O Celso Rocha de Barros talvez não concorde, mas acho que dá para afirmar que Bolsonaro foi finalmente moderado. Não o foi pelo cargo, nem pelos militares, nem pela Covid-19, mas pelo duplo temor de sofrer um processo de impeachment e de ver familiares na cadeia por "rachadinhas" e sabe-se lá mais o quê.
Não penso que o presidente tenha se convertido à institucionalidade nem deixado de acalentar a esperança de um autogolpe, mas, independentemente do que se passe no recôndito de sua mente, o fato é que o Bolsonaro de hoje tem pouco a ver com o que assumiu a Presidência em janeiro de 2019 ou com o que, poucos meses atrás, fazia ameaças não tão veladas ao STF. Ele mordeu a língua e sentou gostosamente no colo do centrão.
A questão que se coloca é se ele poderia ter adotado essa atitude desde o início, poupando o país de parte dos dissabores vividos no último ano e meio. Receio que não. O governo Bolsonaro é essencialmente reativo. Para mudar seu comportamento, foi preciso que o presidente sentisse o cheiro de encrencas grossas e visse que sua popularidade não depende só da base de extrema direita --a ajuda emergencial que a administração inicialmente não queria acabou sendo um presente dos céus.
Seja como for, é positivo que o governo esteja se entendendo com o Congresso em vez de demonizá-lo. A política, afinal, é um jogo de negociações e compromissos. Mas, ao contrário do que Bolsonaro e outras altas autoridades parecem desejar, é inadmissível que a Justiça entre em qualquer tipo de acordo, entendimento ou "détente".
O Judiciário só age quando provocado e, uma vez provocado, não pode deixar de agir. Será a desmoralização completa do sistema de Justiça se as apurações sobre Flávio Bolsonaro, que já reuniram uma enormidade de indícios de irregularidades, não virarem um processo e se os investigadores esquecerem os cheques de Queiroz para a primeira-dama.