Não sou de ficar chocado facilmente, mas devo admitir que as declarações do governador de São Paulo, Márcio França (PSB), sobre a Polícia Militar me deixaram estarrecido. “As pessoas têm que entender que a farda deles [PM] é sagrada, é a extensão da bandeira do estado de São Paulo. Se você ofender a farda, ofender a integralidade do policial, você está correndo risco de vida. É assim que tem que ser”, afirmou o governador.
Da última vez que li a Constituição, havia três dispositivos que asseguravam a liberdade de expressão (art. 5º IV, IX e art. 220) e nenhum instituindo a sacralidade da farda da PM. A implicação mais óbvia disso é que qualquer cidadão tem o direito de criticar a polícia, seus integrantes e suas vestimentas.
Ainda que se considere a farda uma extensão da bandeira paulista (o que não é) e ainda que se considere o pavilhão estadual um equivalente do nacional (o que não é), desrespeitá-lo seria no máximo uma contravenção que sujeita os infratores a multa (lei n° 5.700/71), jamais à pena capital, como parece defender o governador.
Não me entendam mal. Já escrevi aqui algumas vezes que polícia é civilização. Um dos maiores passos para a pacificação social foi dado quando o Estado tomou para si o monopólio do uso legítimo da violência. Mas daí não decorre que a polícia seja inatacável. Ao contrário, como qualquer outra instituição, ela deve ser questionada o tempo todo para aprimorar-se.
Entendo as inquietações de França. Ele quer ser eleito para o cargo que herdou de Alckmin, mas é um virtual desconhecido. A campanha este ano será curta, e seu partido tem pouco tempo de TV. Precisa, assim, aproveitar qualquer ocasião para aparecer, de preferência dizendo aquilo que o eleitor quer ouvir. Mas deveria se policiar para não incidir em cenas explícitas de populismo. Aliás, espero que seja mesmo populismo, pois a explicação alternativa é que ele acredita de fato nas coisas que disse.
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