o que significa uma coleta, que deve ser seletiva na fonte; transporte adequado; tratamento, através da reciclagem por exemplo e disposição final de resíduos que não podem ser mais aproveitados, denominados de rejeitos.
A disposição final de rejeitos, somente pode ser efetivada em aterros sanitários conforme dispõe a Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos: “disposição final ambientalmente adequada: distribuição ordenada de rejeitos em aterros, observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos” (art. 3º, VIII). Os municípios, dentro desta sua atribuição portanto, devem atuar em todas estas fases de forma planejada e por isto, que têm a obrigação de ter um plano de gestão integrada de resíduos sólidos (art. 19) desde agosto de 2012. Não basta mais coletar o lixo e depositá-lo em aterro sanitário (em lixão nunca foi permitido legalmente). Deve haver preocupação com uma gestão sistêmica que priorize a “não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos” (art. 7º, II).
Lixões são proibidos desde 1979
A LPNRS, embora tenha oportunizado até agosto 2014 para os municípios adotarem a disposição final ambientalmente adequada de rejeitos, ou seja, aterro sanitário, isto não significou uma anistia, apagando as irregularidades anteriores e as já existentes quando da entrada em vigor da LPNRS. A Portaria 053/1979 do Ministério do Interior já condenava esta forma de disposição e, desde 1981, a poluição ambiental (consequência da disposição irregular) já era ilícito administrativo, cível e penal (isto mesmo, já era crime), sendo mais fortemente apenada com a entrada em vigor, em 1998, da Lei
9.605, que também acrescentou a ausência de licenciamento ambiental como ilícito em todas as esferas.
Em Sergipe, além da Lei da
Política Estadual do Meio Ambiente (Lei Estadual 5.858/2006) e da Lei da Política Estadual de Residuos Solidos (Lei Estadual 5.857/2006), que tratam da questão, o Conselho Estadual do Meio Ambiente (CEMA), em 2005, baixou a Resolução 14/2005, reconhecendo a situação grave dos municípios sergipanos pela utilização de lixões e estabelecendo cronograma até julho 2007 para que estes licenciassem soluções técnica e ambientalmente viáveis de disposição, o que não foi cumprido também, sem maiores consequências para os municípios infratores.
Resumindo
Portanto, os municípios devem resolver o seu problema do lixo e não podem, há mais de 35 anos, dispô-lo em lixões ou aterros controlados pois estão causando poluição e exercendo esta atividade sem licenciamento ambiental, o que deveria implicar em multas de até 50 milhões de reais, reparação dos danos ambientais provocados e pena de até 5 anos de reclusão para os gestores responsáveis (arts.
54 e
60 da Lei
9.605/1998 e
61,
62 e
66, do Decreto
6.514/2008).
Independentemente da obrigação de acabar com os lixões, os municípios devem melhorar sua coleta seletiva e investir na reciclagem com o incentivo à criação de cooperativas de catadores, por exemplo, dentre outras ações que diminuam ou reaproveitem os resíduos produzidos, minimizando estes até que seja, idealmente, tudo aproveitado (política de lixo zero - "zero waste"). Mas, repita-se, até que este modelo ideal se concretize a única forma de disposição de lixo que resta é o aterro sanitário.
Atenção
Ou seja, cuidado quando alguém é questionado sobre lixão e fala sobre coleta seletiva ou cooperativa de catadores ou consórcios ou reciclagem ou outras soluções aplicáveis às demais fases do gerenciamento. Tudo isto é necessário e serve para minimizar os resíduos produzidos, mas o que sobrar de rejeito não pode ser disposto em lixão e sim em aterro sanitário e esta é a discussão atual! 2 de agosto era para encerrar os lixões e dispor o lixo em aterros sanitários e isto, na maior parte dos municípios sergipanos, não ocorreu.
Até quando esperar?
Já houve tempo demais para a resolução do problema do lixo e pouca vontade dos administradores públicos, que sequer elaboraram plano de gestão integrada de resíduos sólidos, mas, infelizmente, tem sido comum a prorrogação de prazos, diante desta omissão, como aconteceu, por exemplo, recentemente, no caso da Lei da Política Nacional de Saneamento (Decreto
8.211/2014) ou do atual
Código Florestal(Lei
12651/2012).
O cidadão tem que cumprir com suas obrigações legais no prazo, sem direito a qualquer tolerância e prorrogações infinitas, como, por exemplo, no pagamento de IPTU, sob pena de sanções. Da mesma forma, não é razoável nem justo que o município fique indefinidamente sem resolver o problema do lixo e não sofra sanção nenhuma por isto. E para resolver este problema falta apenas vontade: vontade de quem administra e vontade de quem vota!
Sandro Costa - Doutorando em Meio Ambiente pela UFS; Mestre em Meio Ambiente (UFS); Professor universitário (Direito ambiental e Direito Penal); Membro da Associação Brasileira do Ministério Público do Meio Ambiente; Membro da Rede Latino-Americana de Ministério Público Ambiental, Especialista em Direito Constitucional Processual (UFS)