É imprudente animar-se demais com a Operação Shoyo Matopiba do Ibama, que aplicou multas de R$ 105,7 milhões a astros do agronegócio no cerrado. Uma parcela diminuta das autuações lavradas pela agência ambiental acaba de fato recolhida aos cofres da União.
Não faltam recursos administrativos para os infratores enrolarem no pagamento. Depois, há a possibilidade de recorrer à Justiça, que sempre tarda e quase sempre falha.
De todo modo, anima um pouco ver o Estado nacional se mexer para fazer cumprir a lei (nada a ver com a greve-locaute dos caminhoneiros). Quem planta, vende ou compra soja cultivada em áreas embargadas pelo Ibama por desmatamento ilegal comete uma infração e tem de pagar por isso.
Foram apreendidas na operação mais de 5 toneladas de soja (84 mil sacas). Em meio às 78 pessoas físicas e jurídicas flagradas no Maranhão, em Tocantins, no Piauí e na Bahia (MA-TO-PI-BA) estão gigantes da estatura de uma Bunge e uma Cargill, que no entanto alegam consultar bancos de dados oficiais sobre áreas embargadas antes de comprar os grãos.
Pode ser que estejam caindo, de boa fé, no engodo de alguns produtores. Pode ser.
Mas também pode ser que só estejam seguindo o exemplo de multinacionais como a John Deere, fabricante de máquinas agrícolas que no cenário internacional assume compromissos para reduzir emissões de carbono enquanto seus representantes locais pintam e bordam para agravar o aquecimento global.
O jogo duplo foi revelado nesta Folha por Patrícia Campos Mello e Avener Prado. Em reportagem sobre o cerrado para a série Crise do Clima, uma concessionária de tratores Deere, a Agrosul, patrocina palestras em que o meteorologista Luiz Carlos Molion diz que não existe aquecimento global.
Mas também pode ser que só estejam seguindo o exemplo de multinacionais como a John Deere, fabricante de máquinas agrícolas que no cenário internacional assume compromissos para reduzir emissões de carbono enquanto seus representantes locais pintam e bordam para agravar o aquecimento global.
O jogo duplo foi revelado nesta Folha por Patrícia Campos Mello e Avener Prado. Em reportagem sobre o cerrado para a série Crise do Clima, uma concessionária de tratores Deere, a Agrosul, patrocina palestras em que o meteorologista Luiz Carlos Molion diz que não existe aquecimento global.
Não é a única empresa que fatura com o agronegacionismo de resultados do palestrante. Contra tudo que a pesquisa científica vem mostrando com dados empíricos, Molion afirma que o CO2 não causa efeito estufa, que desmatamento não diminui chuvas e que o mundo vai na realidade se resfriar.
Além de grana, Molion recebe aplausos dos ruralistas, assim como Jair Bolsonaro. Não há fórmula mais fácil de agradar do que falar o que as pessoas querem ouvir.
E esse povo não quer outra coisa a não ser carta branca para seguir desmatando. Mais da metade do cerrado já virou cinzas, e o Matopiba é a mais recente fronteira de devastação dessa savana rica em biodiversidade.
Estudo do pesquisador Tiago Reis já indicou que 5,6 milhões de hectares da soja plantada no cerrado estão em áreas de risco produtivo alto ou médio, por causa do clima e do solo desfavoráveis. O levantamento foi noticiado em dezembro noutra reportagem de Patrícia Campos Mello.
Só se ouve falar na derrubada da floresta amazônica (80% de pé ainda). Mas a destruição do cerrado acontece aqui e agora.
Pior, ela contribui com 11% de todo o carbono emitido pelo Brasil em 2016, último dado disponível. Ou o dobro da poluição climática lançada na atmosfera pela atividade industrial, calcula levantamento do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (Seeg), um consórcio de ONGs.
Em resumo: desmata-se demais para produzir de forma insustentável e perturbar o clima do planeta. E ainda tem gente que acha que agro é pop, quando no Matopiba muito do que os ruralistas fazem é um crime.
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