A microbiota intestinal humana, ou "microflora", é composta por uma grande variedade de microrganismos, como bactérias, fungos e vírus, que vivem de forma simbiótica (harmônica e funcional) em nosso trato digestivo.
Ao todo, cerca de 100 trilhões de microrganismos residem no trato gastrointestinal. Estima-se que essa população codifique de 3 a 4 milhões de genes —quase 150 vezes mais genes do que o genoma humano.
A maior parte desses microrganismos são bactérias. Atualmente, cerca de 2.000 espécies já foram identificadas no intestino. Cada indivíduo tem seu próprio padrão de composição e distribuição da microbiota, que se estabelece logo após o nascimento e contribui para o desenvolvimento do sistema imunológico dos recém-nascidos.
Após atingir configuração semelhante à do adulto por volta dos três aos seis anos de idade, ela permanece estável durante toda a vida adulta.
As funções biológicas mais importantes da microbiota adulta estão relacionadas à absorção de nutrientes da dieta, regulação da imunidade e autoimunidade, manutenção da integridade da barreira intestinal, produção de peptídeos antimicrobianos e metabolismo de medicamentos.
Para uma microbiota estável e balanceada (normobiose), são necessários higiene adequada, dieta, exercício, sono, ausência de fumo e de consumo excessivo de álcool, assim como uma exposição limitada a antibióticos, antidepressivos e quimioterápicos.
A presença de um ou mais desses condicionantes pode gerar desequilíbrio da composição da microbiota (disbiose). Nessa situação, perdemos benefícios estruturais, metabólicos e imunológicos, favorecendo o desenvolvimento de uma série de enfermidades que incluem, entre outras, obesidade, doenças inflamatórias intestinais e até mesmo condições neurológicas e câncer.
Dada a importância da "microflora", há, atualmente, grande interesse em compreender fatores ambientais que podem afetar sua composição e função. Um deles é a exposição a agrotóxicos por meio do consumo de água e alimentos contaminados.
Tragicamente, o mercado brasileiro de agrotóxicos se expandiu rápida e assustadoramente na última década, colocando o país em primeiro lugar no ranking mundial de consumo, incluindo de tipos que são proibidos na União Europeia pelos riscos ao meio ambiente e à saúde humana.
Dessa forma, vários estudos revelam efeitos negativos à saúde relacionados a esta exposição —dermatológicos, gastrointestinais, respiratórios, reprodutivos, endócrinos, de crescimento infantil, neurológicos e carcinogênicos.
Com relação à microbiota, o cenário também é preocupante. Agrotóxicos podem perturbar o delicado equilíbrio de sua composição, o que pode levar a um aumento de bactérias patogênicas, como Escherichia coli, Salmonella, Clostridium difficile, e à redução de bactérias benéficas, como Bifidobacterium, Lactobacillus e Bacteroides.
As alterações podem acarretar graves consequências para a saúde, com consequências para resposta imunológica, metabolismo, saúde reprodutiva (fertilidade feminina e masculina) e eixo intestino-microbiota-cérebro.
Este último refere-se à comunicação entre intestino e cérebro, que envolve os sistemas nervoso, imunológico, endócrino e, obviamente, a microbiota intestinal.
Nesse contexto, diversos estudos demonstram com clareza que os agrotóxicos, ao perturbar a microbiota, são capazes de alterar o eixo em questão, e, como consequência, promover várias alterações metabólicas, inflamatórias, neurais e clínicas.
É vital a implementação de estratégias eficazes para minimizar a exposição humana a estas substâncias. Isso deve incluir promoção de dietas orgânicas, melhora das práticas de lavagem e preparação de alimentos e aumento da conscientização pública sobre os riscos à saúde associados aos agrotóxicos.
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