Embora São Paulo não exiba um grande patrimônio arquitetônico colonial, a cidade possui, em compensação, um acervo documental de grande valor, capaz de fazer inveja a outras capitais brasileiras. O Arquivo Histórico Municipal, que ocupa o edifício Ramos de Azevedo, inaugurado em 1920, no Bom Retiro, conta com documentos raros, alguns dos mais antigos da América Latina, que remontam às origens da localidade e aos seus primeiros debates políticos. O historiador Afonso d'Escragnolle Taunay chegou a declarar que nenhuma das cidades brasileiras quinhentistas poderia "ufanar-se da posse de um arquivo como o de São Paulo".
Entre as preciosidades nele depositadas estão as Atas da Câmara de Santo André da Borda do Campo, de 1555 até 1558, e as da Câmara da Vila de São Paulo de Piratininga, desde 1562. Apesar de algumas atas se terem perdido, o material serviu de fonte primária de pesquisa para inúmeros historiadores da cidade, incluindo o próprio Taunay. Segundo a socióloga Azilde Andreotti, esses documentos retratam a estrutura e o funcionamento da administração local no século 16, informam sobre a organização dessas vilas na esfera pública e expõem os fundamentos da nossa formação colonial.
Tratam-se de manuscritos em papel de trapo que foram transcritos e publicados em volumes a partir de 1914 com o apoio do então prefeito Washington Luís. As atas mostram, por exemplo, o que levou a vila de Santo André da Borda do Campo, primeiro povoado do planalto cuja localização exata não se conhece até hoje, a ser extinta. Basicamente foi a falta de um rio, como revela a ata de 20 de setembro de 1557, e a pouca segurança em relação a ataques indígenas. Isso fez prevalecer o povoamento de São Paulo de Piratininga, que não tinha os mesmos problemas.
Outras atas, como mostra Andreotti, destacam os "regulamentos sobre o gado solto (19 de julho de 1578); sobre os mestres de ofício, ferreiros e sapateiros (15 de abril de 1588); sobre a produção de marmelada (19 de janeiro de 1599) e na ata de 01 de maio de 1589, está declarada a população de 150 moradores, quando eram contados somente os homens brancos". Documentos de fundamental importância para o entendimento da São Paulo colonial são também as Cartas dos Primeiros Jesuítas e o Registro Geral da Câmara, ambos disponíveis no arquivo. O documento privado mais antigo do acervo é o inventário de um sapateiro chamado Damião Simões, de 1578.
Apesar da relevância dos documentos coloniais não é só por causa deles que o Arquivo Municipal é grandioso. Ele conta também com inventários, relatórios imperiais, fotografias, ilustrações, caricaturas, mapas, jornais e revistas. Um destaque é o conjunto de imagens fotográficas do jornal Última Hora, fundado pelo jornalista Samuel Wainer, que circulou entre os anos de 1951 e 1971 e foi um marco na história da imprensa brasileira.
Além disso, há documentos produzidos e acumulados pelo Departamento de Cultura entre 1935 e 1940, material produzido pela Comissão do IV Centenário da cidade de São Paulo (1951-1967) e livros de registros dos cemitérios públicos municipais até 1977. O Departamento de Cultura foi dirigido pelo escritor Mário de Andrade desde sua criação, em 1935, até meados de 1938. Foi ele que constituiu a Divisão de Documentação Histórica e Social, embrião do Arquivo Municipal.
Neste momento, o Arquivo Municipal apresenta três interessantes exposições. Uma delas é a "Atas da Câmara (1555-1899): dos documentos do passado ao território do presente". Em 1899, ano da última ata, foi escolhido o primeiro prefeito da cidade do período republicano, Antonio da Silva Prado. São Paulo teve também três prefeitos no período regencial, entre 1835 e 1838.
A outra exposição é "Acervo e Conservação: exemplares do Arquivo Histórico Municipal", que reúne documentos que descrevem a construção da cidade até os tempos atuais. E a terceira é a "Ocupação Arquivo Vivo", que acontece no saguão principal do edifício Ramos de Azevedo e trata da função dos arquivos no mundo contemporâneo.
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