10/09/2013 17:11 |
(*) Especial, Observatório da Imprensa (www.observatoriodaimprensa.com.br), Circo da Notícia, 10 setembro/2013 |
O Globo, em editorial, arrepende-se de ter apoiado a deposição do Governo Goulart, em 1964, e os governos militares que se seguiram. Os motivos que levaram a empresa a modificar uma posição de quase 50 anos, e que tinha sido adotada por seu fundador e ícone máximo, Roberto Marinho, estão sendo e serão amplamente debatidos, investigados, aprovados, rejeitados nos mais diversos veículos informativos. O tema aqui é outro: a radicalização dos profissionais de comunicação chegou a um ponto que, desde a guerra contra a direção da TV Cultura de São Paulo, que chegou ao ápice com a prisão de boa parte de sua equipe jornalística e o assassínio, pela ditadura militar, do jornalista Vladimir Herzog, se imaginava inatingível.
Não, não era: atitudes nefastas, desumanas, que já deram errado no passado, se repetem hoje, embora com sinal trocado. Jornalistas radicais no apoio ao bolivarianismo publicaram notas exigindo que as Organizações Globo, após o repúdio a sua posição anterior, demita alguns dos principais jornalistas da Casa, pelo crime de seguir a linha editorial que a empresa até então mantinha. Nada diferente daquilo que jornalistas radicais no apoio ao regime militar exigiam do Governo paulista, ao qual a TV Cultura era (e é) ligada: a demissão de alguns dos principais profissionais ali colocados para executar a linha política da Casa. Na pressão para derrubar a equipe de Jornalismo da empresa, chamava-se a TV Cultura de "Viet-Cultura", numa referência aos vietcongs comunistas que lutavam no Vietnã do Sul; pedia-se às Forças Armadas que os jornalistas que não eram apreciados pelos radicais se "hospedassem" no "Tutoia Hilton", nome que davam ao sinistro centro de tortura e morte do DOI-Codi, situado numa delegacia da rua Tutoia, em São Paulo. Deu no que deu. E a lição não se aprendeu. Hoje em dia, ainda bem, não há condições de pedir que os jornalistas com ideias diferentes das bolivarianas sejam presos e enviados a centros de tortura. Por enquanto, os radicais malucos se contentariam em deixá-los sem emprego. Ficariam felizes com isso - mas, se tivessem chance de avançar, até onde iriam? E, por falar nisso A Rede Globo tinha uma posição e a modificou. Está em seu direito, ponto. Mas algumas das justificativas apresentadas para isso não se sustentam. Então é preciso ouvir a manifestação das ruas? Pois, em 1964, a Marcha da Família em São Paulo, repetida logo depois no Rio, foi uma tremenda manifestação das ruas. A Passeata dos Cem Mil, no Rio, foi uma gigantesca e importantíssima manifestação das ruas (e as Organizações Globo tomaram posição contrária não apenas às posições da passeata, mas também à própria passeata). As Diretas-Já foram manifestações de rua de grande porte, no país inteiro, e a Globo foi contra. Fora do Brasil, houve manifestações monumentais contra o presidente De Gaulle, na França; e, em seguida, manifestações monumentais em favor do presidente De Gaulle. A Globo não mudou sua posição: no quadro político francês, sua simpatia inequívoca estava com De Gaulle, fossem quais fossem as manifestações do dia. E, muito antes que se imaginasse a existência de imprensa, rádio, televisão e Rede Globo, a multidão se manifestou inequivocamente pelo perdão a Barrabás e não a Jesus Cristo. Não havia Globo na época. Mas, conhecendo-se a fé católica tanto de Roberto Marinho como de seus filhos, se Globo houvera estaria contra Barrabás, contra a multidão, contra a voz rouca das ruas, e a favor de Cristo. Perdeu, mas ganhou A notícia publicada informa que as Organizações Globo fizeram um acordo com o Cade, Conselho Administrativo de Defesa Econômica, para suspender práticas comerciais que excluíam concorrentes do mercado publicitário. Pelo acordo, as Organizações Globo não poderão vender o jornal Extra, nem aceitar propaganda nele por preço abaixo do custo; nem impor exclusividade na compra de espaços publicitários: nem oferecer descontos condicionados à divulgação de propaganda em mais de um dos jornais editados pelo grupo; nem oferecer condições especiais para publicidade em TV aberta. Esse tipo de procedimento, segundo o SDE, Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, configura infração à ordem econômica. Uma derrota? Sim: as Organizações Globo não poderão manter a atual conduta. Mas, no final das contas, a Globo ganhou a parada. O processo foi iniciado em 2005 pelo Jornal do Brasil e pelo O Dia, que se julgaram prejudicados. Nos oito anos decorridos de lá para cá, a edição impressa do Jornal do Brasil, sufocada, fechou; e a edição eletrônica não reproduz nem de longe a importância que o JB teve em outros tempos. O Dia, de lá para cá, também perdeu boa parte de seu poderio. Agora, que foi proibida, a conduta anticoncorrencial não é mais necessária. Uma grande perda 1 Rosi Mallet foi uma excelente jornalista, excelente planejadora de estratégias de comunicação empresarial; e, acima de tudo, uma pessoa maravilhosa. É difícil, para um colega de tantos anos, usar a palavra "foi". Mas Rosi foi-se, levada por um enfisema pulmonar. Rosi, com bela carreira no Rio e em São Paulo, com experiência de Gazeta Mercantil, à época o mais importante jornal econômico do país, chegou à Folha da Tarde com uma missão quase impossível: conciliar o noticiário econômico correto, preciso, informativo de um matutino com o tom mais solto, mais popular, de um vespertino. Não teve problemas: montou uma belíssima editoria econômica voltada mais para o consumidor do que para os grandes negócios. E formou gente de primeira linha, ensinando a jovens talentosos que a linguagem flexível de um vespertino tinha de transmitir a informação absolutamente precisa, à prova de desmentidos, e sempre inteligível. Mais: como salientou outro notável jornalista, Fernando Portela, Rosi era o símbolo da "incorrupção". Afável, simpática, fácil de conversar, mas absolutamente impermeável a qualquer sugestão de práticas jornalísticas heterodoxas. Rosi foi por muitos anos casada com outro esplêndido jornalista econômico, Teodoro Meissner; seu filho, Gabriel Meissner, é um dos melhores blogueiros da praça, transitando com facilidade pelos mais diversos temas (e criando frases especialmente criativas e engraçadas). Uma vida curta, sem dúvida; mas de alta produtividade. O jornalismo brasileiro fica mais pobre sem ela. Uma grande perda 2 Não, este colunista não era da turma de Telmo Martino. Seus amigos, seus companheiros eram pessoas mais ligadas às artes plásticas, à noite, à boa música, ao teatro, ao cinema. Mas tive o prazer de conviver com Telmo por muitos anos, no Jornal da Tarde, SP. Telmo se notabilizou por frases ácidas, impecáveis, e isso num serpentário também habitado por jornalistas de língua bífida como Humberto Werneck e Fernando Portela. Mas o que me chamava mais a atenção em Telmo não era a gilete que carregava nas teclas da máquina de escrever: era sua impressionante cultura geral. Conhecia jazz, conhecia bossa nova, conhecia cinema, discutia com pessoas do nível de Sérgio Augusto clássicos como Os brutos também amam, sabia tudo de dramaturgia, circulava sem medo em áreas como artes plásticas. Inglês e português falava com igual facilidade, ambos muito bem; acompanhava, embora sem a mesma volúpia, a política internacional. E, somado a isso, era tímido, educado, incapaz de levantar a voz. Grande figura. Telmo teve uma experiência em revistas, após o JT, e não gostou. Washington Olivetto o levou para a W, buscando aprimorar o texto dos seus premiados e criativos anúncios. Mas Telmo não se sentia bem no meio publicitário, embora tivesse profunda admiração e carinho por Olivetto. Acabou voltando para o Rio; e lá, embora com muitos amigos, foi-se isolando cada vez mais, talvez deprimido, talvez insatisfeito. E, tantos anos depois de sua saída, ainda havia muitos e muitos leitores do JT pedindo sua volta. Telmo deixa muitas saudades. Pimenta, um livro É um caso emblemático do funcionamento das leis brasileiras. Antônio Marcos Pimenta Neves, jornalista de sucesso que havia dirigido a Gazeta Mercantil, sido correspondente da Folha nos Estados Unidos, que dirigia O Estado de S. Paulo, matou por ciúmes a namorada que o abandonara, Sandra Gomide. Estava enlouquecido: aquele profissional sensato, correto, seguidor das normas, pediu uma arma emprestada e, em 20 de agosto de 2000, assassinou a moça. Assassinou, confessou, apresentou-se à Polícia. Levou onze anos para ser julgado e condenado. Da pena de 15 anos, cumpriu um sexto, conforme manda a lei. E acaba de receber da Justiça o direito de cumprir o restante em regime semiaberto. Livre de dia, deve apresentar-se à prisão à noite. O jornalista Vicente Vilardaga, que trabalhou com Pimenta e Sandra, em posição de destaque, e acompanhou o caso de perto, acaba de lançar o livro À Queima-Roupa - o caso Pimenta Neves. Trata do assassínio; mas questiona principalmente o comando dos órgãos de imprensa, já que, segundo diz, Pimenta deixou claro, muito antes de matar Sandra Gomide, que tinha perdido o controle. A própria demissão de Sandra, logo após ter encerrado o namoro e 50 dias antes do assassínio, deveria ter mostrado aos diretores da empresa que ele não estava agindo normalmente. Um livro que precisa ser lido por quem se preocupa com o futuro das empresas de comunicação, sejam em papel, sejam eletrônicas: como funciona sua governança? Será tudo permitido aos chefes, dentro das redações? Mulher e anjo Muitos ouviram falar de Oskar Schindler, o industrial alemão que salvou da morte muitos dos perseguidos pelo nazismo, e que foi celebrizado num belíssimo filme de Steven Spielberg, A lista de Schindler. Poucos conhecem a história de uma heroína que obteve resultados ainda maiores que os de Schindler: Irena Sendler. O livro A história de Irena Sendler - a mãe das crianças do Holocausto, da escritora polonesa Anna Mieszkowksa, que acaba de chegar às livrarias, conta a magnífica história dessa mulher notável. Irena era assistente social em Varsóvia quando a capital polonesa foi ocupada pelos nazistas, em 1939. Os judeus foram levados para um gueto e lá deixados, para morrer de fome. Os sobreviventes seriam levados para campos de extermínio. Irena entrou na Zegota, organização clandestina de ajuda aos judeus, e arriscou diariamente sua vida para salvá-los. Mais de duas mil crianças sobreviveram ao massacre nazista graças à sua atuação pessoal. Com o fim da guerra, Irena ficou na Europa comunista. Ela era ativista, mas não comunista; e por isso viveu sob rígida vigilância da Polícia polonesa. Com a queda do Muro de Berlim, em 1989, e o colapso do comunismo na Europa Oriental, sua história se tornou conhecida. E está neste livro. Ele esteve lá Orlando Duarte, 81 anos de idade, mais de 60 de profissão, já cobriu 14 Copas do Mundo (inclusive, ao lado deste colunista, a Copa do México, de 1986). Assistiu aos cinco títulos conquistados pelo Brasil: Suécia, Chile, México, Estados Unidos, Coréia-Japão. Seu livro Paixão - O Brasil de todos os Mundiais conta a história da Copa do Mundo do ponto de vista de um brasileiro que esteve lá. Lançamento dia 12, no Museu do Futebol (Estádio Municipal do Pacaembu, SP), às 19h. Vale a pena chegar cedo. A menos que o caro leitor goste de multidões. TIM- como eles escrevem Um assíduo leitor desta coluna tenta há meses fazer com que a TIM volte a enviar-lhe a fatura detalhada do uso dos celulares. Impossível: a turma do estamos providenciando para que o senhor possa estar reclamando não funciona. Depois de meses de luta, recebeu a seguinte carta, em que há o trecho citado (respeitada a língua utilizada, que tem vaga semelhança com o português): "(...) informamos que devidos o programa de sustentabilidade,grandes empresa como a Tim,adotou o método de fatura digitalizada,a qual cliente com acesso a área exclusiva consegue visualizar a fatura de forma detalhada,podendo fazer o Download das faturas para analise, essa fatura é realizada o Dowloand em formado PDF" (...)" Aí, em linguagem semelhante a essa, vêm as instruções passo a passo. E? O caro leitor acertou: as instruções não funcionam. Pelo jeito, os serviços da TIM são como aquele trem azul: pura propaganda. E certamente há na TIM uma assessoria de imprensa. Será que é preciso, mesmo, usar o Google Translator a frio para montar um texto de uma página? Como é mesmo? Do portal noticioso de um grande jornal regional, a respeito do pesado trânsito na cidade: Do verbo "pacienciar". Exemplo de conjugação: "Pacienciaríamos ao ler certos textos?" ...é... De um grande jornal impresso, de circulação nacional: Embora seja desfalque, conforme diz o jornal, de alguma forma Guerrero vai marcar uma quantidade de gols que reduzirá a diferença que o separa de Pato. É uma novidade futebolística, a Regra 18, que cuida dos gols in absentia. ...mesmo? De um grande jornal impresso, de circulação nacional, que atribuiu a frase a um secretário de Estado: Doloso, culposo, ruinoso, tudo é a mesma coisa. Ou pelo menos rima. É isso aí De um grande jornal impresso, cujo texto já foi considerado, em outras épocas, um modelo de bom uso do idioma: "(...) a cachorra latiu para alertar o local onde estava o bebê" O local, devidamente alertado pelos latidos, tomou as providências necessárias para chamar a família do bebê. Frases Da jornalista Mirna Grzich, sobre a morte do grande cronista de costumes Telmo Martino: Telmo Martino foi o pai da Mídia Naja Do ex-campeão de basquete Oscar Schmidt, o Mão Santa: A única vez em que votei em uma pessoa honesta foi em mim. Do repórter e escritor Cláudio Tognolli: No jornalismo, tive vários chefes. Todos eram mais velhos que eu: hoje são mais jovens. As não notícias A coisa vai se espalhando: há algum tempo, as supostas informações seriam colocadas eventualmente em dúvida por quem as publicava para evitar possíveis processos. Agora - bom, agora qualquer motivo é bom. Por exemplo: Afinal, está noiva ou não está? E eu com isso? Ainda bem que a era digital reduziu grandemente o consumo de papel nos meios de comunicação. Seria uma pena que notícias como essas exigissem a derrubada de árvores. Mas agora dá para acompanhar a doce vida dos famosos sem mexer com madeira, celulose e papel: 1 - Zac Efron aparece sem camisa em foto de nova comédia 2 - Recém-separado, Victor lança clipe com Leo sobre história de amor 3 - David Beckham circula com um de seus carros de luxo por Los Angeles 4 - Famosos levam os filhos ao circo 5 - Justin Bieber devora x-burguer em Sunset Boulevard 6 - Ronaldo e namorada curtem passeio de bike em Barcelona 7 - Lady Gaga festeja volta aos palcos de body transparente 8 - Fernanda Lima na praia com a família 9 - Olivia Wilde usa paletó sem nada por baixo em evento 10 - Gisele brinca com a filha em parque 11 - Integrantes da banda Emblem3 curtem praia no Rio 12 - Bebel Gilberto é fotografada em praia O mundo se curva Uma assídua leitora desta coluna nos envia alguns recortes de jornais americanos, mostrando que a imprensa de lá se curva às normas brasileiras e dá manchetes pelo menos tão criativas quanto as nossas: 1 - "Diana ainda estava viva horas antes de morrer" 2 - "Tiger Woods joga com suas próprias bolas, informa a Nike" Apoiado! Tiger Woods faz muito bem de jogar com suas próprias bolas. O grande título A safra semanal é excelente: começa com Kaká, de volta ao Milan, clube onde atingiu o auge da carreira, há alguns anos, e no qual jogava quando foi escolhido o melhor jogador do mundo. Considerando-se que salário uma vez menor é igual a zero, o jornal está afirmando que Kaká não apenas trabalhará de graça, sem receber nada, como ainda terá de pagar pelo privilégio de emprestar seu futebol ao time. Há também títulos difíceis de entender, em diversos graus. Grau 1: Traduzindo: o jovem que levou várias pancadas na cabeça, e estava sendo enterrado vivo na areia quando a Polícia chegou, continua no hospital. Grau 2: Este colunista não entendeu nada.Talvez algum especialista em português distorcido consiga traduzi-lo. E há o grande título, referente àquele prédio em Londres construído em tal formato que seus vidros funcionam como lente de aumento e concentram o calor do Sol em determinado ponto. A notícia não diz se o prédio acusado está sujeito a pegar uma preventiva. |
sexta-feira, 13 de setembro de 2013
As rainhas de copas. Carlos Brickmann, para o Observatório da Imprensa
Há 3 anos sem uso, portas do metrô de SP são alvo de investigação
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LEANDRO MACHADO
ANDRÉ MONTEIRO
DE SÃO PAULO
ANDRÉ MONTEIRO
DE SÃO PAULO
Instaladas há três anos e ainda sem uso, as portas de vidro que deveriam aumentar a segurança dos passageiros na estação Vila Matilde da linha 3-vermelha do metrô, o ramal mais superlotado da rede, viraram alvo de investigação do Ministério Público de São Paulo.
A Promotoria abriu inquérito no mês passado para apurar suspeitas de "prejuízo ao erário e atos de improbidade administrativa" na compra dos equipamentos, que estão sem função desde 2010.
As portas instaladas na estação deveriam impedir a queda de passageiros e objetos nos trilhos, evitar acidentes e ajudar no embarque.
Mas só as molduras foram instaladas, deixando buracos abertos na plataforma.
Esses equipamentos existem nos metrôs de Paris e Seul, por exemplo, além da linha 4-amarela e parte da linha 2-verde em São Paulo.
A investigação da Promotoria foi aberta com base em processo do Tribunal de Contas do Estado para apurar os valores do contrato e os motivos de a instalação das portas não ter sido concluída.
Eduardo Anizelli/Folhapress | ||
Portas automáticas da estação Vila Matilde, na linha 3-vermelha do Metrô, não funcionam; elas foram instaladas há três anos |
O TCE diz que a proposta original previa 48 portas (em 18 estações) por R$ 72,5 milhões. Em seguida, a quantidade de portas exigida baixou para 24, mas praticamente sem mudança no preço.
A licitação teve como participante só um consórcio --formado pelas empresas Trends Engenharia, de ex-funcionários do Metrô, e pela fabricante sul-coreana Poscon.
O contrato foi assinado em abril de 2009 por R$ 71,4 milhões.
O mesmo inquérito, sob responsabilidade do promotor Saad Mazloum, investiga o contrato assinado com a Alstom em 2008 para a implantação do CBTC, sistema de sinalização mais moderno, em três linhas.
ATRASO
A Vila Matilde seria a primeira de 12 estações da linha 3 que receberiam as portas de plataforma.
A previsão era que elas começassem a funcionar em junho de 2010, mas, segundo o Metrô, a Trends teve problemas financeiros e paralisou o serviço no início de 2011.
A instalação foi retomada, mas, agora, há outro problema: como são seis modelos de trens circulando na linha, as portas das composições mais antigas não se encaixam nas molduras.
Funcionários ouvidos pela Folha afirmam, por exemplo, haver risco de um cego bater no vidro ao sair do trem.
O Metrô diz que todos os equipamentos já foram instalados e que agora realiza testes e ajustes para cada modelo. "Após o início da operação do dispositivo na Vila Matilde, até o final deste ano, o sistema será avaliado antes de ser expandido para as demais estações."
O bancário Alexandre Nacif, 40, mora na Vila Matilde e pega o metrô todos os dias. "Nunca vi funcionar. Seria uma boa para evitar que as pessoas caiam na linha", diz.
Ele conta já ter chegado atrasado no trabalho, na avenida Paulista, por conta da lentidão causada por "usuário na via".
OUTRO LADO
O Metrô diz que a licitação inicialmente previa as portas em três linhas, mas não teve propostas e por isso foi reformulada. "Foi identificada a necessidade de se publicar uma retificação do edital, adequando a contratação às condições encontradas no mercado e priorizando somente a linha 3-vermelha", afirma.
Além de reduzir a exigência de 24 para 12 portas, o novo edital incluiu serviços de adaptação das plataformas e a previsão de que 80% dos trabalhos fossem realizados à noite.
A companhia diz estar prestando todos os esclarecimentos solicitados e que pagou ao consórcio vencedor "apenas pelo que de fato foi executado". Foram R$ 11,8 milhões pelos serviços em Vila Matilde.
Segundo o Metrô, devido ao atraso no cronograma foi aplicada "a multa máxima prevista em contrato, de aproximadamente R$ 7 milhões".
Após a paralisação do serviço, o Metrô diz ter negociado diretamente com a Poscon, que retomou os serviços em junho de 2012.
Em seu pedido de recuperação judicial, a Trends afirma que entre os motivos que a levaram a quebrar estão as dívidas contraídas para a instalação das portas.
A empresa diz que teve que arcar com todos os custos de importação e instalação e que precisou fazer empréstimos, pois a diferença entre seus pagamentos à parceira coreana e os repasses do Metrô chegava a 11 meses.
"Boa parte da eventual margem de lucro do contrato foi corroída pelos serviços da dívida junto aos bancos", afirma.
Outra dificuldade foi a instalação das portas apenas de madrugada, exigência que deixava o período de trabalho reduzido a duas horas diárias.
Escárnio, covardia e miséria de muitos
Milton Hatoum - O Estado de S.Paulo
O sujeito saiu da prisão e fez um discurso emocionado na Casa onde homens e mulheres representam o povo. Dizem que em plena sessão parlamentar o condenado se ajoelhou, fez suas preces e gritou "aleluia", as mãos para o céu.
Estranha litania de um desavergonhado! Ainda assim, a infinita bondade divina pode acolher a oração dos crentes, indistintamente. Mas, em casos extremos de opróbio e cinismo, até uma divindade se envergonha de alguns fiéis, incluindo os do alto e os do baixíssimo clero.
O choro e a oração do deputado fazem parte dos rituais de dissimulação e hipocrisia encenados por políticos e empresários corruptos. Essa encenação barata significa uma total indiferença à lei e à coisa pública. As lágrimas, preces e gestos calculados são rituais de outro culto, nada religioso: o velho personalismo de uma certa elite política. O escárnio da cena é aviltante. Não menos aviltante é o voto secreto, que permite a cumplicidade de réus inconfessos ou de gente que teme a punição de futuros atos criminosos.
Ainda é atual e necessária a leitura de Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda:
"No Brasil, pode-se dizer que só excepcionalmente tivemos um sistema administrativo e um corpo de funcionários puramente dedicados a interesses objetivos e fundados nesses interesses. Ao contrário, é possível acompanhar, ao longo de nossa história, o predomínio constante das vontades particulares que encontram seu ambiente próprio em círculos fechados e pouco acessíveis a uma ordenação impessoal".
De fato, nossas constituições são feitas para não serem cumpridas, as leis existentes para serem violadas. As vontades particulares, cochichadas em círculos fechados, são um acinte a uma verdadeira democracia. Outro político - um senador de Rondônia também condenado pela Justiça - é dono de uma estação de rádio. Dezenas de deputados e senadores são proprietários de jornais, estações de rádio e tevê. Essa é mais uma aberração do nosso sistema político.
Na década passada, um promotor público disse que o dinheiro roubado por políticos em conluio com empresários mata crianças e usurpa o futuro de jovens brasileiros. E é verdade. Com os mais de 8 milhões de reais roubados dos cofres de um Estado do Norte, as famílias pobres são as mais prejudicadas. A violência e a miséria na zona rural de Rondônia são tão alarmantes quanto a destruição da floresta. Isso acontece também no Pará e em Mato Grosso, sem falar na vergonhosa ausência de infraestrutura urbana em bairros pobres de Manaus, Macapá, Cuiabá e de outras capitais da Amazônia.
Numa entrevista ao Estadão (1.º/9/2013), o presidente da Câmara afirmou que seus pares sentiram "dó" de Donadon. Por isso, e também por corporativismo, o político criminoso não foi cassado. Desconfio que a imensa maioria do povo brasileiro não sente dó desse deputado.
Segundo Bolívar Lamounier, há décadas - pelo menos desde os anos 1950 - o povo brasileiro é saqueado por um novo tipo de clientelismo: as relações promíscuas dos três poderes com construtoras, agências de publicidade, empresas de transporte urbano e de coleta de lixo.
A farra é geral e não se limita a esse ou aquele partido. Quase todo o sistema político se alimenta da promiscuidade entre o público e o privado. Como desatar esse nó? Como instaurar transparência e lisura nas licitações de obras e serviços dos governos federal, estadual e municipal? Como, enfim, transformar em democracia a caricatura de uma democracia?
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