Congressistas da base do governo Jair Bolsonaro e de oposição querem alterar a MP (medida provisória) da crise de energia, editada na semana passada pelo presidente para criar o comitê de gestão do problema. O país atravessa hoje a pior crise hídrica dos últimos 91 anos.
Há pressão para que o governo seja novamente obrigado a contratar determinados tipos de energia, o que é visto por especialistas como uma reserva de mercado, além de articulação para estender benefícios para geração de energia por meio de carvão, considerada muito poluente.
A mesma iniciativa também ocorreu na MP que abriu caminho para a privatização da Eletrobras e foi considerada um jabuti, quando a proposta não tem ligação com o tema principal do texto em discussão.
Uma medida provisória passa a ter efeito imediato, mas precisa do aval do Congresso em até 120 dias para não perder a validade. Cabe aos deputados e aos senadores analisarem a proposta e apresentarem mudanças no texto. Ainda não há previsão para que a proposta seja votada.
O relator da MP, quando for escolhido, será responsável por negociar as alterações no texto antes de ir ao plenário da Câmara e depois do Senado. Foram 248 emendas apresentadas ao todo.
Parte das emendas tenta repetir a estratégia adotada durante a votação da MP da desestatização da Eletrobras, quando o Congresso conseguiu incluir emendas que não estavam na versão original do projeto, os chamados jabutis.
Segundo associações do setor elétrico, as mudanças feitas na MP da Eletrobras irão encarecer a geração de energia nos próximos anos. O governo refuta a tese e diz que, apesar das alterações do Congresso, haverá corte no custo da energia.
O ponto mais polêmico foi a determinação de que a União terá de contratar usinas térmicas a gás e pequenas centrais hidrelétricas, o que, segundo especialistas, resulta em uma energia mais cara por serem menos competitivas.
O deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP) defende incentivos para o setor de energia solar. Em uma das emendas na nova MP, ele quer que a União seja obrigada a realizar um leilão para contratar esse tipo de energia.
Para beneficiar o setor de energia movida a biomassa, o mesmo mecanismo é previsto em uma emenda do deputado Zé Vitor (PL-MG), que determina a contratação de geração dessas termelétricas futuramente.
Proposta semelhante foi apresentada pelo deputado Valtenir Pereira (MDB-MT).
O PL faz parte da base de sustentação de Bolsonaro no Congresso. O PSB é um partido de oposição ao governo. Já o MDB tem uma postura de independência ao Palácio do Planalto.
Para que uma emenda seja incluída na medida provisória, é necessário apoio político. Isso será feito nas próximas semanas, pois a discussão do projeto do governo para lidar com a crise hídrica ainda precisa amadurecer no Congresso.
Em uma articulação em favor de sua base eleitoral, o deputado Ricardo Guidi (PSD-SC) tenta prorrogar benefícios para o setor de energia a carvão, considerada pouco eficiente e bastante poluente.
"O fim desse subsídio gerará altos impactos nos municípios com economia que tem como atividade a extração do carvão mineral", justificou ele.
Na MP da Eletrobras, senadores de Santa Catarina já tentaram estender incentivos ao setor, mas tiveram que recuar após pressão contrária do governo.
Outro aliado de Bolsonaro que tenta emplacar mudanças na MP da crise elétrica é o deputado Roman (Patriota-PR). A sugestão dele é que o Ministério de Minas e Energia crie um plano para que até 2030 entrem em operação 50 GW (gigawatts) de energia solar no país.
Do lado da oposição, o líder do PT na Câmara, Bohn Gass (RS), apresentou uma emenda para tentar barrar a privatização da Eletrobras, cujo aval foi dado pelo Congresso em junho.
"É inquestionável a importância que a Eletrobras exerce no processo em curso de transição energética mundial e descarbonização do setor elétrico e das atividades produtivas. O Brasil possui uma das fontes mais limpas de energia e se coloca como exemplo para o mundo. Logo, sua eventual privatização não pode ocorrer durante a crise hídrica", disse o petista.
Para reagir à crise energética, Bolsonaro editou a MP na semana passada para dar poderes ao Ministério de Minas e Energia decidir sobre o nível de vazão de água nos reservatórios das hidrelétricas.
A previsão é que neste ano o país sofra com pouca chuva, principalmente nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, onde estão os principais reservatórios de hidrelétricas. Hoje, o Brasil depende de mais de 60% dessa fonte de energia.
Cabe ao Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e à ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento) definirem as vazões que passam pelas barragens, para atender requisitos ambientais ou permitir outros usos da água. Agora, o governo passa a centralizar as decisões.
Apesar de tratarem de temas relacionados ao setor elétrico, emendas da oposição e de governistas, portanto, incluem medidas que não estão originalmente previstas na proposta do Planalto.
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