quarta-feira, 2 de abril de 2025

Le Pen foi finalmente condenada, e eu estou saboreando cada momento, Rui Tavares, FSP

 Fui colega de Marine Le Pen, de seu pai, Jean-Marie Le Pen, do defensor do brexit Nigel Farage e de muitos outros ídolos da ultradireita europeia durante cinco anos, entre 2009 e 2014, quando fui deputado no Parlamento Europeu.

Não que eu os visse muito. Em geral, esses deputados eurofóbicos não punham os pés nas comissões parlamentares, que ocupam grande parte do trabalho em Bruxelas. Apenas uma vez por mês era certo que se dignariam a aparecer, quando o Parlamento Europeu se desloca para Estrasburgo, na França, e o excesso de faltas pode dar origem à perda de mandato.

A imagem mostra uma mulher sentada em um ambiente legislativo, com as mãos apoiadas no queixo, aparentando estar pensativa. Ela tem cabelo loiro e usa uma blusa escura. Ao fundo, é possível ver outras pessoas e assentos vermelhos.
A líder de ultradireita francesa e membro do parlamento, Marine Le Pen, durante sessão na Assembleia Nacional em Paris, França - Gonzalo Fuentes/1.abr.25/Reuters

Mesmo aí, tirando um ou outro discurso, pai e filha Le Pen eram mais vistos à hora do almoço no restaurante dos deputados. Não me lembro de uma iniciativa legislativa, de um relatório, de nem uma emenda sequer que tenha melhorado a vida de quem quer que seja. Não era para isso que eles lá estavam.

Estavam para quê, então? Para ganhar dinheiro, dar dinheiro a ganhar, e fazer política partidária o tempo inteiro. Como é evidente, dado o que contei atrás, não seria difícil adivinhar que os assessores pagos com dinheiro do contribuinte europeu não teriam grande coisa para fazer ao serviço do Parlamento Europeu. Mas como os fundos de apoio à contratação eram gastos, e os assessores eram contratados, fácil também foi para os serviços do Parlamento Europeu chegarem à conclusão de que o dinheiro estaria a ser gasto para uso partidário, enriquecimento pessoal, ou ambos —o que é proibido pelo direito europeu.

Marine Le Pen foi avisada várias vezes e continuou rindo na cara da lei. O problema é que a lei francesa mudou, e no sentido que Marine defendia: a inelegibilidade automática dos políticos culpados de desvio de fundos no desempenho do seu cargo. Foi aí que ela deixou de rir e tentou antes uma estratégia de bloqueio e protelamento dos tribunais —até a última segunda-feira (31), quando foi finalmente condenada, após nove anos de julgamento com todas as garantias de defesa, a cinco anos de inelegibilidade.

Os pruridos que esta decisão provoca a algumas almas sensíveis não são compreensíveis. Marine Le Pen violou a lei conscientemente, desviou mais de US$ 4 milhões durante vários anos e persistiu depois de avisada. Pelo próprio critério que defendia, que era o de aplicar a inelegibilidade vitalícia, a pena foi até suave.

A questão mais interessante não está, no entanto, aí, mas antes no fato de que é a democracia europeia que tornou possível a carreira desses políticos que a querem destruir.

É sabido que uma das principais críticas que políticos como Le Pen fazem à União Europeia é da sua falta de democracia, em comparação com a democracia nos Estados-nação. Mas na França, durante muito tempo, o sistema eleitoral não permitia aos Le Pen chegar ao Parlamento francês, como Farage não conseguia chegar ao britânico.

Foi graças ao Parlamento Europeu e ao seu sistema proporcional que eles conseguiram chegar a ser "revolucionários profissionais" em tempo integral. Agora é uma lei nacional que interrompe a sua carreira. É uma bela ironia, e eu estou saboreando cada momento.

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