Lá se vão mais de 20 anos desde que o pesquisador norte-americano Marc Prensky cunhou a expressão "nativos digitais" para se referir à geração de crianças nascidas após a gigantesca revolução proporcionada pela internet. "Nossos estudantes mudaram radicalmente. Os alunos de hoje não são mais as pessoas para as quais nosso sistema educacional foi desenhado", escreveu no famoso artigo "Digital Natives, Digital Immigrants", de 2001.
Para ele, a interação com as novas tecnologias digitais levavam, já naquele momento, crianças e jovens a processarem as informações de maneira fundamentalmente diferente de seus antecessores. "Jogos em computadores, e-mail, internet, celulares e mensagens instantâneas são parte integral de suas vidas", constatou Prensky, citando um conjunto de novidades que, de lá para cá, só vem se ampliando.
Essas crianças cresceram e, como jovens adultos, desenvolveram também novos hábitos frente ao jornalismo —adicionando novos itens à lista de desafios enfrentados pela imprensa. As gerações mais novas, que cresceram com as redes sociais, "costumam dar mais atenção a influenciadores ou celebridades do que a jornalistas, mesmo quando se trata de notícias", mostra a edição 2023 do Digital News Report, um amplo levantamento realizado anualmente pelo Reuters Institute e pela Universidade de Oxford.
"Talvez a descoberta mais impressionante do relatório deste ano esteja relacionada à natureza mutável das mídias sociais, em parte caracterizada pelo declínio do engajamento em redes tradicionais como Facebook e a ascensão do TikTok e outras redes baseadas em vídeos", destaca a pesquisa. "Apesar dessa crescente fragmentação de canais, e apesar das evidências de que a inquietação pública com a desinformação e com a atuação dos algoritmos está em níveis quase recordes, a dependência desses intermediários continua a crescer."
Apenas 22% da população ouvida declarou preferência por buscar notícias em sites ou aplicativos jornalísticos, o que representa uma queda de 10 pontos percentuais desde 2018. Grupos mais jovens, em especial, preferem acessar informações por meio de intermediários como plataformas de redes sociais, sites de busca e agregadores.
Esse afastamento dos veículos profissionais de imprensa não chega a ser novidade, mas é sempre preocupante. Outro dado importante do relatório mostra uma redução de dois pontos percentuais da confiança no jornalismo —o que em muitos países anulou os ganhos nesse indicador registrados no rastro da pandemia de Covid-19. Em média, quatro em cada dez pessoas entrevistadas afirmam confiar nas notícias na maior parte do tempo.
A Finlândia continua sendo o país com o índice de confiança mais elevado (69%). Não à toa, é também destaque mundial quando falamos em educação midiática. Quando a educação para a informação é entendida como prioritária e praticada nas escolas desde os primeiros anos, o resultado é um melhor entendimento de que jornalistas, embora também estejam sujeitos a erros, precisam seguir uma série de cuidados antes de publicar algo.
O método jornalístico prevê um trabalho cuidadoso de investigação, busca de evidências e checagem; além disso, a autoria de um texto, áudio ou vídeo produzido pela imprensa profissional é identificável e, no caso de abusos, passível de processos na Justiça. Muito diferente é a situação de posts ou mensagens que muitas vezes são compartilhadas em redes sociais ou aplicativos sem identificação de fontes ou sem transparência sobre o processo de obtenção das informações ali apresentadas como fato.
Essas são reflexões que cabem muito bem na sala de aula. A própria Base Nacional Comum Curricular (BNCC) prevê, ao longo da educação básica, o desenvolvimento de uma série de habilidades que permitirão o conhecimento e a valorização do jornalismo como um dos pilares da democracia.
Daniela Machado é coordenadora do EducaMídia, programa de educação midiática do Instituto Palavra Aberta
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