Jueves 18 de Febrero de 2010 14:56
Foi tempo em que o máximo de Blecaute com que se podia contar no Carnaval era o cantor Otávio Henrique de Oliveira, o de “Chegou o General da Banda, ê, ê”. Agora temos para nos embalar a festa um enredo muito mais imaginoso – o do galho que atravessou o caminho da rede elétrica entre Colinas e Miracema, no Tocantins, conjurando forças ocultas a desligar em série três linhões e engolir 3.600 megawatts no Nordeste, “ê, ê”.
Quem não entendeu muito bem a explicação da empresa só pode estar se embriagando demais com firulas técnicas. Nem os engenheiros eletricistas e outros especialistas na matéria levaram a sério a conversa da Eletronorte. Alegaram que as linhas de transmissão geralmente correm sobre um vasto leito de devastação proposital e sistemática. Logo, se havia árvore sob as torres do Tocantins, o problema não seria o galho sabotador, e sim o descuido das rotinas de manutenção.
Daí para insinuar que há qualquer coisa bruxuleando no sistema que gerou a fama da administradora Dilma Rousseff no ministério das Minas e Energia, e agora alimenta sua candidatura à presidência da República, era um pulo. Mas no Carnaval só se pula por bons motivos. A hora é de reconhecer que a história da Eletronorte acertou em cheio no quesito alegoria. Culpar a árvore foi um achado sociológico.
As árvores, no Brasil, são as suspeitas de sempre, como diria o capitão Louis Renault, se isto aqui fosse Casablanca. O país está sempre pronto a acreditar que as árvores. mais cedo ou mais tarde, vão lhe aprontar alguma, quebrando calçadas, sujando jardins com folhas mortas, manchando de flores a pintura dos carros e, claro, caindo nos fios para provocar pequenos apagões – porque os grandes só as operadoras do sistema sabem fazer.
A má-vontade é tanta, tamanha e tão basta que o brasileiro típico “quase não sabe os nomes das árvores, das palmeiras, das plantas nativas da região em que vive”, segundo o sociólogo Gilberto Freyre, como sempre traduzindo as excentricidades nacionais para o melhor português possível. Certa vez, lá vão quase 90 anos, ele comparou os alarmes contra o desmatamento a “gritos carnavalescos”, que se ouvem como convites a não fazer nada.
A nota da Eletronorte, como um todo samba-enredo que se preza, enrolou-se num mito popular e consagrado, desde que os primeiros povoadores acreditavam que atrás de cada tronco havia índios para atacar suas aldeias, feras para comer seu gado ou doenças tropicais para derrubá-los definitivamente nas redes em que seriam enterrados.
Os europeus que vieram ao Brasil no século XIX estranharam a deliberada aridez das cidades brasileiras, com a selva dando sopa tão perto de seus subúrbios. O sol batia em cheio sobre suas ruas sem calçamento, porque à sombra de toda copa haveria perigos inomináveis. Por essas e outras, “limpar” ainda é o nome que se dá no país a qualquer obra de motosserra. E tudo indica que é o que, passado o carnaval, vai acontecer no Tocantins.
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