A repórter Beatriz Bulla revelou que deve chegar ao Brasil no próximo domingo Jason Miller, ex-porta-voz de Donald Trump. Vem divulgar sua rede social Gettr, criada para contornar a expulsão de Trump das grandes plataformas americanas. A Gettr tem 250 mil brasileiros listados. Entre eles estão Jair Bolsonaro e dois de seus filhos.
Miller foi uma testemunha privilegiada da ruinosa insurreição de 6 de janeiro, quando Trump tentou melar o resultado da eleição americana. Para quem viu o desfile do pelotão da fumaça em frente ao Palácio do Planalto na semana passada, o golpe de Trump era muito mais delirante.
À tarde, o vice-presidente Mike Pence presidiria a reunião do Senado que sacramentaria a eleição de Joe Biden.
Às 8h, Trump sabia que tinha milhares de seguidores em Washington e falou com Jason Miller. Esperava que Pence aceitasse as objeções dos republicanos e revertesse o resultado: “Faça isso, Mike. Esta é a hora da coragem”, tuitou.
Pouco depois, Trump ligou para Pence, mas o vice disse que não tinha poderes para tanto. Seu papel seria apenas cerimonial. “Você não tem coragem” respondeu Trump. Ele tinha um plano e foi para um comício perto da Casa Branca.
Por volta de 12h30, enquanto Trump discursava incitando a multidão, Pence soltou uma nota oficial informando que não reverteria o resultado da eleição. Às 12h58 começava a invasão da área do Capitólio.
Às 14h12 a multidão estava nos corredores. Alguns gritavam “Enforquem Pence”. O vice-presidente e os senadores foram retirados do plenário, e o vice foi levado para um lugar seguro. Trump tuitava: “Mike Pence não teve a coragem de fazer o que devia ser feito”.
Estava enganado. Agentes de segurança queriam levar Pence para uma base aérea, mas ele decidiu ficar no prédio. Às 16h, o vice-presidente telefonou para o secretário de Defesa informando que pretendia retomar os trabalhos e queria que o Capitólio estivesse livre dos invasores: “Mande a tropa, mande logo”.
Entre o instante em que Pence deixou o plenário do Senado e as 20h, quando voltou para sua cadeira, a insurreição estava contida. Passaram-se seis horas, durante as quais as instituições democráticas americanas foram postas à prova.
Donald Trump passou a maior parte do tempo grudado nas televisões. Com o tempo vai-se saber quem ligou para quem, dizendo o quê.
Às 21h, quando Pence já havia recomeçado a sessão que confirmaria a vitória de Joe Biden, Jason Miller começou a redigir uma nota na qual Donald Trump aceitava que se procedesse a uma “transição ordeira”.
Reconhecia a necessidade da transição, o que não significava que reconhecesse o resultado da eleição. Fosse qual fosse o plano que Donald Trump tinha na cabeça, estava acabado.
Durante as seis horas de caos em Washington, Bolsonaro pôs suas fichas no cavalo errado.
Ele disse o seguinte: “Eu acompanhei tudo hoje. Você sabe que sou ligado ao Trump. Então, você sabe qual a minha resposta aqui. Agora, muita denúncia de fraude, muita denúncia de fraude. Eu falei isso um tempo atrás e a imprensa falou: ‘Sem provas, presidente Bolsonaro falou que foi fraudada as eleições americanas”.
Poucas vezes houve tamanha afinidade entre um presidente brasileiro e seu colega americano. Quando Bolsonaro disse que “sou ligado ao Trump”, apontava para uma conexão que vai além da simpatia.
Trump disse que o vírus foi uma criação chinesa. Bolsonaro também. (Fazendo-se justiça a Trump, ele só saiu com essa patranha depois que os chineses disseram que o vírus havia sido espalhado pelos americanos.)
Por mais delirante que Trump tenha sido em sua conduta durante a pandemia, não há vestígio de picaretas agindo com relativo sucesso na burocracia da saúde pública americana.
Trump encrencou com seu vice. Bolsonaro também.
Trump quis militarizar o feriado de 4 de julho nos Estados Unidos botando tanques nos jardins da Casa Branca. Bolsonaro desfilou blindados fumacentos diante do Planalto.