segunda-feira, 26 de junho de 2023

EDWIN HEATHCOTE - O humilde toldo está pronto para sua missão sob o sol, FSP

 

Edwin Heathcote

Crítico de design e arquitetura do Financial Times

Olhe para quase qualquer foto antiga de uma rua comercial urbana, desde o final do século 19 até por volta da década de 1950, e você verá uma fileira de toldos flutuando sobre as fachadas das lojas.

Para os nossos olhos, é um pouco surpreendente. As lonas abrangem o espaço acima dos compradores, criando uma espécie de arcada macia, metade para dentro, metade para fora; um generoso gesto de proteção (numa época em que muitas lojas tinham fachadas abertas), sobrepondo-se à rua, mas também criando mais uma superfície para introduzir publicidade, informação e cor.

À medida que entramos no verão, e as ruas nuas de Londres assam sob o sol, você não pode deixar de sentir que a cidade está desolada.

Visão do hotel de luxo Plaza Athénée
Fachada do hotel Plaza Athénée, em Paris - Instagram/plaza_athenee

Na Itália, os toldos fazem parte da cena arquitetônica chique há mais ou menos um século, com os blocos de apartamentos elegantes, mas principalmente monocromáticos, de Milão e Roma pontuados pelos respingos luminosos e ensolarados de toldos de tecido, que se estendem para varandas, terraços e jardins na cobertura, fazendo que toda a fachada de pedra seja suavizada. E ganhe cores ousadas, além de sombrear os interiores de pé-direito alto.

A fachada com toldo mais famosa de todas talvez seja a do Fairmont Palace em Montreux, na Suíça, uma beleza da Belle Époque ao estilo Wes Anderson, generosamente polvilhada com dosséis amarelo-canário para um efeito tremendamente ensolarado.

No entanto, se eles estão associados às ruas do século 19, também estiveram lá durante o modernismo. Veja fotos da arquitetura modernista do início e da metade do século. Aqueles cubos brancos das "villas" e os blocos de tijolos surpreendentemente sem adornos em geral apresentam toldos para proteger do sol as grandes janelas panorâmicas. Às vezes pode ser um pouco chocante ver as casas modernistas mais familiares, que tendemos a pensar em rigoroso preto e branco, em fotos coloridas, cobertas com toldos berrantes e lonas listradas.

No entanto, talvez porque os toldos lembrem um pouco mais açougues de rua do que o glamour do alto modernismo, eles parecem ter sido insidiosamente filtrados das histórias da arquitetura moderna –apesar de, à sua maneira, serem a coisa mais moderna que se possa imaginar: leves, mecânicos, flexíveis, responsivos, adaptáveis.

Por exemplo, a casa que às vezes é considerada a primeira casa modernista do Reino Unido, a New Ways, em Northampton (construída em 1926 e projetada pelo arquiteto alemão Peter Behrens), costumava ter exatamente um toldo listrado bem no meio. A Villa Mairea de Alvar Aalto na Finlândia (1939) apresentava toldos em seu terraço, bem como uma miríade de outros dispositivos de sombreamento. A maravilhosa Casa E-1027 de Eileen Gray na França (1926-29) apresenta um arranjo de toldos náuticos alegres (e surpreendentemente de um azuis brilhante), dando um toque de cor ao branco duro.

A boa notícia é que, lenta mas firmemente, eles estão sendo relançados. Arquitetos contemporâneos redescobriram os toldos. De Melbourne a Munique, de Rotterdam ao Brooklyn, as coberturas em cores vivas estão voltando como uma resposta ao aumento das temperaturas. Alguns arquitetos os estão projetando nas fachadas, mas também há beleza nas longas lajes modernistas quebradas por acréscimos casuais dos moradores, salpicos de cores aleatórias em fachadas insossas.

Os toldos não são apenas decoração. Persianas e cortinas são válidas, mas os toldos mantêm o calor fora antes que ele entre no prédio: são de baixa tecnologia, mas de alta eficiência. Também criam uma convidativa zona de verão entre o interior e o exterior, uma fluidez de espaço e limites que é notavelmente modernista em sua intenção. Talvez também já tenha havido um reconhecimento de que eles até acrescentam um pouco de glamour sofisticado. Uma série de hotéis e restaurantes, da Charlotte Street ao Dorchester e à Soho House em Brighton –todos apresentam toldos que permitem que a fachada fortemente protegida salpique um pouco de cor juntamente com um realce da marca. (Todos esses, aliás, feitos pela Dean's Blinds, cuja antiga fábrica em Putney ficava na esquina de onde eu cresci e cujas ruínas costumava invadir.)

Os toldos fazem parte de uma extensa família de proteção solar que tem se destacado nos últimos anos: elegantes persianas que deslizam horizontalmente, persianas elétricas que descem diante da fachada como lentas guilhotinas, persianas externas intrincadamente perfuradas, inspiradas nas treliças árabes "mashrabiya" (hoje recortadas a laser, em vez de à mão) e todos os tipos de persianas que permitem que seus habitantes as abram teatralmente pela manhã no estilo de um comercial de café e simbolicamente as fechem assim que o sol comece a brilhar.

Existem também as persianas de Barcelona, relacionadas e bastante bonitas, rolos de ripas de madeira que podem ser colocados sobre uma grade de varanda para que fiquem soltos e deixem um pouco de ar entrar, um pouco mais descontraídos que os rolos rígidos mais comuns da Europa central, por exemplo. Eles também conferem às ripas de madeira a sensação fluida do tecido.

Mas a verdadeira beleza dos toldos é que eles são principalmente adaptáveis. Grande parte do kit necessário para lidar com a crise climática, de bombas de calor de fonte subterrânea até paredes superisoladas, é caro, precisa ser construído do zero ou é praticamente impossível de acrescentar a estruturas históricas onde há correntes de ar. Os toldos simplesmente se encaixam. Eles são o lenço de cabeça das estrelas dos anos 1950 ou o elegante quadrado no bolso dos dândis da arquitetura. E a sombra fresca e colorida que eles oferecem está se tornando cada vez mais indispensável nas cidades que superaquecem rapidamente.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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