Quem viu o Bolsonaro da semana passada, falando e andando com sua opinião a respeito da CPI, insultando ministros do Supremo e ameaçando cancelar a eleição, pensou que estava sonhando. Viu-o citar a oração do padre-nosso depois de uma conversa de 20 minutos com o presidente da corte, Luiz Fux.
Seria um novo Bolsonaro, respeitador do quadrado da Constituição, moderado e calmo, até na voz.
O que os dois conversaram, não se sabe, mas é muito provável que a essa novidade se aplique a eterna profecia do deputado Luís Eduardo Magalhães: “Não tem a menor possibilidade de dar certo”.
Seria bom que tivesse, mas a índole do capitão, seu projeto eleitoral e os fatos que vêm por aí conspiram contra essa hipótese.
Para que o novo Bolsonaro pudesse sair das cordas seria conveniente que houvesse uma trégua nas investigações que tramitam no Supremo Tribunal. Fux não tem como articulá-la. Há meses ele aceitou a ideia de uma comissão dos Três Poderes para cuidar da pandemia. Ganha uma fritada de morcego quem souber dela.
A comissão existe apenas para tomar o tempo de quem vai às suas reuniões. Ficou no mesmo limbo onde repousava, há meses, o gabinete de crise coordenado pelo general Braga Netto.
Coisas desse tipo acontecem porque estão infiltradas num governo disfuncional, pois só nele poderia ter tramitado a girafa da vacina indiana.
É quase certo que a CPI do Senado seja prorrogada por 90 dias, ocupando o espaço do recesso e indo além dele. O governo continuará sangrando, com uma defesa implausível, num cenário de espetáculo.
Bolsonaro não tem uma versão capaz de explicar o contubérnio de coronéis da reserva, um cabo da PM e um reverendo da ativa em torno de uma compra de vacinas.
Num mundo de sonhos, seria possível supor que Bolsonaro estivesse disposto a deixar de lado por alguns meses a obsessão pelo voto impresso. Isso evitaria conflitos com a Justiça Eleitoral. Não dá certo porque Bolsonaro, como Donald Trump, não tem diferenças com a metodologia dos votos, mas com os resultados. Tanto é assim que até hoje não mostrou provas de fraudes nas votações eletrônicas.
O Bolsonaro moderado não cabe no formato que deu à própria plataforma, inclusive no meio dos oficiais que o seguem. Afinal, o general Pazuello nada fez de errado subindo no seu carro de som e o senador Omar Aziz foi vil, leviano e irresponsável ao tratar dos pixulecos em torno dos quais farfalhavam militares da reserva.
O general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz, ex-ministro de Bolsonaro, disse que a nota dos comandantes militares e do ministro da Defesa entrou num contexto de manifestações que fazem “só alarmismo”. Na mosca, mas alarmismo é o legume mais apregoado na quitanda do capitão.
O tranquilizante oferecido por Fux poderá até ter algum efeito. Uma semana, numa conta otimista. Para oferecer resultados, deveria ser administrado em doses regulares. Além disso, precisaria do acompanhamento de um profissional de saúde política. O Planalto descumpre o que combina e não há profissional que possa cuidar de um doente que defende a cloroquina e não toma os remédios prescritos.
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