segunda-feira, 7 de abril de 2025

O Oscar é nosso, mas ainda estamos aqui sem sala de cinema, FSP

 Filipe Gontijo

Cineasta, é diretor do filme "Capitão Astúcia" e sócio da produtora e distribuidora Papai Pequeno Filmes

"Ainda Estou AquI", vencedor inédito do Oscar de Melhor Filme Internacional, não só colocou nossa cinematografia em um novo patamar, mas também despertou um forte sentimento de orgulho nacional.

Além de se reconhecer nas telas, o brasileiro gosta de ver nossas histórias contadas para o mundo. Se puxar pela memória, você vai lembrar que vivemos algo parecido com "Central do Brasil" (1998), "Cidade de Deus" (2002) e "Tropa de Elite" (2007). Os talentos continuam aqui, e a criatividade também. Então por que os lapsos de tempo entre os sucessos e por que dentro do próprio Brasil nossas produções têm dificuldade para encontrar espaço e público rotineiramente?

O orçamento do filme nacional é menor que o do estrangeiro, mas depois de produzido a desigualdade é ainda maior. Enquanto blockbusters de Hollywood fazem campanhas milionárias e ocupam a maioria das salas de cinema, as produções nacionais precisam disputar, sessão a sessão, sua permanência.

Em 2019, por exemplo, "Vingadores: Ultimato" dominou mais de 2.700 das 3.300 salas do país, deixando pouco espaço para qualquer outra produção. Essa concentração recorrente deixa de fora filmes nacionais com potencial de público, infantis, de ação, terror, suspense, drama… Até filme de herói nós temos por aqui e as pessoas nem ficam sabendo.

Neste ano, uma semana antes do lançamento de "Capitão América", lançamos o brasileiro "Capitão Astúcia", com a veterana Nivea Maria no elenco. Nosso herói protagonista, aos 80 anos de idade, não é tão musculoso quanto o estadunidense, mas o "Capitão Astúcia" vinha de uma carreira de sucesso, com 49 prêmios, críticas positivas de jornalistas e comentários emocionados do público na internet. No final das contas, o "Capitão América" foi lançado em 2.000 salas e o "Capitão Astúcia" exibido em apenas 40. Os conformados consideram uma marca "boa" para a média nacional de um filme independente. Afinal, nessa luta de Davi contra Golias, o público muitas vezes não tem tempo para descobrir e prestigiar as produções nacionais e, quando tenta, descobre que os filmes brasileiros quase sempre são relegados às sessões vespertinas.

Voltando ao duelo entre o "Capitão América" e o "Capitão Astúcia". Enquanto um lida com bombas, chamados do presidente americano e a dominação mundial, o outro interage com o guardador de carro, se aventura em um centrão típico de cidade brasileira e, mesmo derrotado, não desiste de seus sonhos.
Reconhecemos costumes, personagens e nossa realidade na tela. Não precisamos dos US$ 300 milhões da Marvel para fazer um filme competitivo, mas precisamos de espaço, divulgação e tela.

Para além de um tipo de proteção à indústria nacional (como acontece em outros setores), é essencial fortalecer a cota de tela em sua busca por algo fundamental: a promoção do acesso à nossa cultura e a liberdade de escolha do público frente ao monopólio de Hollywood. Com mais opções concorrendo de forma equânime no mercado (com divulgação suficiente e bons horários de exibição), talvez as escolhas do público fossem diferentes.

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