SÃO PAULO
Amparada em seus 2.060.786 de eleitores, Janaina Paschoal, a deputada mais votada da história do país, começa a atuar como madrinha política, depois de não se alinhar totalmente a Jair Bolsonaro, a João Doria (PSDB) ou ao seu próprio partido, o PSL.
Por ser mais adepta das sessões do plenário do que dos cafezinhos de bastidores, surpreendeu seus colegas na Assembleia paulista ao tomar a frente de articulações para uma chapa de direita à Prefeitura de São Paulo.
Até agora, ela não aderiu às candidaturas de Joice Hasselmann (PSL), de Bruno Covas (PSDB) ou do nome que venha a ser apoiado pelo bolsonarismo, como o apresentador José Luiz Datena, por exemplo. Desde o fim do ano passado, vem costurando alternativas.
Foi pelas mãos dela que os pré-candidatos que apoia, Andrea Matarazzo (PSD) e Arthur do Val (Patriota), se encontraram em dezembro em uma doceria.
A ideia da deputada estadual era unir um nome tradicional e com experiência na gestão da cidade a outro nome que considera ter viabilidade eleitoral. Arthur, o youtuber Mamãe Falei, tem 2,67 milhões de inscritos em seu canal, é membro do MBL (Movimento Brasil Livre) e foi o segundo deputado mais votado na Assembleia, com 478 mil votos.
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Foi Janaina que também abriu as portas do PSL a Arthur, expulso do DEM em novembro e que estava em busca de um partido para abrigar sua candidatura até quarta (5), quando oficializou acordo com o Patriota.
Arthur se encontrou em janeiro com Joice, que se coloca como candidata, e com o deputado federal Júnior Bozzella (PSL-SP), presidente da sigla em São Paulo e braço direito do presidente nacional, Luciano Bivar.
As duas negociações, no entanto, emperraram pelo mesmo motivo: Andrea e Joice aceitavam Arthur como vice, mas não abririam mão da cabeça de chapa por ele. O youtuber preferiu um partido em que pudesse disputar a prefeitura.
Ao tentar construir uma candidatura, Janaina, advogada que liderou o pedido de impeachment de Dilma Rousseff (PT), diz que não está fazendo articulação política e nem agindo em nome do seu partido. "Ninguém me pediu, mandou ou autorizou a fazer isso. Eu sempre me envolvi nas questões da minha cidade e do meu país", disse à Folha.
"Antes de ser deputada, eu sou brasileira e sou paulistana. Estou procurando unir bons quadros para dar o melhor para a cidade. Nada além disso. Penso que todos deveriam agir assim. Buscar o melhor para a população, sem qualquer interesse pessoal", completou.
Os interlocutores de Janaina concordam que a atuação da deputada é mais movida pelo idealismo do que por cálculo eleitoral, embora ela seja vista como uma pessoa em condições de disputar cargos mais altos no futuro. Também dizem que ela tem sido habilidosa em suas costuras.
No fim do ano passado, quando a direção do PSL de São Paulo saiu das mãos do deputado federal Eduardo Bolsonaro e passou para Bozzella, após o racha com a iniciativa de criar a Aliança pelo Brasil, Janaina passou a ter um canal direto com a cúpula partidária.
Foi ela que fez a ponte entre Bozzella e os outros 14 deputados estaduais do PSL, convocando-os para uma reunião na última semana de janeiro. A bancada é a maior da Assembleia paulista e se sentia afastada da executiva estadual do partido.
Em meio à queda de braço entre Bolsonaro e Bivar, o movimento gerou críticas de deputados bolsonaristas na Casa, que enxergaram uma traição ou uma mudança de lado. Não é a primeira vez que ela se distancia do presidente.
Apesar de apoiar o governo federal, ela criticou os escândalos envolvendo Flávio Bolsonaro e a indicação de Eduardo Bolsonaro para a embaixada nos EUA. Da mesma forma, já se opôs ao PSL, exigindo a demissão do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, diante do uso de candidatas de laranjas no partido e se preocupa com a ligação entre Bivar e a gestora do DPVAT.
Em relação a Doria, Janaina também não veste a camisa. Votou com o governador paulista na grande maioria das vezes, mas chegou a criticar detalhes ou a falta deles nos projetos da reforma da Previdência e de extinção de estatais. Também escreveu projeto para restringir a verba de publicidade do tucano.
Apesar da aproximação com Bozzella, que diz conversar com Janaina frequentemente, a deputada estadual afirma manter a independência em relação a partidos, inclusive o seu próprio. Ela é defensora das candidaturas avulsas, sem a necessidade de legenda, o que hoje não é permitido no Brasil.
Janaina também não se dispôs a ocupar cargos na cúpula do partido, como o de líder da bancada. Na terça (4), os deputados estaduais do PSL se reuniram para escolher seu novo líder —Gil Diniz, ligado aos Bolsonaro e de malas prontas para a Aliança, deixará o cargo após um ano, como previamente acordado.
Bozzella diz que Janaina é a sua candidata para a liderança. "Ela deveria ser aclamada, ela não precisa nem se colocar na disputa. Os deputados vão se conscientizar que ela tem que ser a líder", diz.
A deputada, porém, refuta a ideia. "A liderança é sonho de muitos colegas, não é o meu. Não tem sentido entrar na disputa só para atrapalhar", disse.
Com isso, e também por conta da divisão entre deputados mais bolsonaristas, que pretendem migrar para a Aliança, e deputados mais ligados ao PSL, houve uma pulverização de candidaturas.
Quatro parlamentares se apresentaram para a disputa, todos com perfil mais moderado, que teriam condição de transitar entre as duas alas. Uma reunião de votação está marcada para próxima terça (11).
Em relação à Prefeitura de São Paulo, ela teve a mesma postura. Considerada candidata natural ao cargo, Janaina excluiu essa possibilidade já em meados do ano passado, quando passou a indicar voto em Andrea Matarazzo e abriu caminho para Joice. Mais recentemente, também abraçou a candidatura de Arthur.
Aliados da deputada dizem que a liderança entre os colegas do PSL cresceu ao longo de 2019, conforme Gil foi tragado pela acusação de prática de "rachadinha" em seu gabinete, que ele nega.
Gil e Janaina chegaram a bater boca no plenário em novembro por discordância em relação ao projeto que aumenta em 5% o salário dos policiais. "Vossa excelência está desmoralizando seus colegas de partido", disse a deputada.
Ele reagiu. "Quem quer dar voo solo, que dê, mas não venha me cobrar que eu não devo satisfação. Não fui eleito na aba de ninguém. Não pago simpatia para ninguém, tendo 20 mil votos ou 2 milhões" disse.
Janaina também já bateu boca com outros colegas em plenário, como o veterano Campos Machado (PTB) e a Professora Bebel (PT). Para além dos barracos, sua atuação não é apagada na Assembleia. Ela costuma ir à tribuna e causa polêmica com suas propostas, como o que permite a opção pela cesárea sem indicação médica.
Bozzella, potencial beneficiário da força eleitoral de Janaina, enaltece sua fase articuladora. "Tem surpreendido positivamente", resume.
"Ela é o principal ativo do PSL com sua pauta anticorrupção. Está preparada do ponto de vista eleitoral, político, emocional e cultural para exercer qualquer função, inclusive a de presidente da República."
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