Jorge Pontes, ex-delegado da Polícia Federal e coautor do livro “Crime.gov.”, que acaba de sair, disse ao jornal O Globo uma frase que permite extrapolações: “Não há uma fraude no Brasil. Há um país dentro de uma fraude”.
A parte engoliu o todo, interpreto eu, e isso está à vista em qualquer lado para que se olhe. Atragédia da Muzema, por exemplo, em que dois prédios desabaram no dia 12 último matando 24 pessoas, não foi uma fatalidade provocada pela chuva e pelos deslizamentos. Foi normal. O que espanta é que tragédias semelhantes não aconteçam todo dia e em toda parte. Parafraseando Jorge Pontes, o Brasil de que a Muzema fazia parte parece estar agora se reduzindo a um quisto na grande Muzema.
É um país que cresce à margem das estradas, das vias expressas e das lagoas, sobe pelas encostas ou se espalha pelas periferias das cidades. Só o conhecemos pela janela do carro, quando passamos por ele em velocidade. É formado por predinhos de tijolo aparente, todos com puxadinhos de dois ou mais andares, construídos pelos próprios moradores —cada qual servindo de engenheiro, arquiteto, mestre de obras e pedreiro. Os tetos sustentam as paredes. O Brasil mora neles.
Mas engana-se quem pensar que ali é terra de ninguém, onde qualquer um pode chegar e erguer sua casinha. Cada centímetro já foi mapeado por alguém que chegou primeiro, fincou seu marco e criou sua versão de um mercado imobiliário, com entrada, prestações e parcelas intermediárias. Há valores diferentes em função da localização e de quantos andares.
A Muzema propriamente dita, a que caiu, é apenas uma sofisticação desse processo. Não são predinhos de tijolos, mas edifícios de seis andares, com 24 ou 40 apartamentos, construídos e explorados pelas milícias —as quais têm no bolso a polícia, as associações de moradores, os moradores, a simpatia do poder e, daí, o país.
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