segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

Pecuaristas fazem churrasco em agências do Bradesco em protesto após vídeo contra carne, FSP

 Douglas Gavras

Rogério Florentino
CURITIBA e CUIABÁ

Pecuaristas de ao menos cinco estados fazem na manhã desta segunda-feira (3) churrascos nas portas de agências do Bradesco, em protesto contra um vídeo em que influenciadoras recomendaram um dia sem carne e associam a prática a um aplicativo do banco que calcula pegadas de carbono.

O material circulou nas redes sociais há duas semanas e o Bradesco informou que tirou o vídeo do ar no último dia 23. Nele, três influenciadoras dão dicas de como o consumidor pode ter hábitos mais sustentáveis e reduzir sua pegada de carbono.

A primeira dica dada por elas é aderir ao movimento conhecido como "Segunda sem Carne", em que as pessoas optam por consumir pratos vegetarianos.

"A criação de gado contribui para a emissão dos gases de efeito estufa, então, que tal se a gente reduzir o nosso consumo de carne e escolher um prato vegetariano na segunda-feira?", diz uma delas.

O conteúdo irritou os ruralistas, despertando críticas de políticos que defendem pautas ligadas ao agronegócio, empresários do setor e entidades.

Sindicatos rurais organizaram por meio das redes sociais os churrascos, que batizaram de "Segunda com Carne". Também foram marcados atos nas portas das agências de Ribeirão Preto (SP), Araçatuba (SP), Birigui (SP), Cuiabá (MT), Rondonópolis (MT), Araguaína (TO), Água Boa (MT), Canarana (MT), Barra do Garça (MT), Goiânia (GO) e Xinguara (PA).

População faz fila para receber churrasco em frente ao Bradesco em Cuiabá
População faz fila para receber churrasco em frente ao Bradesco em Cuiabá - Rogério Florentino/Folhapress

Em Mato Grosso, o protesto é apoiado pela Acrimat (Associação dos Criadores de Mato Grosso), da Nelore Mato Grosso e da ABCZ (Associação Brasileira dos Criadores de Zebu).

"Não é exagero da parte deles, é má-fé. Eles fazem de propósito para quebrar o agronegócio. A mesma propaganda feita pelo Banco do Brasil mostra a diferença entre um banco consciente e outro que faz difamação do agronegócio", disse o deputado estadual Gilberto Cattani (PSL).

Durante o ato em Cuiabá, cerca de 2.000 espetos de carne são distribuídos para as pessoas que passam pela agência, no centro da cidade. No fim da manhã, uma fila chegou a se formar na porta do prédio.

No ano passado, imagens de moradores de Cuiabá fazendo fila em busca de ossos ganharam as redes sociais. Nesta segunda, alguns deles aproveitaram que passavam pelo centro para pegar um espetinho com os manifestantes. Um deles é Estevão Vargas, 27. "Já peguei um pouco de carne e estou na fila para pegar de novo. Sou de Santa Catarina, mas moro em Cuiabá e apoio os manifestantes."

Para o pecuarista Jorge Pires de Miranda, também de Cuiabá, é importante que o setor se posicione contra a campanha. "Ela traz inverdades para a população, a pecuária é um segmento que só traz boas notícias para a população. Além de atendermos ao mercado nacional, exportamos para vários países, somos responsáveis por sustentar a balança comercial."

"Quisemos desmontar essa narrativa feita pelo banco, que vem passar informações falsas sobre a agropecuária. Há pesquisas que vão em sentido oposto ao que diz o vídeo", disse Wagner Martins, presidente do Sindicato Rural de Araguaína (TO). Ele estima que 1.500 pratos de carne bovina assada tenham sido distribuídos à população da cidade no evento, que durou três horas e meia.

Criadores de Xinguara (PA) divulgaram nas redes sociais doação de carne para quem levar um comprovante de inscrição no programa Auxílio Brasil e documento de identificação.

De acordo com os sindicatos, os modelos de produção da agropecuária brasileira utilizam práticas sustentáveis, pastagens produtivas e integrações para a criação de bovinos, que contribuem positivamente para a questão das emissões de carbono.

Após tirar o vídeo de suas redes, o banco divulgou, no dia 24, uma carta aberta ao agronegócio, em que procurou se desvincular do conteúdo e disse que tomaria ações administrativas internas severas por conta do ocorrido.

"Nos últimos dias lamentavelmente vimos uma posição descabida de influenciadores digitais em relação ao consumo de carne bovina, associadas à nossa marca. Importante dizer que tal posição não representa a visão desta casa em relação ao consumo da carne bovina", diz a carta do banco.

"Se o Brasil não tivesse a produtividade que a pecuária tem, a comida seria muito mais cara. A questão da fila do osso é governamental e não podemos ser responsabilizados por isso, o que nós esperamos são políticas que melhoram a renda do brasileiro", disse Jorge Pires, diretor do Sindicato Rural de Cuiabá. "Participamos de diversas ações de doação de alimentos."

Na semana passada, a Acrimat emitiu uma nota repudiando tanto o vídeo quanto a postura do banco, "que emitiu um comunicado se isentando de qualquer responsabilidade sobre o ocorrido e reiterando sua confiança e apoio ao setor".

"Ocorre que o próprio Bradesco, em um dos seus aplicativos, também estimula a redução do consumo de proteína animal com a desculpa de se reduzir a emissão de carbono. Ora, se somos uma das cadeias mais importantes para a economia, como o próprio Bradesco atua com essas duas versões?", questionou a entidade.

Responsável pela campanha do app que calcula pegadas de carbono, a Leo Burnett não confirma e nem nega a autoria do vídeo com as influenciadoras que propuseram a segunda-feira sem carne. A agência também não quis comentar a repercussão do material.

Na última sexta-feira (31), o Bradesco reiterou seu apoio ao setor e, por meio de nota, disse que a instituição é o maior banco privado do agronegócio.

"Foram a Pecplan e a Fundação Bradesco, com o apoio de seus técnicos, que implantaram e capacitaram milhares de agropecuaristas a fazer inseminação artificial, ajudando a agropecuária a chegar ao atual e reconhecido nível de excelência mundial."

Procurado novamente nesta segunda-feira para comentar os atos de protesto marcados pelos ruralistas, o banco reforçou que apoia o agronegócio.

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