Recomeço. Bunge, Cargill, Maggi e Dreyfus, responsáveis por 70% das exportações de grãos no País, formam empresa para disputar os leilões de ferrovias e propõem ao governo mudanças nas linhas férreas que serão oferecidas como concessão federal
23 de março de 2014 | 2h 04
LU AIKO OTTA / BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo
Quatro gigantes do agronegócio - Bunge, Cargill, Maggi e Dreyfus - mais a estruturadora de negócios Estação da Luz Participações (EDLP) pretendem se associar para criar uma empresa de logística que participará dos leilões de concessão de ferrovias. Juntas, elas respondem por 70% das exportações de grãos do País.
Essas empresas estão dispostas a construir e operar novas linhas em Mato Grosso. O alvo principal da sociedade, porém, é atuar como transportadora independente de carga ferroviária. É uma figura que não existe hoje no Brasil, mas será criada com base no novo modelo para ferrovias proposto pelo governo.
O plano foi informado na terça-feira ao ministro dos Transportes, César Borges. Deverá ser detalhado nos próximos dias à presidente Dilma Rousseff, que já estava informada das linhas gerais dos estudos. "As empresas se comprometem a serem líderes no processo", afirmou o senador licenciado Blairo Maggi (PR-MT).
Com o plano da nova empresa, o grupo apresentou a Borges uma proposta de mudança nas linhas que serão oferecidas como concessão federal em Mato Grosso. O projeto, batizado de Pirarara, prevê investimentos de R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões. Pirarara é um peixe que pode atingir 60 quilos e 1,5 metro, encontrado nos Rios Amazonas, Tocantins e Araguaia.
Atualmente, o programa federal prevê a concessão de apenas um ramal no Estado, um trecho da Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico), de 883 km, saindo de Lucas do Rio Verde e seguindo rumo ao leste até Campinorte (GO), onde se interligará com a Ferrovia Norte-Sul. De lá, a carga seguirá para o mar pelo Porto de Itaqui (MA).
Após estudar 40 mil rotas de escoamento de grãos no País, o grupo concluiu que o ideal seria encurtar a linha em 500 km. Ela começaria mais a leste, em Água Boa, e terminaria em Campinorte. Esse ramal reduzido está sendo chamado de "Fico Leste".
Por outro lado, seriam criadas duas ferrovias. A principal sairia do centro de Mato Grosso, em Sinop, e seguiria por 1.000 km até o porto de Miritituba, no Rio Tapajós, no Pará. Lá, a carga seguiria por mais 1.000 km de hidrovia para ser exportada pelos portos ao norte, como Vila do Conde e Santarém.
Essa linha, batizada de Ferrovia do Grão ou Ferrogrão, seria o canal de saída para metade da produção de soja, milho e farelo de Mato Grosso, que deverá atingir 50 milhões de toneladas em 2020. Hoje, ela é de 30 milhões de toneladas. Por causa da posição estratégica, Itaituba, da qual Miritituba é um distrito, já conta com praticamente todas as grandes empresas do agronegócio.
Um terceiro ramal sairia do oeste de Sapezal (MT) e seguiria para Porto Velho (RO), às margens do Madeira. O trajeto faz parte de antigos estudos da Fico, por isso é chamado de "Fico Oeste". De lá, a carga iria por rio até o Porto de Itacoatiara (AM) ou para os portos do Pará.
Economia. Maggi explicou que o grupo não é contra a Fico tal como está proposta pelo governo. Porém, os estudos indicaram que a melhor solução é diferente da que vem sendo analisada e era praticamente um consenso entre os interessados. Grande empresário do setor e ex-governador de Mato Grosso, ele se confessou surpreso com as conclusões.
"Em relação à situação que temos hoje, o frete ficaria mais barato em R$ 40 por tonelada", disse o presidente da EDLP, Guilherme Quintella. Coube a ele, que é chairman para a América Latina da União Internacional de Ferrovias, elaborar os estudos. Construídos os três ramais, 98% da produção de soja, milho e farelo do Estado sairiam por ferrovia.
O grupo pediu a Borges que abra Processos de Manifestação de Interesse (PMIs) para as três linhas sugeridas. Essa é a forma pela qual o governo vem contratando estudos econômicos e projetos de engenharia, depois que o virtual monopólio da Estruturadora Brasileira de Projetos (EBP) foi questionado pelo Tribunal de Contas da União.
Proposta das empresas é alívio para o governo
23 de março de 2014 | 2h 05
O Estado de S.Paulo
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CENÁRIO: Lu Aiko Otta
Confrontada com a desconfiança com que o empresariado vinha encarando as concessões em ferrovias desde o lançamento do Programa de Investimentos em Logística (PIL), em agosto de 2012, a proposta dos pesos pesados do agronegócio é um alívio para o governo. O que eles colocaram sobre a mesa do ministro dos Transportes, César Borges, não é só um volume que supera os R$ 10 bilhões em investimentos. É um plano que vai desafogar um dos pontos mais críticos da logística brasileira no momento, o escoamento da safra agrícola no Centro-Oeste.
É essa a produção que congestiona rodovias e o Porto de Santos (SP) na época da colheita. E a proposta direciona a carga para o Norte, uma correção estratégica há muito tempo recomendada por especialistas em logística. Para isso, utiliza ferrovias e hidrovias, cujo frete é mais barato do que o rodoviário.
Para o agronegócio, essa era uma opção que teria de ser tomada em algum momento, dado o peso do custo de transporte no preço final. Logo após o lançamento do PIL, um executivo do setor confessou ao 'Estado' que sua empresa não estava interessada em construir ferrovias. Mas, se não houvesse interessados, teria de entrar no negócio. É o que está prestes a acontecer.
Dessa forma, fica reduzido o risco de outro leilão "vazio", sem pretendentes, tal como o que ocorreu na estreia das concessões rodoviárias, com a BR-262 no Espírito Santo e em Minas Gerais, em setembro.
No ano passado, Borges, a então ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, e a própria presidente Dilma Rousseff procuraram candidatos a concessionários em ferrovias, como tradings, empresas do agronegócio, construtoras e investidores internacionais, para "vender" o programa. Além disso, o governo tem procurado acolher todas as sugestões do setor privado no campo financeiro, para garantir o maior número possível de participantes nos leilões.
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