Ao fazer uma oferta pela compra de 100% do Twitter, Elon Musk fixou o preço por ação em US$ 54,20. Quem é do Vale do Silício e conhece Musk, logo percebeu a piada. A popular banda local de rock, os Grateful Dead, surgida ainda no tempo dos hippies, promoveu em 20 de abril de 1991, às 16h20, um concerto de celebração da cultura da maconha.
Em inglês, data e hora se escrevem 4/20, 4:20pm. 420 é código. Musk, o homem mais rico do mundo pela lista da Forbes, é militante pela causa da legalização. A piada embutida no valor não é irrelevante para analisar o impacto da oferta. Nela, está uma pista para entender a cabeça política do criador da Tesla. E isto é fundamental para avaliar que tipo de Twitter ele pensa para o futuro.
Nesta quinta, 14, foi iniciada por Musk uma tentativa de aquisição hostil da principal rede social voltada para política do mundo. Musk é, nos costumes, abertamente progressista. Certa vez, quando muita gente insistia que ele se posicionasse no jogo partidário, Musk se recusou.
Ainda assim, quem está animado com a aquisição do Twitter, nos EUA, é a direita. “É importante que tenhamos uma arena para que a liberdade de expressão seja exercida de forma inclusiva”, afirmou ele em uma conferência que ocorre no Canadá. Em outra ocasião, se declarou um “absolutista da livre expressão”.
Entrevistado pela New Yorker para um perfil de seu ex-sócio Peter Thiel, Musk deu a pista chave. “Sou um quê libertário”, disse, “mas Peter é extremamente libertário.”
Há duas formas de encarar a ideia de liberdade. Uma, mais individualista, parte do exercício pessoal de cada um. Outra vem do princípio de que é preciso que alguma força externa garanta seu exercício da liberdade. O Estado, por exemplo. Muitos compreendem que os conceitos convivem. Libertários, não. Libertários veem na ação do Estado para proteger uns a interferência na liberdade de outros.
A discussão é filosófica mas trata do mundo real. Neste momento, há grupos que se utilizam da liberdade de expressão para manipular informação pelas redes e assim distorcer a percepção da realidade de uma ampla parcela da sociedade. Isto é se utilizar das ferramentas da democracia para fraudar a compreensão do eleitor e assim obter ganhos políticos. É judô. Usar a força da democracia contra ela própria.
O Twitter é a mais influente rede social no debate público em vários países, inclusive no Brasil. Não sabemos o que é ser “um quê libertário” ou o que é “liberdade de expressão inclusiva”. Mas permitir tudo, paradoxalmente, pode levar a ditaduras.
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