Como as técnicas de Big Data conseguem antecipar o futuro
O Estado de S.Paulo
31 Maio 2018 | 03h00
Engenheiros civis recém-formados ao redor do mundo aprendem rapidamente que, em um canteiro de obras, suas opiniões são menos relevantes que as recomendações e orientações do mestre-de-obras. Normalmente um profissional com muitos anos de experiência, o mestre-de-obras geralmente não possui o conhecimento formal adquirido em anos de estudos de matérias como cálculo estrutural e resistência dos materiais - mas possui experiência prática em dezenas de obras das quais participou ao longo do tempo. O conjunto de observações e aprendizados acumulados torna este profissional um especialista, mesmo sem necessariamente ser capaz de fornecer explicações sobre o “porquê” de determinada recomendação. As razões pelas quais algo deve ser feito do jeito “A” e não do jeito “B” estão ligadas à correlação entre estas diferentes abordagens que o mestre-de-obras internalizou e consolidou como conhecimento.
A tecnologia de Big Data tem como objetivo principal a extração de recomendações a partir de um vasto conjunto de amostras. Às vezes, todas as amostras disponíveis são levadas em consideração, ao invés de apenas um subconjunto delas - usualmente o procedimento utilizado por técnicas convencionais. Imagine, por exemplo, um engenheiro de trânsito que precisa analisar os padrões apresentados pelo tráfego de determinada região da cidade entre cinco da tarde e sete da noite. Utilizando técnicas tradicionais, serão usadas amostras dos trajetos utilizados por alguns veículos para auxiliar no planejamento das ações a serem tomadas. Já com o uso de Big Data, as rotas traçadas por todos os veículos podem ser levadas em consideração. É o que em estatística se descreve como “n=N”: o número de amostras (representado pelo “n” minúsculo) é igual ao número total de eventos (representado pelo “N” maiúsculo).
Uma das características mais importantes sobre essas técnicas de Big Data é que o mais importante não é entender o “porquê” de um fenômeno. As recomendações que são obtidas são por vezes contraintuitivas, mas funcionam empiricamente - pois os dados mostraram isso de forma inequívoca. Isso é consequência da complexidade crescente que os sistemas de informação possuem - algo que deve seguir aumentando ao longo do tempo. Os sensores presentes em nosso dia-a-dia, a coleta permanente de dados realizada por cidades inteligentes e o desenvolvimento de técnicas para captura de dados (como câmeras equipadas com sistemas de reconhecimento facial) fornecem aos algoritmos de Big Data a matéria-prima para gerar suas previsões - um campo conhecido como “análise preditiva”.
Prever o comportamento de um fenômeno específico é algo desejável para um grande número de negócios. Qual será o efeito de uma determinada ação de marketing? Em quanto tempo o motor de um dos caminhões da frota de entregas irá apresentar problemas? Quando uma das máquinas em uma linha de montagem vai parar de funcionar? Qual o risco que um paciente está correndo de sofrer alguma intercorrência médica grave no futuro próximo? Em seu livro de 2013, “Predictive Analytics: The Power to Predict Who Will Click, Buy, Lie, or Die” (ou “Análise Preditiva: o poder de prever quem vai clicar, comprar, mentir ou morrer”), o professor norte-americano Eric Siegel cita exemplos de como diversas empresas utilizam esta técnica. Um destes exemplos aborda a forma como o Facebook seleciona a ordem de apresentação das notícias para seus usuários, buscando maximizar a utilidade e o efeito na sua rede social. Outro exemplo menciona como já há empresas de seguro-saúde que conseguem estimar um óbito com mais de um ano de antecedência, e assim iniciar atividades de aconselhamento e apoio às famílias.
Mas é exatamente a segurança dessa quantidade gigantesca de dados - possivelmente o ativo mais valioso da Quarta Revolução Industrial - que tornou-se uma das questões centrais para indivíduos, famílias, comunidades, governos e negócios. Como proteger os dados, garantindo acesso adequado e respeitando questões como privacidade e neutralidade? Como a tecnologia pode atuar para resolver um problema criado por ela mesmo? A cibersegurança é nosso tema para semana que vem. Até lá.
*Fundador da GRIDS Capital, é Engenheiro de Computação e Mestre em Inteligência Artificial
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