Inteligência coletiva natural dos insetos serviu como base para estudo desenvolvido na Poli que ajudou a acelerar o serviço na capital
30 de dezembro de 2012 | 2h 05
FELIPE FRAZÃO - O Estado de S.Paulo
O comportamento de uma colônia artificial de abelhas serviu como base para um estudo que ajudou a planejar e acelerar o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) de São Paulo. O trabalho foi apresentado em junho pelo engenheiro Luiz Andrade como dissertação no mestrado em Sistemas Logísticos da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP).
Para desenvolver um sistema matemático de distribuição de ambulâncias, capaz de funcionar com o mesmo dinamismo das ocorrências emergenciais atendidas pelo Samu, Andrade escreveu um algoritmo que tem como modelo a inteligência coletiva natural das abelhas.
Assim como a demanda por atendimento médico surge de forma aleatória nos bairros - e as ambulâncias têm de ser direcionadas para suprir essa necessidade -, as abelhas saem da colmeia sem direção predeterminada em busca de néctar. Após localizarem a fonte (o local da ocorrência), voltam à colmeia (a base do Samu) para repassar a instrução a outras abelhas (viaturas) e depois buscar novas fontes.
"Nesse comportamento surge uma inteligência coletiva. Não existe uma abelha planejadora dizendo para onde ir. A mesma coisa é o sistema de atendimento móvel. Ele se autoadapta para o que o município precisa", afirma Andrade.
Com dados epidemiológicos e de atendimento do Samu, além de informações sobre o trânsito paulistano, o engenheiro simulou cenários de disponibilidade de viaturas e disposição das bases pela cidade para que as ambulâncias mantivessem uma resposta ótima de até 10 minutos entre o chamado telefônico e chegada do socorro, em casos de emergência - se há risco de vida.
Ele analisou a complexidade e as peculiaridades do deslocamento de ambulâncias na capital. Por exemplo: as diferenças de tempo de deslocamento de uma viatura que sai do Samu até um ponto específico de atendimento no horário de rush, em um fim de semana ou fora dos picos de congestionamento.
Com base na pesquisa, Andrade sugeriu que o Samu adote uma programação chamada "ciclo ótimo" de alocação semanal das ambulâncias. Ao longo dos dias, as viaturas seriam deslocadas pelas bases nos pontos de maior incidência de chamados - os hotspots epidemiológicos, só voltando à distribuição inicial no fim da semana. "O modelo busca maximizar a cobertura e minimizar os custos de realocação de bases e ambulâncias", explica Andrade.
Segundo dados históricos do Samu, por causa da concentração de pessoas, o centro expandido demanda mais atendimentos durante o dia (manhã e tarde) e as periferias e bairros, à noite. Um exemplo é a viatura 913, da base Campos Elísios, que à noite pode ser colocada para rodar na Avenida Nove de Julho, que vai do centro à zona oeste.
Na Vila Mariana, por exemplo, uma base com duas viaturas pode atender outros cinco bairros durante o dia e a tarde de uma segunda-feira. À noite, ao longo do fim de semana, a mesma base consegue cobrir um raio de ocorrências de outros 12 bairros.
Mobilidade. Andrade concluiu que há vantagens em o Samu usar bases modulares, estruturas pré-fabricadas em contêineres, pela possibilidade de transferi-las para outros endereços em casos de aumento na demanda. "Se as cem bases fossem modulares, haveria a mesma cobertura de hoje com dez bases a menos", diz o autor do estudo.
Antes de o trabalho ser desenvolvido na Poli, o Samu tinha dez bases-contêineres. Neste ano, termina com 37 dessas estruturas - que custam, cada uma, cerca de R$ 11 mil por mês. Assim como as bases em alvenaria ou as em sedes dos bombeiros, elas só atendem pelo telefone e não são abertas ao público - ao contrário dos prontos-socorros.
"Usar estruturas de contêineres nos possibilitou abrir bases não só onde havia terreno ou imóvel disponível, mas sim onde há necessidade, indicada pela epidemiologia, algo científico. Foi o grande salto", diz o coronel Luiz Carlos Wilke, diretor do Samu paulistano. Uma das propostas para a nova gestão é transformar as 100 bases do Samu em modulares.
As conclusões da dissertação de Andrade serão aplicadas e testadas no Samu pelos próximo seis meses. As bases estão sendo alocadas de acordo com a mancha epidemiológica, ocorrências distribuídas espacialmente e os cálculos matemáticos para manter o tempo de atendimento emergencial em 10 minutos.
Reconhecimento. Em abril deste ano, por conseguir cumprir o tempo estipulado como ideal de resposta em emergências, o Samu paulistano recebeu um reconhecimento nos Estados Unidos. A International Academies of Emergency Dispatch, entidade que desenvolveu o protocolo usado pelos atendentes do 192 com uma sequência de perguntas e respostas para classificar a gravidade das ocorrências, certificou o serviço como de "excelência" por três anos.
O novo protocolo foi adotado em fevereiro de 2011, o que possibilitou mais rapidez ao atendimento. Entre 2007 e 2012, o tempo do serviço caiu de 35 minutos para 10 minutos. Para manter esse padrão, auditado todos os meses, o Samu tem de aprimorar a operação constantemente.
Com a atual estrutura (100 bases e 140 ambulâncias) é possível manter o tempo crítico de 10 minutos em pelo menos 95% dos chamados emergenciais, segundo o estudo da Poli. Mas o trabalho lançou um desafio: o de, com os mesmos recursos, reduzir o tempo de resposta para até 5 minutos. A direção do Samu assumiu os 5 minutos como uma meta. Para casos não emergenciais, no entanto, não há prazo.
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