terça-feira, 17 de abril de 2012

2012: O Ano da Energia Sustentável


As Nações Unidas elegeu 2012 O Ano da Energia Sustentável Para Todos. No Brasil, a bola da vez é a energia eólica, que desde 2010 vem ampliando seu peso na matriz energética graças em boa parte ao investimento de grupos estrangeiros que aportaram no país após a crise na Europa e nos EUA. A meta do Governo Federal é mais do que duplicar a participação desse tipo de fonte dos atuais 1,1% para 2,3% até o fim do ano. Parece pouco, mas é um grande avanço pela rapidez da evolução. A energia eólica começou a ser utilizada no país em 2004, e a perspectiva do Ministério de Minas e Energia é que até 2020 ela responda por 6,7% do total produzido.
Para o engenheiro mecânico Everaldo Feitosa, vice-presidente da Associação Mundial de Energia Eólica e presidente da Eólica Tecnologia, a perspectiva do governo ainda é tímida. Ele acredita que até 2020, a energia eólica possa representar 10% da matriz: “A energia eólica é hoje a fonte mais barata no Brasil. Não tem sentido a contratação de outra mais cara, o que geraria ônus para a população, por isso a tendência é a contratação desse tipo de fonte limpa”.
Feitosa ressalta que uma conjunção de fatores naturais e econômicos tem estimulado o crescimento da participação da energia eólica no Brasil. O país, lembra ele, tem excelentes jazidas de vento e complementaridade entre o regime de vento e de água: os meses de secas nos rios são os que têm os melhores ventos. “Esses dois fatores são presentes divinos que nós tivemos”, ressalta.
As jazidas de vento, de acordo com Feitosa, estão concentradas basicamente em cerca de 70% nos estados do Nordeste e 30% no Sul. Mas, como o sistema brasileiro é integrado, uma central eólica contribui para a geração de energia para todo o país. A chefe do Laboratório de Energia Eólica da Faculdade de Engenharia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Mila Avelino, explica que a implantação dos parques eólicos apresenta vantagens com relação à distribuição de energia: “A região costeira, além da vantagem de estar mais próxima dos centros de consumo e dos fornecedores de equipamentos, é favorecida, em termos de logística de distribuição de energia, pela infraestrutura disponível”.
Além da contribuição da natureza, a economia também deu uma força para que o Brasil passasse a investir mais na energia eólica: câmbio favorável, incentivos fiscais e a crise internacional foram fatores que ajudaram a estimular o mercado de energias renováveis, que há dez anos buscava decolar no país.
“Todo mundo falava que energia eólica era cara. Com a crise financeira no exterior, os custos de equipamentos diminuíram muito, principalmente o de turbinas eólicas. Assim, foi possível fazer com que a energia eólica competisse com todas as outras matrizes em termos de custo de geração de energia. E sem qualquer subsídio. Até mesmo em nível mundial, o preço da energia eólica no Brasil é o menor do planeta: cerca de R$ 100 por megawatts/hora (MWh)”, ressalta Feitosa.
Atualmente, existem cerca de 5.300 MW (megawatts) em projetos eólicos autorizados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Mila acredita que a instalação, nos próximos anos, de cerca de 7 GW (gigawatts) de potência nova já contratada, aumente ainda mais o interesse de fabricantes e representantes de empresas estrangeiras especializadas em energia eólica em investir no Brasil: “Em uma década, temos potencial para virmos a ser o principal mercado de energia eólica da América Latina, com cerca de 30 GW de capacidade instalada”.
No início do mês, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aprovou financiamento de R$ 389 milhões para a construção de cinco parques eólicos na região Nordeste: quatro no Rio Grande do Norte e um na Bahia. Os projetos foram vencedores do Leilão de Fontes Alternativas de 2010 e integram o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Segundo o BNDES, os investimentos do país em energia eólica atingiram, no ano passado, R$ 5,1 bilhões, sendo R$ 3,4 bilhões de financiamentos do banco.
A exigência do BNDES, para aprovar um financiamento, de que 60% dos materiais sejam fabricados no Brasil forçou empresas estrangeiras fabricantes de turbinas eólicas a instalarem indústrias no país, o que têm promovido também um desenvolvimento industrial e tecnológico.
“Os países que mais fazem promoção de energia limpa são os mais poluentes. Na Alemanha, por exemplo, 60% da matriz é carvão, já na Espanha 65% são combustíveis fosseis. Existiu na ultima década muita propaganda, mas todos têm uma matriz muito suja. O único país altamente limpo era, foi e será o Brasil”, aposta Feitosa.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Papai sabe tudo


Lúcia Guimarães - O Estado de S.Paulo
Querida, cheguei!
Robert Young, quer dizer, Papai, bate à porta do reluzente Mercury Monterey e atravessa o portão da cerca de estacas brancas. Jane Wyatt, quer dizer, Mamãe, sorri em seu uniforme caseiro, saia ampla escondida por um avental.
Na próxima meia hora, a claque de risadas vai interromper previsivelmente as one liners, as frases curtas de sitcoms, entre Papai, Mamãe e os filhos Betty, James e Kathy.
A colunista entrou em regressão profunda, há de suspeitar o leitor.
Já respondo: assista ao mais recente bate-boca político americano pela TV e seja tomado por uma estranha sensação de que escorregou, como a Alice de Lewis Carroll, numa toca de coelho e caiu de volta à década de 50. Não os anos 50 reais, assombrados pela aniquilação nuclear, a década que gestou a revolução sexual, os direitos civis e a era digital, mas a utopia do idílio doméstico apresentada por Hollywood.
Na semana passada, Hilary Rosen, estrategista política ligada ao Partido Democrata - mas não à campanha de reeleição de Barack Obama -, fez o seguinte comentário sobre a mulher de Mitt Romney, durante um debate ao vivo na CNN: "Ann Romney nunca trabalhou um dia na sua vida".
A reação partiu de Barack e Michelle aos pit bulls falantes empregados por Rupert Murdoch e foi comparável ao peso de cinco agentes do serviço secreto pulando em cima de um homem armado que se aproximasse do presidente num comício.
Em menos de 24 horas, Rosen se desculpou no novo templo da genuflexão politicamente correta, o Twitter: Peço muitas desculpas para as mães que trabalham em casa, a Senhora Romney e o Presidente. Tradução: reconheço que criar filhos e cuidar da casa é um trabalho, não quis insultar Ann Romney e, mais do que tudo, não quero erodir a enorme vantagem de Barack Obama com o eleitorado feminino.
Ann Romney, que criou cinco filhos e exerceu intermitentes atividades não remuneradas como voluntária de ONGs, foi à Fox faturar a gafe e ninguém questionou sua reação: "Minha escolha de carreira foi ser mãe". A passividade geral diante dessa declaração, depois de quatro anos da pior recessão desde a década de 30, já é notável. Mas ela veio da mulher de um proeminente membro da Igreja Mórmon que acumulou uma fortuna avaliada em US$ 250 milhões.
Não pude perguntar à minha mãe por que ela nunca se empregou em lugar nenhum, apesar da modesta renda do meu pai, que, mesmo aos 60 anos, chegou a se equilibrar por três empregos. Como minha chegada foi uma surpresa, depois dos 40, ela eventualmente arrastava sua quinta criança não planejada para um orfanato no bairro carioca do Rio Comprido, onde contribuía como voluntária. E, para horror de futuros psicólogos, ainda dizia: é bom você entender desde cedo como vivem os destituídos.
Vi a minha mãe pela última vez quando ela, com 48 anos, partiu na ambulância para um hospital público de onde nunca haveria de sair. Tenho ainda a memória clara de sua inquietação com as horas consumidas por preocupações mundanas, exilada do mundo de satisfação profissional do meu pai. "Ela era muito inteligente", dizia um tio, como se quisesse me tranquilizar sobre um risco para a condição feminina.
A falsa divisão alimentada pela superficialidade do debate político nos Estados Unidos não é entre a mulher que escolhe cuidar dos filhos e a desalmada que passa o dia afagando seu ego no escritório. A divisão não é entre a dureza do trabalho doméstico e o trabalho remunerado. A esmagadora maioria das mulheres, americanas ou brasileiras, não tem a escolha da "carreira de ser mãe", nem como arranjo temporário. Elas se separam de seus filhos bem antes do que gostariam.
Hilary Rosen começou o comentário indelicado, mas longe de ser infame, explicando que Mitt Romney andava pelos comícios dizendo: "Minha mulher me conta que as mulheres estão preocupadas com questões econômicas". Minha mulher me conta?
O refrão da sitcom americana de outrora era Margaret, a Mamãe, ser de fato o repositório de sensatez e sabedoria. Nesta campanha presidencial, Mamãe e Papai moram num set de filmagem, onde opiniões se fazem passar por fatos.

O otimismo da jabuticaba


OSÉ ROBERTO DE TOLEDO - O Estado de S.Paulo
O brasileiro é antes de tudo um otimista. Ele acredita que as coisas vão melhorar, sempre. Se estão ruins, ele aposta na virada. Se já estão boas, ele crê que vão melhorar ainda mais. Essa característica se acentuou nos últimos tempos, fruto da percepção da maioria da população de que andou para frente. O otimismo é, portanto, uma projeção do passado recente. Mas não precisávamos exagerar.
Segundo pesquisa do Gallup, o Brasil é onde há proporcionalmente menos pessoas "sofrendo" no mundo. A sondagem foi feita em 146 países, ao longo de 2011. Juntos, eles representam mais de 95% da população mundial. Computadas as dezenas de milhares de entrevistas, o instituto concluiu que só no Brasil menos de 1% da população se enquadra na categoria "sofrimento".
Para comparar, na média mundial, 13% estão "sofrendo". Em 18 países, pelo menos 1 em 4 habitantes está nessa situação. São aqueles pintados de verde claro no mapa que ilustra este texto. O pior é a Bulgária: 45% da população está "sofrendo".
Se não "sofrem", como estão os brasileiros?
Segundo o Gallup, 59% estão "prosperando", e os demais 41%, "batalhando". O Brasil é o 9º colocado na proporção de "prósperos", empatado com a Áustria. Só perde para Dinamarca (74% "prosperando"), Holanda e Canadá (66% ambos), Israel e Suécia (65%), Austrália e Finlândia (64%) e, por pouco, para a Nova Zelândia (60%).
Segundo o instituto, há proporcionalmente mais brasileiros "prosperando" do que norte-americanos (56%), sul-coreanos (50%), britânicos (50%), franceses (46%), alemães (42%) e japoneses (26%). Todas essas nações aparecem muito à frente do Brasil tanto no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) quanto na renda per capita.
Mesmo em comparação com outros países ditos emergentes o Brasil aparece muito mais bem colocado na pesquisa. Tem 37 pontos porcentuais de "prosperidade" a mais do que a Rússia (22% "prosperando", 58% "batalhando" e 19% "sofrendo), 41 pontos mais do que a China (18%, 70% e 12%, respectivamente) e inacreditáveis 48 pontos a mais do que a Índia (11%, 66% e 24%).
O Brasil é, portanto, um ponto muito fora da curva. O que explica esse resultado literalmente excepcional? O otimismo.
Para compreender o porquê, só entendendo com funciona a metodologia do índice de bem-estar. Um dos maiores institutos do mundo, o Gallup desenvolveu seu indicador a partir da tradicional escala Cantril de auto-avaliação, e o vem usando há décadas.
Pioneiro no estudo da opinião pública, Hadley Cantril desenvolveu um método que se tornou referência. Ele permite a cada indivíduo estabelecer sua própria escala de valores sem, todavia, abrir mão da capacidade de compará-las. A "escada de Cantril" também elimina o viés provocado pelas diferenças de significado que o mesmo conceito tem para diferentes pessoas, ou que uma expressão tem em diferentes idiomas.
Escala. O grau de "sofrimento" no indicador de bem-estar do Gallup não é fruto de uma pergunta direta do entrevistador, mas de uma combinação de resultados. O entrevistado é convidado a imaginar uma escada de 0 a 10, onde o topo representa a melhor condição de vida possível, e o zero, a pior. Em seguida, o pesquisador pergunta em qual degrau o entrevistado se encontra e em qual ele estará daqui a cinco anos.
A divisão em três grupos ("prosperando", "batalhando" e "sofrendo") é obtida pela combinação das respostas. Para entrar no grupo da "prosperidade", o entrevistado tem que estar hoje no degrau 7 ou acima dele, mas não só. Ele tem também que enxergar um futuro melhor, ou seja, deve projetar estar no mínimo no degrau 8 daqui a cinco anos. Já para cair no grupo "sofrendo", o entrevistado tem que se ver em má situação hoje (degrau 4 ou inferior) e achar que o futuro permanecerá ruim (abaixo do 5º degrau). Quem não se encaixa em nenhuma dessas categorias está "batalhando".
Os 59% de brasileiros classificados pelo Gallup como "prosperando" não estão hoje no topo da escada, nem a um passo de chegar lá. Estão concentrados entre o 7º e o 8º degraus. Porém, quando indagada onde estará daqui a cinco anos, a grande maioria afirma que chegará ao último degrau, ou seja, à melhor condição de vida que podem imaginar.
Mesmo aqueles brasileiros que estão abaixo do 7º degrau acham que chegarão, no futuro próximo, ao topo da escada, ou muito perto disso. Quase ninguém acha que está mal (abaixo do 5º degrau) e vai continuar assim ou piorar. Por isso menos de 1% est "sofrendo". Essa auto-avaliação otimista dos brasileiros é exagerada? Só o futuro dirá. Mas certamente é uma jabuticaba. Só tem aqui.