Pedir a cabeça do presidente é escolher culpado
Horacio Lafer Piva
Parte da diretoria da Vale acaba de ser informada pelo Conselho de Administração quanto à recomendação do Ministério Público, com atuação das polícias federal e civil, para seu afastamento imediato. Sábado seu presidente, Fabio Schvartsman, divulgou uma carta na qual apresentou seu pedido de afastamento temporário, e que espero de fato o seja.
Convivi com Fabio por seis anos, diariamente, e não tenho dúvidas em emprestar minha referência pessoal na defesa de um profissional de extraordinário caráter, padrão ético e capacidade profissional.
Meu coração, assim como de todos os brasileiros, está entregue às famílias enlutadas e ao meio ambiente destruído, mas isso não impede que não se possa fazer escolhas, a bem do que temos à frente. Um dos mortos foi um amigo pessoal.
Fabio e esta diretoria têm tido um empenho raro e invejável, que por outras razões acompanho de perto e de forma mais que atenta. Não posso imaginar equipe melhor para enfrentar estes momentos, não só por suas qualidades intrínsecas, mas igualmente pelas emoções que carregam na proximidade do acidente, estando, portanto, com um grau de dedicação e olhar amplo maior que qualquer outro novo grupo.
O Brasil tende a responder muitas questões com o fígado. Temos tido exemplos de linchamentos morais injustificáveis. É claro que culpados devem ser expostos, que o excesso de tolerância e impunidade nos asfixia, mas existe a Justiça, a investigação, a determinação de culpabilidade pela razão. Está mais do que na hora de em casos de dúvidas substituir possibilidades por certezas, opinião por precisão.
O acidente da Vale é uma história a ser contada, e não determinada. Pedir a cabeça de seu presidente, que não foi quem comprou a barragem, não a utilizou, e está no cargo faz dois anos, é sim aplacar com a medida um desejo compreensível de parte da sociedade, mas também é escolher um culpado, e ainda tirar sua permissão de fazer o que for possível neste momento.
Conheço sua atenção quantos aos riscos de uma companhia, e sei o quanto ele lida bem com crises. Perderá a Vale, perderão seus milhares de funcionários, muitos dos quais o apoiam, perderá a sociedade brasileira. E não me venham com acusações de escolher mercado, pessoas e a empresa antes do acidente e suas vítimas, quando o que propugno são a conduta e soluções na medida do que é possível diante de tal tragédia.
Ser dirigente da Vale neste momento, e isto vale também para o Conselho, não é prêmio, é carga, missão e encargo, e dos mais dramáticos deste país.
Não há razão, há política. Não há que esmorecer na busca do que aconteceu, por que e por quem, mas dentro de alguma racionalidade. A empresa tem agido com responsabilidade e sensibilidade, e tal atitude emana de seu Conselho, que deve manter seus brios, e seu presidente-executivo, que ao contrário de outras épocas, pessoalmente se apresenta e lidera a crise. Deixem essa turma, que sente e sabe, responsável por ajudar no que há de ser feito.
Podemos e devemos discutir a atividade, os controles, as culpas, o sistema. Mas agora, pelas famílias, Minas Gerais, seus entornos e o Brasil, permitam a essa turma trabalhar.
Horacio Lafer Piva
Ex-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), é membro do conselho da Klabin.
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