segunda-feira, 16 de abril de 2012

O otimismo da jabuticaba


OSÉ ROBERTO DE TOLEDO - O Estado de S.Paulo
O brasileiro é antes de tudo um otimista. Ele acredita que as coisas vão melhorar, sempre. Se estão ruins, ele aposta na virada. Se já estão boas, ele crê que vão melhorar ainda mais. Essa característica se acentuou nos últimos tempos, fruto da percepção da maioria da população de que andou para frente. O otimismo é, portanto, uma projeção do passado recente. Mas não precisávamos exagerar.
Segundo pesquisa do Gallup, o Brasil é onde há proporcionalmente menos pessoas "sofrendo" no mundo. A sondagem foi feita em 146 países, ao longo de 2011. Juntos, eles representam mais de 95% da população mundial. Computadas as dezenas de milhares de entrevistas, o instituto concluiu que só no Brasil menos de 1% da população se enquadra na categoria "sofrimento".
Para comparar, na média mundial, 13% estão "sofrendo". Em 18 países, pelo menos 1 em 4 habitantes está nessa situação. São aqueles pintados de verde claro no mapa que ilustra este texto. O pior é a Bulgária: 45% da população está "sofrendo".
Se não "sofrem", como estão os brasileiros?
Segundo o Gallup, 59% estão "prosperando", e os demais 41%, "batalhando". O Brasil é o 9º colocado na proporção de "prósperos", empatado com a Áustria. Só perde para Dinamarca (74% "prosperando"), Holanda e Canadá (66% ambos), Israel e Suécia (65%), Austrália e Finlândia (64%) e, por pouco, para a Nova Zelândia (60%).
Segundo o instituto, há proporcionalmente mais brasileiros "prosperando" do que norte-americanos (56%), sul-coreanos (50%), britânicos (50%), franceses (46%), alemães (42%) e japoneses (26%). Todas essas nações aparecem muito à frente do Brasil tanto no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) quanto na renda per capita.
Mesmo em comparação com outros países ditos emergentes o Brasil aparece muito mais bem colocado na pesquisa. Tem 37 pontos porcentuais de "prosperidade" a mais do que a Rússia (22% "prosperando", 58% "batalhando" e 19% "sofrendo), 41 pontos mais do que a China (18%, 70% e 12%, respectivamente) e inacreditáveis 48 pontos a mais do que a Índia (11%, 66% e 24%).
O Brasil é, portanto, um ponto muito fora da curva. O que explica esse resultado literalmente excepcional? O otimismo.
Para compreender o porquê, só entendendo com funciona a metodologia do índice de bem-estar. Um dos maiores institutos do mundo, o Gallup desenvolveu seu indicador a partir da tradicional escala Cantril de auto-avaliação, e o vem usando há décadas.
Pioneiro no estudo da opinião pública, Hadley Cantril desenvolveu um método que se tornou referência. Ele permite a cada indivíduo estabelecer sua própria escala de valores sem, todavia, abrir mão da capacidade de compará-las. A "escada de Cantril" também elimina o viés provocado pelas diferenças de significado que o mesmo conceito tem para diferentes pessoas, ou que uma expressão tem em diferentes idiomas.
Escala. O grau de "sofrimento" no indicador de bem-estar do Gallup não é fruto de uma pergunta direta do entrevistador, mas de uma combinação de resultados. O entrevistado é convidado a imaginar uma escada de 0 a 10, onde o topo representa a melhor condição de vida possível, e o zero, a pior. Em seguida, o pesquisador pergunta em qual degrau o entrevistado se encontra e em qual ele estará daqui a cinco anos.
A divisão em três grupos ("prosperando", "batalhando" e "sofrendo") é obtida pela combinação das respostas. Para entrar no grupo da "prosperidade", o entrevistado tem que estar hoje no degrau 7 ou acima dele, mas não só. Ele tem também que enxergar um futuro melhor, ou seja, deve projetar estar no mínimo no degrau 8 daqui a cinco anos. Já para cair no grupo "sofrendo", o entrevistado tem que se ver em má situação hoje (degrau 4 ou inferior) e achar que o futuro permanecerá ruim (abaixo do 5º degrau). Quem não se encaixa em nenhuma dessas categorias está "batalhando".
Os 59% de brasileiros classificados pelo Gallup como "prosperando" não estão hoje no topo da escada, nem a um passo de chegar lá. Estão concentrados entre o 7º e o 8º degraus. Porém, quando indagada onde estará daqui a cinco anos, a grande maioria afirma que chegará ao último degrau, ou seja, à melhor condição de vida que podem imaginar.
Mesmo aqueles brasileiros que estão abaixo do 7º degrau acham que chegarão, no futuro próximo, ao topo da escada, ou muito perto disso. Quase ninguém acha que está mal (abaixo do 5º degrau) e vai continuar assim ou piorar. Por isso menos de 1% est "sofrendo". Essa auto-avaliação otimista dos brasileiros é exagerada? Só o futuro dirá. Mas certamente é uma jabuticaba. Só tem aqui.

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