Rejeição a Crivella representa o fracasso da Igreja Universal na administração pública
Um dos charmes do thriller "O Terceiro Homem", a famosa colaboração do diretor Carol Reed com o escritor Graham Greene, com pitacos no roteiro do ator Orson Welles, é a técnica de desvelamentos sucessivos em torno do personagem Harry Lime. Tendo como cenário a decadente atmosfera da Viena do pós-Guerra, o filme mostra aos poucos que Harry (ou Welles, que o interpreta), o sujeito espirituoso que sabe contar histórias sobre relógios cucos, no fundo é mau como um pica-pau. Seu negócio era o mercado negro da penicilina roubada de hospitais.
Ao saber de um pequeno drama dentro da tragédia maior em que se transformou a crise da saúde no Rio, lembrei do simpático Harry Lime. Um filho pagou R$ 50 para conseguir uma maca em que sua mãe em busca de atendimento pudesse deitar um pouco e descansar nos corredores do hospital Salgado Filho.
Marcello Crivella, cujo slogan de campanha era "Chegou a hora de cuidar das pessoas", disse que a crise "é falsa". O Ministério Público não concordou e pediu exatamente para que se instalasse um gabinete de crise, a fim de gerir a rede municipal, depois que funcionários de hospitais e clínicas, alegando que ficaram 90 dias sem receber salários, paralisaram os serviços.
Quase de joelhos, Crivella pediu misericórdia ao seu aliado de ocasião, Bolsonaro, que prometeu R$ 150 milhões para quitar os atrasos e aproveitou para tirar um sarro: "Ele está com a corda no pescoço".
A estimativa do MP é que a prefeitura deixou de investir R$ 2,3 bilhões na saúde. Mas, entre 2017 e 2019, aumentou os gastos com propaganda em 50%. Crivella só se interessa em cuidar dele mesmo e dos interesses que representa. Não se reeleger --o mais provável, já que 72% dos cariocas consideram sua gestão ruim ou péssima, segundo pesquisa do Datafolha-- revela o fracasso da Igreja Universal na administração pública.
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