domingo, 10 de junho de 2018

Crise na borracha leva a demissões e corte de árvores no interior de SP, FSP


Marcelo Toledo
BARRETOS
Os anos de crise no setor de borracha natural mudaram a paisagem na fazenda do produtor rural Marcelo Pereira, em Barretos. Onde antes havia funcionários espalhados por toda a propriedade atualmente há somente metade deles em ação.
A queda do preço do látex no mercado tem feito produtores de São Paulo, principal estado produtor, demitir funcionários e até eliminar árvores em produção.
Já são quatro anos de preços baixos, especialmente devido ao excesso de produção em países asiáticos que dominam o mercado mundial, como Indonésia, Tailândia e Malásia, segundo a Apabor (Associação Paulista de Produtores e Beneficiadores de Borracha).
“O cenário está péssimo, e a mão de obra tem migrado para a construção civil ou outras culturas. Estou operando com só 50% dos sangradores [trabalhadores que fazem a coleta nas árvores]”, disse Pereira, que tem 27 mil árvores.
Outros produtores já tomaram medidas mais radicais, como a extração de árvores para substituir a cultura. Uma propriedade em Pitangueiras eliminou 19 mil seringueiras. Outra, em Colômbia, próxima à divisa com Minas, extraiu 80 mil árvores. Cana e soja são algumas das culturas adotadas por quem tem deixado o setor.
Segundo ele, a produção da fazenda Park Seringais de Iracema, que em março do ano passado era vendida por R$ 3,20 o quilo, hoje é cotada a R$ 2,20. Para ele, o mínimo teria de ser R$ 4,20. Quando a família entrou na atividade, em 1980, o quilo era comercializado por US$ 2,50 (o equivalente hoje a R$ 9,50).
“Ela não ficou com preço mais baixo só aqui, mas no mundo inteiro. O que piora nossa situação é o custo de produção, maior porque os outros países produzem como subsistência; 90% da borracha do mundo é produzida em regime familiar”, disse Diogo Esperante, diretor-executivo da Apabor.
O preço baixo preocupa ainda mais porque a Malásia passa por um momento de entressafra e nem isso foi suficiente para os preços reagirem.
Apesar dos problemas, a previsão é que a safra brasileira atinja 190 mil toneladas de borracha, ante as 183 mil toneladas do ano passado, das quais 58% estão em São Paulo.
O Brasil, que está entre os dez maiores consumidores, produz só 40% do que consome —entre 400 mil e 420 mil toneladas por ano, num mercado que tem como principais compradores China e Índia.
A safra do látex começa em outubro e vai até julho/agosto, quando ocorre a queda das folhas. Após um mês de descanso, a produção é novamente retomada. O auge é o período de abril a julho, tradicionalmente mais frio e sem chuva.
Embora tenha havido erradicação de árvores no país, a safra vai crescer porque estão começando a produzir látex seringueiras plantadas no mais recente boom do setor, entre 2010 e 2012. As árvores demoram em média sete anos para iniciar a produção, têm vida útil de 30 a 35 anos e, por ano, produzem de 7 a 10 quilos de látex.
“O pessoal que está saindo impacta pouco, pois há muita área nova entrando. Mas, para um país que quer aumentar sua participação no consumo nacional, não poderíamos perder nada”, disse Esperante. Já o plantio de novas áreas caiu muito, o que se refletirá na produção na próxima década.
Também produtor rural, o engenheiro-agrônomo Paulo Fernando de Brito disse que o cenário poderia ser outro se houvesse barreiras tarifárias mais fortes para os importados.
“O Imposto de Importação chegou a ser de 14% em um ano, mas voltou a 4%. Com isso, a borracha do Sudeste Asiático entra no país num preço que atrapalha muito o mercado”, disse ele, que também chefia o EDA (Escritório de Defesa Agropecuária) de Barretos, órgão da Secretaria da Agricultura paulista.
Brito afirmou que consegue receber R$ 2,35 por quilo do látex extraído de suas 7.000 seringueiras plantadas em Pirajuba (MG), mais que o valor pago em São Paulo.
“Mas é muito baixo o valor, o que explica a saída de muitos produtores da atividade ou a venda de seus seringais.”
58%
da safra de látex do país vem do estado de São Paulo
190 mil
toneladas de borracha é a previsão para a safra brasileira
400 mil a 420 mil 
toneladas ao ano é o consumo do país
35 anos
é o tempo máximo de vida útil de uma seringueira
7 a 10 kg
de látex uma seringueira produz anualmente

PAÍS APOSTA EM RASTREIO DE PRODUÇÃO PARA GANHAR MERCADO

Para tentar reverter o cenário dos últimos anos, o setor prega um reposicionamento estratégico e a propagação das vantagens de consumir o látex produzido no Brasil.
“O custo é maior porque temos melhores níveis de responsabilidade social e de sustentabilidade ambiental. Devemos usar isso para valorizar e nos reposicionar. As maiores indústrias pneumáticas, os principais consumidores, têm fábrica aqui e podem aumentar no exterior seus escores de sustentabilidade usando mais borracha de procedência”, disse Esperante, da Apabor.
Segundo ele, os custos de produção do país incluem condições trabalhistas e ambientais que não existem nas mesmas proporções no Sudeste Asiático e a rastreabilidade.
“Garantimos que ela não está manchada pelo desmatamento ou exploração do trabalho”, disse. Esperante afirmou ainda que, enquanto o ganho médio dos empregados do setor varia de US$ 500 a US$ 600 no Brasil, no Sudeste Asiático os salários são de US$ 100.
Embora em baixa hoje, no último bimestre produtores foram beneficiados pelo câmbio, na avaliação do diretor. Os custos de produção são pouco sensíveis à moeda americana, diferentemente de outras culturas.

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