Não é forçando regras antigas sobre novos negócios que resolveremos qualquer coisa
19/04/2019 | 05h00
Por Pedro Doria - O Estado de S. Paulo
Designer, Brian Chesky fundou o Airbnb em 2008
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O processo é bem mais discreto do que foi com o Uber. Mas começa a circular em Câmaras Municipais Brasil afora a ideia de regular serviços de aluguéis curtos tipo Airbnb. Há dois incentivos para a ofensiva. Um é dos hotéis, que como qualquer outra indústria tradicional se esforça para conter a concorrência que vem da disrupção digital. O outro é das prefeituras. Com caixa baixo, veem em cada hospedagem a possibilidade de fazer um dinheiro. O epicentro deste experimento é a mais importante cidade para o Airbnb no país: o Rio de Janeiro.
O Rio, aliás, não é importante só no Brasil. É uma das cidades mais populares do mundo na plataforma. Durante o Carnaval deste ano, chegou a terceira no ranking mundial em hospedagens simultâneas.
E é no Rio que tramita um projeto de lei que pretende transformar o negócio em hotelaria. Cada hóspede terá de preencher uma ficha, as casas particulares abertas na plataforma sofrerão inspeções e, claro, será preciso pagar ISS.
O projeto carioca não caiu do céu. Inspirou-se noutro, já tornado lei, da pequena Caldas Novas, em Goiás. Lá, uma região de águas termais, o argumento é de que seria concorrência desleal. O problema é que concorrência desleal tem definição legal: é preciso que a disputa por clientes seja dada de forma desonesta, quebrando a lei. O produto falsificado, por exemplo, ou a marca cujo nome lembre uma mais conhecida. Não é o caso.
O negócio da Airbnb criou problemas em várias capitais europeias. Tantos são os apartamentos reservados para a plataforma que o número de imóveis destinados a moradia diminuiu — e o aluguel aumentou. Em cima disso, os parlamentos decidiram regular, impondo limites.
Mas, no Brasil, este problema não existe. O valor do aluguel já está com viés de baixa, dada a recessão que o país enfrentou. Isto é mais verdade ainda no Rio, epicentro da crise moral e econômica, afetado pela corrupção tanto no negócio do petróleo quanto em seus próprios governos. E, mesmo no caso dos hotéis, não está claro que as plataformas de locação sejam de todo prejudiciais. Houve, sim, uma queda de 2015 para cá. Foi nacional, tem a ver com a crise. No Rio, foi mais grave. Mas o Rio também teve vários hotéis novos inaugurados, ampliando a oferta no entusiasmo dos Jogos Olímpicos onde não havia demanda. Segundo números do Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil, já há uma recuperação em curso e 2019 pode ser melhor do que 2014. Até em terras cariocas os números estão melhorando.
A questão fundamental, no entanto, é outra. Há um detalhe que difere o Brasil de outros países: a Lei do Inquilinato. Ela prevê regras para o aluguel por temporada, aquele que não passa de 90 dias. Se quem aluga não oferece limpeza diária do imóvel, café da manhã, ou outros serviços típicos de hotel, é difícil argumentar — do ponto de vista legal — que o negócio seja o mesmo. E a legislação já prevê como funciona a tributação no caso. O dono do imóvel alugado paga imposto de renda. Não ISS.
Há uma profunda transformação da economia no mundo. Existe, sim, impacto econômico causado pela entrada do digital. A indústria fonográfica foi afetada. A do cinema luta para concorrer com a Netflix. Todo o jornalismo está em busca de um novo modelo. Táxis ganharam Ubers. As lojas de departamento ganharam a Amazon. A indústria automobilística já está brigando com o Vale do Silício para saber quem sobreviverá no tempo dos veículos autônomos. E isto porque a impressão 3D não mexeu, ainda, com tudo quanto é fábrica que faz objetos.
Não é forçando as regras antigas sobre os novos negócios que resolveremos qualquer coisa. Até porque, quanto mais turistas recebe uma cidade, melhor para o todo da economia.
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