segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Preço de imóvel é irreal e insustentável, diz estudo

GUSTAVO PATU
DE BRASÍLIA

Estudo conduzido por dois pesquisadores do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) aponta "possibilidade concreta de existência de uma bolha no mercado de imóveis no Brasil", que pode estourar com a possível elevação futura dos juros.
Ou, em outras palavras, que a disparada dos preços de casas, terrenos e apartamentos nos últimos anos está resultando em valores irreais, incompatíveis com os movimentos de oferta e procura do mercado -e, portanto, insustentáveis.
Assinado pelos economistas Mário Jorge Mendonça e Adolfo Sachsida, o trabalho alimenta com novos argumentos a controvérsia instalada entre estudiosos, compradores e vendedores.
Os autores calculam que os preços tiveram alta de 165% na cidade do Rio de Janeiro e de 132% em São Paulo entre janeiro de 2008 e fevereiro deste ano, contra uma inflação de 25% no período.
Com intervalos de tempo menores, em razão da indisponibilidade de dados mais antigos, também se constataram aumentos bem superiores à inflação em capitais como Recife, Belo Horizonte, Brasília e Fortaleza.
IMPULSO DO GOVERNO
Tradicionalmente, bolhas de preços são infladas pelo crescimento acelerado da oferta de crédito.
Esse crescimento aconteceu no setor habitacional brasileiro -com o impulso, enfatiza o estudo, de programas, incentivos e obras do governo federal.
"A insistência do governo em aquecer ainda mais um mercado imobiliário já aquecido só tende a piorar o resultado final", diz o texto.
Entre os exemplos citados estão, além dos juros favorecidos para o setor imobiliário, o programa Minha Casa, Minha Vida e os empreendimentos vinculados à Copa do Mundo de 2014 e aos Jogos Olímpicos de 2016.
Vinculado à Presidência da República, o Ipea não endossa essas conclusões. Em seu boletim "Conjuntura em Foco", o órgão argumenta que o volume de crédito no país ainda está muito longe dos 65% do Produto Interno Bruto contabilizados nos EUA.
Mas o próprio boletim mostra a rapidez da expansão dos financiamentos habitacionais brasileiros, que saltaram de 1,5%, em 2007, para mais de 5,5% do PIB neste ano.
BANCOS PÚBLICOS
Mendonça e Sachsida afirmam que, a partir do agravamento da crise internacional, no final de 2008, o crédito imobiliário tem crescido em ritmo superior ao do destinado a outros setores, especialmente nos bancos públicos.
Antes, a ampliação do crédito era puxada por bancos privados e privilegiava os setores industrial, rural, comercial e empréstimos diretos a pessoas físicas.
Segundo o estudo, a escalada dos preços dos imóveis tende a ser interrompida ou revertida com a alta dos juros, o que é esperado com a retomada do crescimento econômico e, mais ainda, com uma alta futura das taxas internacionais.
O texto diz que os efeitos de uma eventual crise no mercado imobiliário brasileiro não serão catastróficos como os do estouro da bolha americana, ponto de partida da crise global. "Contudo, não serão desprezíveis."
ASCENSÃO SOCIAL
Bolhas especulativas acontecem, pela definição mais usual, quando os preços sobem simplesmente porque os investidores e compradores acreditam que os preços subirão ainda mais no futuro.
Exemplos do gênero são mais comuns nos mercados de ações e imóveis, mas o primeiro caso documentado, no século 17, envolveu a mania por tulipas na Holanda.
Os preços subiram rapidamente e pessoas de todas as classes vendiam propriedades para investir nas flores. Depois de alguns anos, a bolha estourou, os preços caíram subitamente e inúmeros negociantes foram à falência.
Não é simples determinar se uma disparada de preços é uma bolha ou se está amparada em transformações da economia ou da sociedade.
No caso dos imóveis brasileiros, a alta pode ser resultado da ampliação da classe média nos últimos anos, possibilitada pela melhora do mercado de trabalho e pela ampliação dos programas de transferência de renda.
É o que defende um estudo produzido em 2010 pela MB Associados a pedido da associação dos bancos financiadores de imóveis. Por esse raciocínio, a ascensão social impulsionou a demanda em ritmo superior ao da oferta.
O texto não descartava, porém, a possibilidade de que a alta de preços se transformasse em bolha no futuro. E acrescentava que bolhas só podem ser determinadas com certeza quando estouram.
Editoria de Arte/Folhapress
HÁ UMA BOLHA IMOBILIÁRIA NO BRASIL? Cinco sinais que confirmam ou afastam a tese

Kassab paga aluguel para mais de 100 mil pessoas


Desalojada da favela onde morava, a família de Gerôncio Henrique Neto, 70, recebe R$ 500 por mês de auxílio aluguel da Prefeitura de São Paulo. Quando aceitou o benefício, imaginava que a situação seria temporária e que rapidamente receberia uma moradia prometida pelo município. Ele espera desde 2009.
Gerôncio é exemplo de uma situação cada vez mais comum em São Paulo: famílias desalojadas de favelas, seja por incêndios, seja por ordem da prefeitura, passam a receber auxílio para o aluguel até conseguirem um lar subsidiado pelo governo (direito garantido pela Constituição).
O problema é que o ritmo de construção de moradias não tem sido suficiente para atender ao número de pessoas desalojadas.
Desde 2010, o número de pessoas que recebem o Aluguel Social, por exemplo, quase dobrou na cidade de São Paulo: pulou de 11 mil famílias, em agosto de 2010, para as quase 21 mil atuais. Além disso, a gestão Gilberto Kassab (PSD) paga ainda o aluguel de 6.000 famílias por meio de outro programa, chamado Parceria Social.
Essa quantidade de inscritos nos dois programas equivale à população de uma cidade de 100 mil habitantes, considerando uma média de quatro pessoas por família.
Esse contingente é superior à população de 88% dos 645 municípios de São Paulo, como Assis (96.336), Ubatuba (80.604) e São Sebastião (76.344) -utilizando as estimativas populacionais de 2012 do IBGE. A situação seria ainda pior se a prefeitura não tivesse entregue 20.581 moradias populares nos últimos sete anos.
Atualmente, 398.165 famílias vivem em favelas, uma população aproximada de 1,5 milhão de pessoas, segundo dados do município.
INCÊNDIO EM FAVELA
Um dos motivos para o crescimento do auxílio aluguel, segundo a prefeitura, é a série de incêndios que as favelas da capital têm enfrentado nos últimos anos. De acordo com dados do Corpo de Bombeiros, desde 2005 foram quase 900 casos, sendo 32 deles neste ano -ao menos dois nos dez primeiros dias de setembro.
A prefeitura afirma não saber informar exatamente quantas das 27 mil famílias que recebem aluguel são vítimas de incêndios.
Cada família recebe entre R$ 300 e R$ 500 mensais, dependendo da região onde morava e do programa. Isso representa, no total, cerca de R$ 8 milhões por mês, ou quase R$ 100 milhões anuais.
Embora envolva cifras milionárias, uma das principais críticas feitas a essa assistência é que os recursos oferecidos são insuficientes para uma família, com mais de um filho, alugar uma casa.
"Com R$ 300 as pessoas não conseguem alugar um imóvel em São Paulo", afirma a defensora pública Anaí Arantes Rodrigues, coordenadora do Núcleo de Habitação e Urbanismo da Defensoria Pública de São Paulo.
"Família numerosa já tem dificuldades em alugar. Com esse valor, é impossível. Tem que ser aluguel formal, o que é mais difícil ainda."
Para o arquiteto e urbanista Kazuo Nakano, do Instituto Polis, o auxílio para aluguéis não é uma solução habitacional adequada.
"Entre 2005 e 2011 foram construídas poucas moradias [populares], enquanto 20 mil famílias tiveram que sair de suas casas e contar com esse baixo valor para o aluguel."
Para ele, o auxílio serve para o município "remover" famílias de baixa renda de áreas valorizadas da cidade. "Essa remoção ocorre por diversos motivos, mas, principalmente, para a liberação de valiosas terras urbanas." (ROGÉRIO PAGNAN, TALITA BENDINELLI, PEDRO IVO TOMÉ E MARÍA MARTÍN)

sábado, 15 de setembro de 2012

Os candidatos são todos iguais, por Frei Betto


O tom varia do palavrão a desqualificar toda a árvore genealógica do candidato à veneração acrítica de quem o julga perfeito. Marido briga com a mulher, pai com o filho, amigo com amigo, cada um convencido de que possui a melhor análise sobre os candidatos…
Um terceiro grupo insiste em se manter indiferente ao período eleitoral. Todos os candidatos são considerados corruptos, mentirosos, aproveitadores ou demagogos (ou tudo ao mesmo tempo).
Mas não há saída: estamos todos sujeitos ao Estado. Ficar indiferente é passar cheque em branco, assinado e de valor ilimitado, ao candidato vitorioso. Governo e Estado são indiferentes à nossa indiferença, aos nossos protestos individuais.
É compreensível uma pessoa não gostar de ópera, de jiló ou da cor marrom. E mesmo de política. Impossível é ignorar que todos os aspectos de nossa existência, do primeiro respiro ao último suspiro, têm a ver com política.
A classe social em que cada um de nós nasceu decorre da política vigente no país. Houvesse menos injustiça e mais distribuição da riqueza, ninguém nasceria entre a miséria e a pobreza. Como nenhum de nós escolheu a família e a classe social em que veio a este mundo, somos todos filhos da loteria biológica. O que não deveria ser considerado privilégio por quem nasceu nas classes média e rica, e sim dívida social para com aqueles que não tiveram a mesma sorte.
Somos ministeriados do nascimento à morte. Ao nascer, o registro segue para o Ministério da Justiça. Vacinados, ao da Saúde; ao ingressar na escola, ao da Educação; ao arranjar emprego, ao do Trabalho; ao tirar habilitação, ao das Cidades; ao aposentar-se, ao da Previdência Social; ao morrer, retorna-se ao Ministério da Justiça. E nossas condições de vida, como renda e alimentação, dependem dos ministérios da Fazenda e do Planejamento.
Em tudo há política. Para o bem ou para o mal.
O Brasil é o resultado das eleições de outubro. Para melhor ou para pior. E os que o governam são escolhidos pelo voto de cada eleitor.
Faça como o Estado: deixe de lado a emoção e pense com a razão. As instituições públicas são movidas por políticos e pessoas indicadas por eles. Todos os funcionários são nossos empregados. A nós devem prestar contas. Temos o direito de cobrar, exigir, reivindicar, e eles o dever de responder às nossas expectativas.
A autoridade é a sociedade civil. Exerça-a. Não dê seu voto a corruptos nem se deixe enganar pela propaganda eleitoral. Vote no futuro melhor de seu município. Vote na justiça social, na qualidade de vida da população, na cidadania plena.
Frei Betto é frade dominicano, escritor, assessor de movimentos sociais e autor de Calendário do Poder (Rocco), entre outros livros.