quinta-feira, 1 de maio de 2014

A difamação da política afeta o eleitor, por Mauricio Dias, in Carta Capital

Análise / Mauricio Dias


As pesquisas mostram que, fosse hoje o pleito, 62% dos eleitores não votariam em ninguém
por Mauricio Dias — publicado 26/04/2014 10:01
ABr
Excetuada uma vitória do pastor Everaldo Pereira, por qualquer razão natural ou sobrenatural, não há até agora e, talvez nem haja até o dia da eleição, novidade maior do que o refluxo de eleitores apontado nas pesquisas eleitorais recentes. A soma dos porcentuais de votos brancos e nulos, de rejeição e daqueles que não quiseram ou não souberam responder, está próxima dos 40%. É um porcentual inédito e expressa, aproximadamente, quase 50 milhões de um total de 140 milhões de eleitores brasileiros.
Há dados conjunturais diversos dando vida a esse problema. Alguns são antigos e outros, mais modernos, como é o caso da demonização dos políticos. Dos gregos de ontem aos brasileiros de hoje, os eleitores, na essência da escolha, pouco mudaram. A urna eletrônica não modifica razões pessoais do cidadão na hora de votar.
Essa demonização não vem de longe. Foi acentuada, radicalizada pela mídia conservadora, após a vitória do metalúrgico Lula, em 2002. O ataque aos políticos, resumidamente, tem sido sempre, até agora, uma tentativa de desestabilizar a base governista. É preciso dizer com franqueza, porém, que os políticos contribuem para tanto.
O descrédito facilitou a ingerência de uma questão chamada judicialização da política, que, por sinal, perturba o processo democrático ao longo do mundo. Por aqui, ela tem favorecido a eleição de procuradores e, mais recentemente, soprou para os lados do ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal. Ele ficou feliz. Mas não se arriscou à prova real da popularidade obtida após o julgamento da Ação 470, mais conhecida como “mensalão”.
A pesquisa VoxPopuli divulgada por CartaCapital, na edição anterior a esta, buscou provocar o eleitor a falar do sentimento dele, a satisfação e a insatisfação, com o Brasil. Os satisfeitos somaram 54% e os insatisfeitos, 46%. A diferença não é grande.
Em 2013, após as manifestações populares entre junho e julho, o Ibope mediu o Índice de Confiança Social (ICS) da população nas principais instituições de poder.
A queda na confiança é ampla e atinge os bombeiros e parte das instituições tradicionalmente mais confiáveis (tabela).
Em pesquisa mais recente, os números do Ibope consolidam esse momento adverso a partir de sondagem sobre a intenção de votos para a Presidência.
Dos 37% que recusaram todos os candidatos, 72% não têm nem um pouco ou quase nenhum interesse na próxima eleição de 2014. Um dos pontos mais curiosos, indicativo do desencanto do eleitor,  pode ser tirado dos que responderam “ruim e péssimo” na avaliação de Dilma: 62% não votariam em ninguém se a eleição fosse hoje.
É uma sinalização objetiva que ajuda a explicar por que Aécio Neves e Eduardo Campos não herdam os eleitores que, até agora, tiraram o apoio à reeleição de Dilma.

quarta-feira, 30 de abril de 2014

Erro no acerto


Repercussão de pesquisa sobre estupro evidencia que é preciso aprofundar o assunto, apesar do índice errado quanto à mulher ‘merecer’ ser violentada, diz socióloga

05 de abril de 2014 | 14h 46

Mônica Manir - O Estado de S. Paulo
Não diria surpresas, mas espantos. O primeiro foi saber, na semana passada, que 65,1% da sociedade brasileira concordava com a frase "mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas". O segundo foi ser informada, na sexta-feira, de que o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), autor da pesquisa dos 65,1%, revertera esse número para 26%. Era uma errata no resultado mais divulgado da Tolerância Social à Violência contra as Mulheres, à qual tantas mulheres reagiram com a hashtag "EuNãoMereçoSerEstuprada". O Ipea estava nu.
Desencosta! Manifestantes na entrada da Estação Sé do metrô fazem ‘rolezinho contra as encoxadas’ - Daniel Teixeira / Estadão
Daniel Teixeira / Estadão
Desencosta! Manifestantes na entrada da Estação Sé do metrô fazem ‘rolezinho contra as encoxadas’
"Foi um erro rústico no processamento e na publicação", diz a socióloga e pesquisadora Fátima Pacheco Jordão. Com décadas de experiência na análise de pesquisas, ela não desqualifica a aplicação dessa última. Muito menos o tema central. São meio milhão de estupros e violências contra a mulher anualmente, afirma, e isso apenas os casos notificados. Os não notificados poderiam abrir uma conta de 14 mil por dia.
Para Fátima, mãe de duas filhas e conselheira do Instituto Patrícia Galvão, a repercussão toda só incentiva mais enquetes. "O estupro é um fenômeno que está no eixo do machismo, não é ponto de curva."
Como analisar o erro na pesquisa do Ipea?
Fátima Pacheco Jordão - O erro foi grosseiro e rústico porque não é um erro na aplicação da pesquisa, mas no processamento e na publicação. Normalmente a gente pensa em erro por causa da amostra, por causa das desproporções, dos vieses e assim por diante. Mas não é um erro técnico, é de edição. Uma conferência simples o filtraria imediatamente. Acho que perceberam o equívoco porque houve uma enorme repercussão na sociedade, com a presidente se manifestando no Twitter, mulheres improvisando frases e usando seu corpo para expressar revolta e reação contra esse dado.
Quanto isso compromete a imagem do instituto?
Fátima Pacheco Jordão - Não compromete totalmente, mas compromete. O Ipea tem adversários políticos, os conservadores vão desqualificar a pesquisa porque ela denuncia coisas que as pessoas acham que não devem ser denunciadas, briga de marido e mulher tem que se restringir à casa e por aí vai.
Mas, uma vez detectado o erro, o tema não perde a relevância.
Fátima Pacheco Jordão - Claro que não. É exatamente o contrário: a repercussão evidencia que esse tipo de tema deve ser mais e mais pesquisado. Não se está metendo a colher, mas metendo o dedo numa ferida da sociedade brasileira. Tenho aqui uma pesquisa feita pelo Instituto Patrícia Galvão com o Data Popular encomendada por oito instituições, entre elas o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional de Defensores Públicos Gerais. Ela é de maio de 2013, um ano atrás, portanto. Entre as frases, há uma que se aproxima daquela que gerou a confusão na pesquisa do Ipea: "Mulher que apanha é porque provoca". 65% discordaram, 17% concordaram e outros 17% nem concordaram nem discordaram.
O que isso significa? Que a sociedade brasileira está indo na direção certa?
Fátima Pacheco Jordão - Significa que as pessoas não compram essa ideia. Isso está muito claro na pesquisa. "Bater na parceira não deve ser crime" era outra frase. 88% discordaram. Ou seja, a pesquisa tem algo na mesma direção do "homem que bate deve ir para a cadeia" do levantamento do Ipea. Ao mesmo tempo, 85% de homens e mulheres concordam que as mulheres que denunciam seus maridos e namorados agressores correm mais risco de serem assassinadas por eles. Isso expressa que a situação está muito pior do que aparenta.
O que comprova a subnotificação.
Fátima Pacheco Jordão - Evidentemente. No Brasil, meio milhão de estupros e violência contra a mulher ocorrem anualmente. Meio milhão notificado, isto é, cerca de 1.400 por dia. Se isso corresponde apenas aos 10% que se sabe serem notificados, multiplica-se por 10 e chegamos a 14 mil estupros e violência diários. O fenômeno está no centro do machismo, não na beirada da patologia. Está no eixo da cultura patriarcal, não é ponta de curva. É o controle no limite físico da mulher - ou por agressão ou por estupro.
Na pesquisa do Ipea já revista, quando se fala em violência factual há uma reprovação dos entrevistados. Mas, quando usaram ditados populares como ‘em briga de marido e mulher não se mete a colher’, apareceu uma aprovação. Isso não lhe parece contraditório?
Fátima Pacheco Jordão - Não é contraditório. As escalas é que têm conteúdos diferentes. A pesquisa traz o lado conformista, que parte de ditos populares, mitos sociais, frases cujo conteúdo é ultrapassado e com as quais é fácil concordar até metaforicamente. Sim, "roupa suja se lava em casa", "em briga de homem e mulher ninguém mete a colher". Agora "homem tem de ser preso?" Tem. "Homem pode gritar e xingar as mulheres?". Não. Enquanto é ideológico, refletido pelos ditados, as pessoas tendem a ser mais tolerantes com a violência. Quando a opinião é baseada na prática, fica mais clara a resistência. Essa pesquisa e a do Instituto Patrícia Galvão não retratam uma sociedade eminentemente conservadora, mas uma sociedade em transformação.
É fundamental fazer uma pesquisa por sexo? Descobrir o que disseram as mulheres e o que disseram os homens? Isso não apareceu na pesquisa do Ipea.
Fátima Pacheco Jordão - Foi algo que achei falho na análise dos dados - e aí não tem a ver com a formulação. Em todas as pesquisas que conheço ligadas a tensão de gênero, seja mulher na política, seja violência, seja direito das mulheres, existe uma resposta muito maior das mulheres em relação à dos homens, mostrando a sensibilidade delas para a questão. Na pesquisa do Ipea, em algum momento eles afirmam que há a chance de as respostas femininas serem 1.7 mais altas, quase o dobro das masculinas. Um exemplo hipotético e aproximado: se entre mulheres a concordância for de 40%, entre homens será de 68%. Então, nos graus de licença para a violência, não se pode concluir que as mulheres são machistas sem que os dados sejam analisados por sexo separadamente. Se cortar a pesquisa por gênero com a diferença que eles mesmos apontam, há coisa aí. Ela está retratando uma fotografia na qual aparecem uma zebra e um cavalo. Teria necessariamente de ser analisada dos dois pontos de vista. Porque são dois pontos de vista conflitantes.
Esse conflito tem se acentuado?
Fátima Pacheco Jordão - Em relação aos direitos das mulheres, sim. Está se alargando. Mais ou menos como estão se alargando as distâncias entre as pessoas mais pobres e mais ricas com relação a políticas sociais. A expressão da violência é derivada do inconformismo dos detentores do poder, no caso os homens, com a capacidade das mulheres de expressar, enunciar e ver a violência como fenômeno social. Elas a enxergavam como problema individual: será que eu olhei de maneira enviesada para algum homem? Será que a minha saia estava mais curta? Esses controles estão perdendo a eficácia.
Qual é a potência de uma hashtag como EuNãoMereçoSerEstuprada na diminuição desse controle?
Fátima Pacheco Jordão - É enorme. Não precisa juntar trinta pessoas na frente do Theatro Municipal. Você tira um selfie, escreve algumas coisas no corpo e, no caso dessa jornalista, ainda pode dizer: "Meu marido me ajudou". Outras fotos apareceram, isso ganha uma tremenda difusão. A internet está fazendo uma revolução para a qual a sociedade talvez não esteja preparada, e não é só no caso do gênero.
Por que não estaria preparada?
Fátima Pacheco Jordão - Há um processo de aprendizagem desde o processo formal escolar até a literatura, passando pela ficção de massa - a novela -, que ainda é muito retrógrada. Essa mulher que está na propaganda representa você? Não. A mulher é sempre apresentada como bobinha, imóvel, manipulável, o marido é quem está na ponta da mesa e define como será a assinatura da TV.
Ou é apresentada como objeto de sedução. Vide a propaganda ‘trem é bom para xavecar’.
Fátima Pacheco Jordão - É de um insulto...! E aí vem a frase do secretário de Estado de Transportes Metropolitanos (Jurandir Fernandes) sobre a repercussão desses casos de abuso no metrô: "Como não tinham nada para falar, entrou a história do assédio, assédio, estupro, estupro". O relato das mulheres que são assediadas no metrô é uma coisa tremenda. Isso tem anos e anos e anos. Até se inventou vagão feminino.
A jornalista que divulgou a hashtag disse que, cinco minutos depois de postar, recebeu ameaça de estupro; dez minutos depois, aparecia num site pornô pedindo para ser violentada. Como avaliar essas reações virtuais?
Fátima Pacheco Jordão - A nossa sociedade tem um verniz de igualdade entre homens e mulheres com regras muito férreas de agressão, pressão e desqualificação por parte deles em relação a elas. Tudo o que ultrapassa os limites impostos pelos opressores gera comentários na internet muito próximos aos de rodas de bar. O manejo disso é um processo de aprendizagem. Mas, efetivamente, os graus de liberdade que um indivíduo tem hoje de expressar o que pensa, para o bem e para o mal, consistentemente ou não, é enorme. A internet talvez seja a expressão mais crua do ambiente cultural.
É sabido que um acusado de estupro corre grande risco de ser violentado na cadeia. O que leva a sociedade a aceitar isso? Sede de vingança?
Fátima Pacheco Jordão - Nesses datenas da vida, programas que passam à tarde, a desqualificação do agressor está quase igual à desqualificação da mulher. O estuprador é visto como monstro, o que não resulta num aprendizado. Ao contrário: se confirma a polarização. Mas eu não vejo um grande debate sobre isso. Nunca vi. Acho coerente com o que pesquisei no início da década de 1990, durante a campanha para a Prefeitura de São Paulo em que se opunham Suplicy e Maluf. Numa entrevista na rádio, o Maluf disse o seguinte: estupra, mas não mata. Demorou muito para o PT reagir, uns 15 dias. O partido testou isso e descobriu que os homens se revoltavam mais do que as mulheres com a frase do Maluf, mas dentro da ótica machista: eles viam a sua mulher sendo estuprada. Então a ameaça que o estuprador representa para o homem é a ameaça ao machismo. Quanto mais fundo se mergulha nesse poço, mais oprimida se enxerga a mulher, real e virtualmente.
Falta analisar as consequências do estupro para uma mulher?
Fátima Pacheco Jordão - Falta. Você imagina as consequências para a vida? Não tem que pesquisar isso? Há repercussão em todas as áreas - na saúde, por exemplo. DSTs, gravidez precoce, abortos feitos em condições clandestinas... Porque, embora o aborto seja legal nessa condição de estupro, há campanhas para que não seja feito. Expõe crianças de 12, 13 anos, especialmente quando violentadas por pais, tios, padrastos. Agora veja: estamos numa época em que a Igreja resolveu peitar a pedofilia. Quer mais progresso que isso?

Laços de tortura


06 de abril de 2014 | 2h 10

KENNETH SERBIN - O Estado de S.Paulo
As Forças Armadas vão investigar torturas e mortes ocorridas em sete instalações militares usadas para prender e interrogar presos políticos durante a ditadura (1964-1985). A decisão, divulgada na terça-feira, foi tomada após pedido da Comissão Nacional da Verdade.   Enquanto os brasileiros refletiam, na semana que passou, sobre os 50 anos do golpe de 1964 e sobre os esforços das comissões da verdade para lançar uma nova luz sobre as atrocidades da ditadura militar, a imprensa americana revelava que a Agência Central de Inteligência (CIA) enganou os americanos quanto ao uso oficial da tortura depois dos ataques terroristas do 11 de Setembro.
Segundo as conclusões de um relatório de 6.300 páginas elaborado pelo Comitê de Informações do Senado americano, a CIA ocultou detalhes da severidade de seus métodos e exagerou a importância dos planos terroristas e dos prisioneiros.
O relatório revelou ainda que a agência levou crédito por elementos cruciais da coleta de informações quando, na realidade, os suspeitos os revelaram antes de serem submetidos a tortura.
Embora as notícias da imprensa refletissem a tendência de alguns americanos de substituir o termo "tortura" por eufemismos como "técnicas avançadas de interrogatório", alguns dos detalhes que vazaram do relatório deixaram claro que a CIA cometeu o que muitos considerariam graves violações dos direitos humanos.
O jornal The Washington Post, por exemplo, descreveu o tratamento dispensado aos prisioneiros nos black sites, locais de detenção secretos, inclusive um deles no Afeganistão conhecido como o Salt Pit (poço de sal). Ali, os torturadores mergulhavam a cabeça de um indivíduo num tanque de água gelada por períodos prolongados, espancaram-no e bateram sua cabeça numa parede.
Outros prisioneiros foram submetidos a tortura com água fria. O relatório do Senado afirma que os médicos da CIA verificavam a temperatura dos presos para impedir que chegassem à hipotermia.
O presidente Barack Obama eliminou os locais de detenção secretos em 2009.
O emprego da tortura não proporcionou grandes avanços em matéria de coleta de informações, concluiu o relatório. O Post citou um funcionário a par do documento segundo o qual a CIA apresentou "reiteradamente" seu programa de interrogatórios "ao Departamento de Justiça e até ao Congresso como indispensável para obter informações específicas, que, de outro modo, não seria possível colher, e que permitiram aniquilar os planos terroristas e salvar milhares de vidas. Era verdade? A resposta é não".
As revelações provavelmente reacenderão o debate sobre a eficácia da tortura na eliminação do terrorismo e a moralidade dessa prática. Por enquanto, os adversários da tortura aparentemente ganharam um ponto fundamental para seu lado.
Os abusos descritos têm uma série de paralelos com as atitudes e práticas das forças de segurança da ditadura brasileira. É notório que o regime empregava em alguns casos médicos para verificar o estado de saúde dos presos submetidos a tortura para determinar, por exemplo, se haviam chegado ao limite. Manter a cabeça dos presos na água por longos períodos de tempo era uma prática comum.
Os torturadores do Brasil tiveram o apoio implícito dos líderes do regime até que o presidente Ernesto Geisel começou a reduzir o poder das forças de segurança, em 1974. Na época, o Congresso brasileiro não tinha nem o poder nem o desejo de investigar a tortura.
Somente agora - quase 30 anos depois do fim do regime - a Lei da Anistia talvez possa ser revista para permitir a punição dos torturadores. Pela primeira vez, o povo brasileiro é favorável a uma revisão da lei.
Por solicitação da Comissão Nacional da Verdade, as Forças Armadas do Brasil concordaram em investigar os abusos ocorridos em alguns dos locais de interrogatório mais ativos durante a ditadura. O ministro da Defesa, Celso Amorim, afirmou que o processo levará 30 dias - um período excessivamente curto para um assunto dessa gravidade.
Nos Estados Unidos, jamais foi criada uma comissão da verdade para investigar a conduta de militares nas várias guerras internas e externas em que o país se envolveu desde 1776, embora militares tenham sido condenados por atrocidades, inclusive assassinato.
Alguns cidadãos americanos pediram a instalação de uma comissão para investigar os abusos da era pós-11 de Setembro. A proposta teve pouca cobertura da imprensa e não recebeu grande impulso em termos políticos.
De acordo com essa tendência, e apesar dos fatos incriminadores contidos no relatório do Senado, é improvável que um funcionário da CIA seja punido pela prática da tortura.
Usando pareceres jurídicos secretos, o governo de George W. Bush (2001-2009) autorizou oficialmente o uso da tortura. Por isso, o relatório não investigou os motivos dos envolvidos nessa prática, e não recomendou nenhuma ação criminal ou administrativa contra eles.
Além disso, o Senado divulgará somente as "apurações, as conclusões e o resumo técnico do documento", afirmou no início de março a presidente do Comitê de Informações, senadora Dianne Feinstein. O grosso do relatório permanecerá secreto - em grande parte porque a própria CIA será encarregada de determinar os trechos a serem divulgados.
A questão que fica no ar tanto nos EUA quanto no Brasil é: alguém, em algum momento, irá para a cadeia pela prática da tortura política? / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA
 KENNETH SERBIN É DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DA UNIVERSIDADE DE SAN DIEGO , E AUTOR DE DIÁLOGOS NA SOMBRA: BISPOS , E MILITARES,  TORTURA, JUSTIÇA SOCIAL , NA DITADURA (COMPANHIA DAS LETRAS)