quinta-feira, 9 de julho de 2020

A boa surpresa no desempenho do varejo, Celso Ming, O Estado de S.Paulo


08 de julho de 2020 | 19h15

A melhora no astral da economia, o tema comentado nesta Coluna na última sexta-feira, ficou reforçada nesta quarta com um avanço das vendas do varejo em maio bem superior ao esperado. As projeções oscilaram em torno de um aumento de 6% a 8% nas vendas do mercado restrito (que excluem materiais de construção e veículos), mas o crescimento foi de fato de 13,9%.

A recuperação ainda está longe dos níveis anteriores à pandemia porque em março já havia recuado 2,8% e, em abril, outros 16,3%. (É bom sempre lembrar de uma peculiaridade estatística: uma queda de 100 para 50 é de 50%, mas a recuperação de 50 para os 100 anteriores terá de ser de 100%.)

Levando-se em conta que boa parte do comércio continua fechada ou sujeita a fortes restrições, o progresso em maio é auspicioso, embora tenha partido de uma base anterior muito baixa.

Esse bom desempenho se deve em boa parte aos efeitos do auxílio emergencial distribuído à população carente. É o que explica por que, apesar do recuo geral do consumo em março e em abril, as vendas dos supermercados tenham crescido 14,3% em maio e 5,2% nos cinco primeiros meses deste ano. Esse é um setor ao qual a crise não chegou, como também não chegou às farmácias.

Reabertura do comércio em São Paulo
Clientes mantêm distaciamento em fila para entrar em loja no Shoppping Bourbon, em São Paulo. Foto: Daniel Teixeira/Estadão - 3/7/2020

Mas a recuperação do varejo em maio, especialmente nos segmentos de vestuário, móveis e aparelhos domésticos, deve-se, também, à demanda reprimida acumulada nos meses anteriores: porque permaneceram engaioladas pela pandemia, as famílias tiveram de adiar suas compras e voltaram a elas tão logo as lojas foram reabertas, ainda que parcialmente. Talvez porque parte dessa descompressão já tenha acontecido, o aumento das vendas nos próximos meses ficará mais limitado.

Tanto melhor se o desalento vai ficando para trás. Esse é, por si só, um fator positivo porque ajuda na recuperação por sua capacidade de restaurar a confiança. Mas não se pode ignorar que as condições gerais da economia pioraram muito: o desemprego alcança 12,7 milhões de brasileiros e já são em maior número que os empregados com carteira de trabalho registrada; as estimativas mais otimistas são de que o PIB afundará alguma coisa entre 6% e 7%; o rombo das contas públicas pode ter ultrapassado os 10% do PIB; a dívida pública bruta passou dos 81% do PIB e se avizinha rapidamente dos 100% do PIB; as cotações do dólar avançaram 33,3% neste ano, fator que encareceu as importações; um grande número de empresas está à beira da insolvência porque enfrenta um colapso de caixa, e muitas outras estão superendividadas. Nem mesmo se pode dizer que a pandemia está regredindo, porque o número de infectados e o número de mortes seguem aumentando. E há ainda a crise política.

Enfim, a ficha do Brasil continua ruim. Vai precisar de muito conserto e de andamento nas reformas tributária e administrativa, hoje emperradas. Mas a expectativa para os próximos meses é de retomada gradativa do consumo, da produção e do emprego.

Soja
O Brasil é o maior produtor mundial de soja Foto: Germano Rorato/Estadão - 24/8/2018

CONFIRA

» Recorde nas safras

As novas projeções das safras desta temporada são ainda melhores do que as anteriores. A Conab prevê mais um recorde: uma colheita de 251,4 milhões de toneladas de grãos, crescimento de 3,9% em relação à safra anterior. E o IBGE, que também faz os levantamentos, calcula que serão 247,4 milhões de toneladas, 2,5% acima da anterior. Esse é um setor que vem confirmando as expectativas mais otimistas. Deve ajudar na recuperação do comércio e nos serviços do País, a partir do interior.


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