Presença constante nas agendas e viagens do presidente Lula (PT), o jornalista Marcos Uchôa tornou-se uma das faces da comunicação do governo federal.
Essa imagem deve ser reforçada ainda mais daqui para frente, já que o ex-correspondente internacional da TV Globo tem lugar cativo de apresentador nas lives que passaram a ser realizadas por Lula.
Uchôa afirma que uma de suas atribuições é criar as condições para Lula emplacar a sua mensagem. Ou, em uma metáfora do esporte, levantar a bola para o presidente cortar.
"Acho que meu papel é o de um levantador no vôlei. Eu aponto os caminhos, brechas, mas quem faz o ponto é o Lula. Ele foi eleito presidente, ele tem que aparecer, não eu", afirmou Uchôa à Folha.
No Palácio do Planalto, há quem defenda a volta da figura de um porta-voz do presidente, como em gestões anteriores do petista. Nesse cenário, o nome de Uchôa é bem-visto entre palacianos.
Lula realizou na manhã desta segunda-feira (19) a sua segunda transmissão ao vivo nas redes sociais, em uma tentativa de impulsionar o seu desempenho na internet.
O governo afirma que buscou se afastar do modelo das populares lives do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que usava espaço semelhante para disseminar fake news e atacar adversários.
Lula promete um caráter mais institucional e informativo em suas lives, mas o mandatário já adotou direção contrária logo na segunda transmissão, aproveitando a ocasião para atacar Bolsonaro.
As transmissões do petista seguem o formato de uma entrevista informal, mesclando a divulgação de ações do governo com momentos pessoais do mandatário, como uma espécie de talk-show.
Essas entrevistas são conduzidas por Uchôa, profissional com décadas de experiência. Cobriu pela TV Globo Olimpíadas e Copas do Mundo, foi correspondente na Europa e acompanhou in loco conflitos como a Guerra do Iraque e a Guerra Civil da Líbia. Tornou-se assim um rosto conhecido da população brasileira.
No fim de 2021, pediu demissão da TV Globo após 34 anos de atuação. Chegou a se lançar no ano passado candidato a deputado federal pelo Rio de Janeiro pelo PSB, partido do vice-presidente Geraldo Alckmin. Acabou desistindo alguns meses antes da votação.
O jornalista foi contratado em março pela EBC (Empresa Brasil de Comunicação) para atuar como repórter e para tentar "contribuir com a qualidade da programação" da empresa. Afirma que tem como um dos modelos a britânica BBC, cujo trabalho conheceu quando atuou como correspondente em Londres.
"Sou repórter, mas tenho participado e palpitado na construção de uma EBC que quer tratar de temas mais próximos da sociedade. Ainda estamos nos primeiros passos e acho que só no ano que vem essa intenção vai ficar mais clara", afirma.
O jornalista da EBC diz que nunca teve relação anterior com pessoas do PT e que conheceu Lula em sua atividade de repórter. Faz questão de ressaltar que já votou no petista, da mesma forma como já votou em Leonel Brizola e em Fernando Henrique Cardoso.
"E deles o Lula é a figura política mais importante no mundo. É fascinante e um privilégio poder ver um pedaço da nossa história ser feito", acrescenta.
Uchôa esteve em praticamente todas as viagens internacionais do presidente, e sua importância ficou clara durante a ida de Lula para Hiroshima, no Japão, para a cúpula do G7.
O mandatário iria conceder uma entrevista coletiva, mas todos, inclusive Lula, precisaram esperar porque Uchôa ainda não estava presente. Ele foi contatado pelo assessor de imprensa do presidente, na frente dos demais jornalistas, chegando minutos depois.
Uchôa também tem sido escalado pelo Planalto para realizar a primeira pergunta em coletivas de imprensa dadas por Lula. Foi assim, por exemplo, durante a visita do ditador Nicolás Maduro e o pronunciamento do petista após a cúpula com os presidentes sul-americanos.
Na agenda de Lula e Maduro, Uchôa evitou temas espinhosos como o caráter autoritário do regime venezuelano.
"Uma expressão que foi usada recentemente bastante é que o Brasil voltou. E, aparentemente neste discurso e nessa ocasião, a Venezuela voltou", disse o jornalista, antes de perguntar sobre o simbolismo do encontro entre os dois na véspera da reunião com os demais líderes sul-americanos.
Foram nas duas lives transmitidas até o momento que sua imagem na comunicação do governo ficou mais em destaque.
Os planos de realizar transmissões ao vivo nas redes foram divulgados ainda em abril pelo ministro da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência), Paulo Pimenta. No entanto, o projeto foi adiado sucessivamente por problemas de agenda de Lula.
Interlocutores no Planalto dizem que a primeira edição do Conversa com o Presidente, na manhã de terça-feira (13), só foi confirmada na noite anterior.
Uchôa afirma que não houve roteiro e que nenhuma das perguntas havia sido combinada com Lula. A primeira live esteve focada em questões econômicas, com Lula anunciando o lançamento do PAC em julho e recapitulando medidas econômicas e sociais.
Houve tempo para falar da má fase do Corinthians e tratar de outros assuntos mais leves.
A audiência dos dois primeiros episódios se mostrou tímida quando comparada com a popularidade das lives de quinta, às 19h, feitas por Bolsonaro.
Assessores palacianos minimizam o resultado, dizem que Lula sempre foi mais conhecido pelo trato pessoal e que há espaço para crescer.
"Vamos reconhecer o óbvio: [não é a melhor situação] um programa que foi decidido ser gravado na véspera, às 21h30, não teve a divulgação devida. E o horário dele [8h30] está longe de ser o ideal em termos de audiência. Mas o Lula prefere gravar de manhã para não prejudicar a agenda de trabalho dele. E sei lá, à noite ele pode estar cansado, querendo ficar com a Janja, normal", afirma Uchôa.
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