Além do cabecinha Daniel Silveira, outro assunto pôs a internet em polvorosa esta semana: o lançamento do miojo doce, nos sabores chocolate e beijinho.
Trata-se uma edição limitada –obviamente, pois os caras da Nissin não são malucos de abarrotar as gôndolas com um negócio desses. Nem cabe ponderar se a coisa é asquerosa ou surpreendentemente palatável (spoiler: não tem como ser boa).
Porque ninguém quer vender miojo doce. O que o fabricante quer é fazer barulho com uma polêmica planejada dentro de uma agência de publicidade. Quer divulgação espontânea da marca.
Quer isto que eu estou fazendo agora mesmo, neste espaço.
O gasto com mídia é substituído pelo custo industrial da produção de um pequeno lote de miojo bizarro. Não tenha dúvida de que sai bem mais barato. E funciona muito.
Depois de ver uma série de tuítes chamando o miojo doce de "trombeta do Apocalipse", escrevi um post em que me dizia cansado de dar palco para esse tipo de ardil mequetrefe de marketing.
Alguém comentou que o meu tuíte era justamente esse palco. Pois é. Estou cansado, mas não disse que iria parar.
Somos prisioneiros das redes sociais, dependentes da máquina que põe nos "trending topics" o miojo doce e tranqueiras bem piores. Sim, estou falando dele: Jair Messias Bolsonaro.
A cantora Anitta bloqueou o presidente nas redes porque não convém à marca Anitta ser usada de trampolim para multiplicar o alcance das barbaridades bolsonaristas.
Por trás dos tuítes espontâneos da artista está uma equipe de profissionais que entende os mecanismos das redes e traça estratégias de comunicação digital. Esses especialistas chegaram à conclusão de que Anitta mais perde do que ganha quando alguns perfis marcam a sua arroba.
Não é assim com a maioria dos usuários de Twitter, Instagram e congêneres.
Essas redes nos foram apresentadas como espaços virtuais de conexão com pessoas do mundo real. Só depois de milhares de vídeos de gatinho é que percebemos a verdadeira função de tais ambientes: fazer-nos comprar objetos e ideias sem perceber que somos conduzidos para a traineira junto com as outras sardinhas da rede.
Aí já era tarde demais. Dona Maria e seu Zé já estavam reféns dos likes e da busca por novos seguidores. A situação é um pouco pior para nós, da imprensa.
Acompanhar assuntos em destaque é uma obrigação e uma necessidade para o jornalista. No mundo ideal, um mecenas pagaria as contas da imprensa sem exigir retorno, mas não é assim que funciona (com pouquíssimas e discutíveis exceções).
Precisamos de audiência para sobreviver. Isso passa obrigatoriamente por redes sociais e mecanismos de busca. Ser relevante nesses âmbitos não é opcional.
Então mordemos iscas como o miojo doce e o perdão que Bolsonaro concedeu a Daniel Silveira.
Bolsonaro está se lixando para o cabecinha. Ao anunciar a anulação de sua condenação, ele quis soar a trombeta que convoca seus demônios para a guerra. Ele sabe manipular as redes, assim como o povo da Nissin. Para Bolsonaro, Daniel Silveira é um miojo de chocolate.
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