quarta-feira, 27 de junho de 2012

Realismo na Petrobrás


Celso Ming - O Estado de S.Paulo
Como a oposição - se é que ela existe - não vem sendo capaz de produzir um mínimo de crítica à política econômica do governo do PT, foi preciso que a própria diretoria da Petrobrás tomasse a iniciativa de apresentar a mais contundente denúncia das derrapadas administrativas registradas nos oito últimos anos da Petrobrás.
Foi o que fez segunda-feira a atual presidente, Graça Foster. Ela admitiu que a diretoria anterior, presidida pelo baiano José Sérgio Gabrielli, foi marcada pela falta de realismo na definição de metas de produção e pela leniência com que acompanhou os cronogramas dos investimentos. Além disso, apontou falta de cumprimento da sistemática de aprovação de projetos importantes e sugeriu a ocorrência de indisciplina na empresa, sabe-se lá em que proporção.
As obras da Refinaria Abreu e Lima, no Estado de Pernambuco, estão com atraso de três anos. Foram orçadas em US$ 2,3 bilhões em 2005 e não sairão por menos de US$ 20,1 bilhões, quase dez vezes mais. "É uma história a ser aprendida, escrita, lida pela companhia, de tal forma que não seja repetida", disparou Graça Foster. Ela não foi complacente com graves falhas de gestão do projeto do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Coperj), também atrasado e sem nova data para entrar em operação.
Em boa parte, esse desleixo administrativo é consequência da opção determinada ao longo do governo Lula que encarou a Petrobrás como território de aparelhamento partidário e loteou sua diretoria entre os próceres de sua base política. Nessas condições, é impossível evitar desvios de patrimônio público.
O governo Dilma pretende dar racionalidade administrativa ao setor do petróleo. Mas o faz pela metade e não desiste das ingerências. Como esta Coluna avançou na edição de ontem, este governo está sendo incapaz de definir uma política coerente para a Petrobrás e para os preços dos combustíveis. Até agora não se sabe se o objetivo é dar continuidade às práticas populistas de combater a inflação por meio da manipulação do caixa da Petrobrás; se é ajudar a política industrial por meio de imposições de quocientes de conteúdo local na encomenda de equipamentos; ou se é observar um mínimo de capacidade de investimento da empresa de modo a puxar o crescimento econômico e a criação de empregos.
Graça Foster insiste agora em que é preciso uma "administração realista", algo que nunca deveria ter sido deixado para trás. No entanto, não dá para acreditar que prevaleça uma "administração realista" enquanto não for restabelecido o realismo dos preços. A Petrobrás continua vendendo de 6% a 10% da gasolina consumida no mercado interno a preços mais baixos do que ela paga no mercado internacional. E a administração da empresa não consegue do governo Dilma a observância de critérios de paridade aos preços internacionais.
Convém observar que o critério de preços tem de valer tanto na alta como na baixa. E, se for verdade que as cotações internacionais de petróleo podem despencar de volta para o nível dos US$ 60 por barril, um grande número de investimentos da Petrobrás poderá ficar inviável. Isso significa que não basta uma administração realista de preços; tem de ser também uma administração austera.
Não é à toa que a Petrobrás vale hoje no mercado apenas 70% do valor patrimonial registrado em seus livros.

Como acabaram as filas do INSS



Coluna Econômica - 27/06/2012, por Luis Nassif
No Seminário “Modelos de Gestão”, do projeto Brasilianas, o ex-Ministro da Previdência Nelson Machado contou em detalhes uma das mais bem sucedidas experiências em gestão pública no país: o fim das filas do INSS.
Antes da Previdência, teve papel essencial no governo eletrônico implantado por Yoshiaki Nakano, no primeiro governo Mário Covas, em São Paulo.
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Em ambos os casos, Nelson Machado detectou as duas pré-condições para mudanças de gestão bem sucedidas, o que ele denomina de “alinhamento dos astros:
1. Decisão política: vontade de fazer, o que depende do governante, governador ou presidente.
2. Competência técnica, capacidade de responder aos desafios.
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Lula lhe conferiu duas missões objetivas: combater as fraudes e acabar com as filas do órgão. Machado colocou uma condição apenas: profissionalizar a gestão.
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O INSS possui 1.200 agências, é comparável a um grande banco. O trabalho de Machado desenvolveu-se em várias frentes: gestão de pessoas; configuração organizacional; gestão de processos; e ferramentas tecnológicas.
Antes de começar o trabalho, passou 15 dias no Ministério do Planejamento reunindo-se com funcionários do Ministério de todo o país e propondo a questão central: como resolver o problema das filas?
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O passo seguinte foi a comunicação com as pessoas, o que foi feito através do empréstimo da TV Banco do Brasil – que tem abrangência nacional. Periodicamente havia discussões da cúpula do Ministério com as gerências regionais.
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Nessas conversas identificou-se o problema sério de fragmentação no comando. Como havia muitas indicações políticas para gerentes, eles prestavam mais satisfação a seus padrinhos do que ao Ministério.
Montou-se, então, um concurso nacional para seleção de gerentes. Quase 5 mil funcionários participaram. Desses, foram selecionados mil e pouco.
Havendo vaga, procedia-se a uma seleção objetiva, através de procedimentos claros e transparentes. Os cinco primeiros eram chamados a Brasília onde passavam por uma bateria de testes da Empresa Junior da PUC. Ao final, o Ministério fazia uma discussão com psicólogos que lhe permitia bate o martelo com o escolhido.
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O gerente selecionado era alocado em local distante de sua cidade original, para diluir vícios. Em seguida, criou-se uma gratificação para os chefes de agência, uma remuneração variável por desempenho.
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O passo seguinte foi reorganizar o horário de atendimento e instalar sistemas de webcams em todas as agências do país, permitindo o monitoramento em tempo real. Finalmente, permitiu-se o agendamento de reuniões por telefone ou internet.
Sempre que a agência era aberta, o chefe procedia a uma contagem do número de pessoas na fila. No início da experiência, a média era de 80 pessoas na fila, antes da abertura da agência e um tempo médio de atendimento de 01hs47.
Em pouco tempo o número caiu para 20 na fila e o tempo médio reduziu para 40 minutos.
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Hoje em dia, a espera tem 4, 5 pessoas, muito mais pelo gosto de serem atendidas na frente do que por necessidade.
A reforma da Previdência - 2
Coluna Econômica - 28/06/2012
Responsável pelo fim das linhas do INSS, o ex-Ministro da Previdência Nelson Machado ironiza os modelos de gestão, pacotes fechados oferecidos a empresas públicas ou privadas e à administração pública.
O modelo é interessante de se conhecer, diz ele. Mas deve ser encarado como uma caixa de ferramentas que se abre e se usa o necessário. Para cada situação, um conjunto de ferramentas.
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Na coluna de ontem mostrei os passos iniciaisda reforma da Previdência.
Houve uma reunião inicial com gerentes de todo o país para buscar soluções para as filas.
Constatou-se que o primeiro passo seria organizar previamente os horários de atendimento. Haveria uma seletividade, em função da necessidade do seguro. E - principalmente - a resolutilidade. Isto é, a solução para o caso deveria ser dada no primeiro atendimento.
O padrão da administração pública é receber o pedido, carimbar, colocar na pasta e passar para frente. A solução imediata do problema exigiu muito treinamento e capacitação.
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No passado recente, foram feitas várias tentativas de modernização, como a consolidação dos bancos de dados de Pis-Pasep e outras formas de registro profissional dos segurados. Mas a legislação impedia o seu uso como prova de tempo de trabalho.
Na gestão Pimental - anterior a Machado - a lei foi alterada permitindo eliminar o chamado saquinho de papel (a montanha de comprovantes de vínculos trabalhistas que acompanhava cada processo). Com o computador ligado, o atendente tinha condição de aprovar o pedido de aposentadoria na hora, consultando o histórico do beneficiário.
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Reordenou-se a lógica das consultas. No caso de aposentadoria por acidente de trabalho, por exemplo, o segurado previsava ir à agência marcar a perícia. Uma segunda ida, para fazer a perícia. Uma terceira ida para ter alta.
O agendamento passou a ser feito por canais de atendimento à distância. Montou-se uma estrutura de agendamento por telefone (37%), Internet (25%) e agência (6%).
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Para cada caso - quebra de perna, braço etc. - o médico já dava um prazo padrão para restabelecimento do segurado. Ao final do prazo, a alta era automática. Só voltava ao perito o segurado que precisasse de mais tempo de recuperação.
Em 2005 houve 900 mil perícias médicas, 500 mil por terceirizados. Em setembro começaram a entrar os concursados. A média das perícias caiu para 500 mil.
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Outro ponto de desafio foi o combate ao desperdício e à fraude. Havia a mística de que 50% dos benefícios da Previdência eram fraudados - beneficiários fantasmas, falecidos etc. Houve algumas tentativas de censo, mas que esbarraram em problemas de planejamento.
Para preparar o novo censo, montou-se um plano inicial e Machado conversou antecipadamente com presidentes do STF, do Senado e Câmara, do TCU, com o Procurador Geral da República e com as principais redações de jornais.
Deixou claro que bastaria uma matéria sensacionalista com alguma idosa com dificuldades de se recadastrar para derrubar o trabalho.
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Conseguiu-se adesão geral. Ao final do recadastramento, as fraudes não chegavam a 2,5% - mas um valor considerável, de R$ 1,5 bilhão, levando-se em conta o tamanho do orçamento do órgão.
Hoje em dia o recadastramento é automático, através das próprias agências bancárias.

terça-feira, 26 de junho de 2012

Mais ecológico e autossuficiente, etanol brasileiro carece de incentivos federais


Para especialistas e empresários, ausência de políticas públicas inviabiliza setor sucroalcooleiro.
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Foto: Divulgação/PetrobrasMais ecológico e autossuficiente, etanol brasileiro carece de incentivos federais
Produto genuinamente brasileiro, o etanol já foi modelo internacional, mas hoje amarga uma dura crise. A ausência de políticas públicas que lhe garantam competitividade, somada ao baixo investimento na produção e alterações climáticas colocam o biocombustível da cana-de-açúcar em uma situação de risco. O Brasil, que pretendia ser um grande exportador do combustível ecológico, se viu obrigado a importar a versão americana – mais poluente – no último ano: mais de um milhão de metros cúbicos ingressaram no país, em 2011.

Apesar de ser mais ecológico do que o equivalente fóssil e, considerada, a alternativa mais barata e eficiente de biocombustível disponível no mundo, o consumo interno do etanol está em queda. Segundo dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP), foram comercializados 10,7 milhões de m³ em 2011, bem abaixo do patamar de 15,1 milhões do ano anterior, o que corresponde a um recuo de quase 30%. O cenário fica ainda pior se for considerada a frota de carros flex vendidos no mesmo período, de cerca de três milhões, contra pouco mais de 300 mil unidades movidas à gasolina.
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A resposta para a rejeição do consumidor é simples e tem origem econômica: a disparada nos preços deixa a versão da cana pouco atraente ao bolso do motorista. Em função do rendimento de um litro de etanol corresponder a 70% do litro de gasolina, ele só é rentável ao consumidor se tiver a mesma relação custo-benefício. Ao contrário dos combustíveis fósseis, regulados pelo Governo Federal, o Etanol não recebe nenhum tipo de incentivo fiscal. Para o professor do Departamento de Produção Vegetal da USP, responsável pela área de planejamento e produção de cana-de-açúcar, Edgar Beauclair, essa diferenciação entre os dois produtos demonstra desinteresse político.

“Falta uma política pública clara, transparente em relação ao que se deseja de matriz energética no país. Não sabemos as metas para cinco, dez anos. Não sabemos se existem metas. Isso acarreta uma dificuldade óbvia para atrair investimentos. Fica difícil investir em uma atividade que você não tem garantias de comercialização porque vai competir com outro produto subsidiado. Um produto [gasolina] em que o governo tem interesse em controlar”, declara Beauclair em entrevista à Agência CNT de Notícias

Baixo investimento
As 406 usinas produtoras de etanol ainda sentem os reflexos da crise internacional de 2008, que reduziu o crédito e elevou os custos da produção, fazendo com que o negócio deixasse de ser rentável. Naquela época, em função da alta do barril de Petróleo, o setor sucroalcooleiro foi demandado e a produção de Etanol chegou a marca de 27 milhões de m³, maior volume desde 2000 – segundo dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e do Abastecimento (Mapa). No entanto, a política de preços do combustível instituída para o controle inflacionário tem causado perdas a Petrobras e criou um teto para o Etanol considerado inviável pelos empresários.

De acordo com o presidente da União dos Produtores de Bioenergia (Udop), Celso Torquato Junqueira Franco, o principal entrave hoje é justamente fazer do Etanol uma commodity rentável. Uma primeira medida para salvar o setor, segundo ele, seria a desoneração tributária. “Se há um interesse em manter a política de preços para a gasolina, precisamos chegar ao nível zero de tributação do Etanol. Mas se isso se mantiver por muitos anos, daqui a pouco nem a desoneração vai ser suficiente. Os custos continuam aumentando. Precisamos de uma política de longo prazo”, explica.

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Nesse sentido, como tentativa de amenizar as perdas e incentivar a renovação dos canaviais, o Governo Federal elaborou oPlano Estratégico do Setor Sucroalcooleiro, lançado em fevereiro. A meta do projeto é expandir a oferta de cana-de-açúcar destinada à produção do biocombustível para os próximos quatro anos. O plano apoia-se em três medidas: renovação das plantações – que hoje têm idade média acima do ideal, com canas acima do 6º corte –, atendimento à capacidade instalada das usinas (que têm ociosidade de cerca de 20%) e elevação da oferta de matéria-prima para as indústrias.

Sob o olhar dos produtores, entretanto, a medida é tardia e ineficiente. Segundo o presidente da Udop, para recuperar os canaviais seria necessário investir cerca de R$ 50 bilhões, em três anos. Em abril, o Governo Federal disponibilizou R$ 4 bilhões por meio do Programa BNDES de Apoio à Renovação e Implantação de Novos Canaviais (BNDES Prorenova), disponíveis em 2012. Segundo o Banco, até o dia 21 de junho, 25 operações foram aprovadas, com a utilização de pouco mais de R$ 450 milhões.  “Os recursos para a produção não chegam na base. Esse valor corresponde a apenas 1% do investimento necessário para retomar as condições dos canaviais. É muito pouco. Hoje temos cerca de 20% das empresas produtoras com dívidas que ultrapassam seu valor de mercado”, estima Junqueira Franco. 

A solução, para especialistas e empresários, seria a adoção de programa similar ao PróAlcool, criado pelo Governo Federal na década de 1970. “Precisamos de uma ação de longo prazo. Temos que olhar o setor sucroalcooleiro dentro da matriz energética. Se hoje temos, aparentemente, um problema de abastecimento de etanol, mais tarde teremos um problema no de gasolina, caso não seja resolvido o problema. É emergencial uma medida”, alerta o empresário.

Falta ainda um estímulo ao consumo do etanol, para o professor Edgar Beauclair, “Com a opinião pública sensibilizada a favor do consumo do biocombustível renovável, o governo vai se sentir pressionado. Precisamos de um movimento social a favor de um combustível com baixo impacto ambiental e que pode ser econômico, basta melhorar as condições de investimento”, finaliza.


Na próxima sexta-feira (29), a Agência CNT de Notícias publicará mais uma reportagem sobre o etanol, com os benefícios ambientais do biocombustível e iniciativas de transporte coletivo que já utilizam o derivado da cana-de-açúcar.

Jacy Diello
Agência CNT de Notícias