quarta-feira, 11 de agosto de 2021

Série “Borgen” revela uma Dinamarca complexa e mais parecida com o mundo, R7

 A atriz Sidse Babett Knudsen tem atuação impecável como a doce mas realista primeira-ministra Birgitte Nyborg

Birgitte Nyborg e sua família | Foto: Divulgação

Os países escandinavos, como Dinamarca, Suécia e Noruega, são vistos como exemplos para o mundo — dado o fato de, embora capitalistas de matiz socialdemocrata, suas sociedades serem mais igualitárias. O que a série “Borgen” — em exibição na Netflix, na terceira temporada (a quarta será em 2022) — mostra é a complexidade da sociedade e da política da Dinamarca. O país é mais multifacetado do que parece à primeira vista e a série disseca isto muito bem.

“Borgen” (Castelo, como os dinamarqueses chamam o Parlamento) é a história da primeira-ministra Birgitte Nyborg (personificada pela atriz Sidse Babett Knudsen).

Ao assumir o governo, Birgitte Nyborg, por não ter muita experiência política, precisa do aconselhamento de aliados, como o jornalista Kasper Juul, e do amigo Bent Sejro. Aos poucos, enfrentando raposas da política e com rara perspicácia, vai se firmando e descobrindo que as principais decisões de um líder — ainda que se possa consultar outras pessoas — são mesmo solitárias.

Lars Knutzon, Sidse Babett Knudsen e Pilou Asbaek | Foto: Divulgação

Birgitte Nyborg ouve as pessoas com atenção, às vezes segue o que postulam, mas, com sua personalidade tão forte quanto perceptiva, toma decisões por conta própria. Ela percebe que, no poder, não se pode fazer tudo e que é muito difícil fazer o bem de maneira ampla. É preciso jogar com as forças contrárias, adaptando as próprias ideias a partir do conflito com projetos diferentes. Ao final, tem de se aceitar um projeto que não se queria, mas que, se não é o melhor, é menos pior do que aquele que outros grupos planejavam impor.

Pelo caminho de um político em ascensão vão ficando aliados, às vezes atropelados pelo realismo do gestor. Devido à política de alianças, o primeiro a ficar para trás é o principal amigo e aliado de Birgitte Nyborg — Bent Sejro. Depois, ao perceber que ainda podia dar uma contribuição, ele é reconvocado. Mas a primeira-ministra agora ouve mais pessoas e formula seu próprio ideário.

Sidse Babett Knudsen e Birgitte Hjort Sorensen: atrizes da série Borgen | Foto: Divulgação

Kasper Juul — que foi abusado sexualmente pelo pai, na infância — é um jornalista que entende como poucos tanto de comunicação quanto de política e também de uma certa “maldade” que cerca o mundo dos governantes e parlamentares. Birgitte Nyborg segue quase tudo o que propõe, mas às vezes segue suas próprias intuições, contrariando o assessor presciente.

Quem também fica pelo caminho, atropelado pelo realismo da primeira-ministra, é Amir Diwan, um muçulmano dinamarquês. Ele é filiado ao Partido Verde e não quer aprovar um projeto de Birgitte Nyborg. Então, a primeira-ministra autoriza Kasper Juul a municiar a imprensa com a história de que o ecologista mantém um automóvel antigo que gasta muito combustível. A reportagem massacra Amir Diwan, que acaba tendo de deixar o partido.

Birgitte Nyborg: primeira-ministra e, depois, executiva | Foto: Divulgação

Ao perceber que havia passado dos limites, Birgitte Nyborg pede “desculpas” a Amir Diwan e admite que foi a responsável pela publicação das reportagens. A primeira-ministra sugere, com seu ato, que as razões de Estado estão acima das razões do indivíduo.

O exercício do poder é ligado ao realismo. Um gestor precisa decidir, e, no mais das vezes, tem de agir rapidamente. Por isso, não há tempo suficiente para pensar nas consequências. Então, a mão pesada pode ser destrutiva.

Se um político, como qualquer ser humano, tem de ser avaliado pela média, e não pelos extremos (pelos extremos têm de ser avaliados ditadores, como Stálin e Hitler), há de se concluir que Birgitte Nyborg é uma grande política e governante, sobretudo porque coloca o bem comum acima das questões privadas e de interesses pessoais e de grupos.

O poder exige muito dos políticos. E, se o governante é uma mulher, o sacrifício acaba por ser maior. Dado o cargo, que exige muito dela, Birgitte Nyborg acaba por ter problemas com o marido, Philipp Christensen (Mikael Birkkjaer).

Birgitte Nyborg: o poder às vezes gera certa solidão | Foto: Divulgação

Philipp é professor de economia e cuida da casa e dos filhos. Mas, a partir de determinado momento, começa a questionar o fato de Birgitte Nyborg quase não parar em casa — a filha começa a ficar deprimida — e arranja um trabalho de CEO numa empresa. Porém, como a empresa tinha negócios com o governo, teve de deixar o cargo. O casal acaba se separando.

Birgitte Nyborg ama Phillip e vice-versa, mas o casamento vai mal. Numa prova de que se tornou uma realista absoluta, a primeira-ministra sugere que o casamento seja mantido e que vai tolerar possíveis casos do marido, que não aprova sua proposta e sai de casa.

Mais tarde, Birgitte Nyborg deixa de ser primeira-ministra e passa a ser consultora, bem-sucedida. Ganha dinheiro e viaja pelo mundo. Ela começa a namorar o inglês Jeremy Welsh (Alastair Mackenzie) e, ao verificar o que novo primeiro-ministro está fazendo — contribuindo para tornar a Dinamarca mais conservadora e fechada a imigrantes —, decide voltar à política.

Numa operação malsucedida, Birgitte Nyborg tenta retomar o comando do partido dos Moderados. Leva uma rasteira e decide criar um novo partido, os Novos Democratas. E assim vai… na sua tentativa de retomar o controle do governo da Dinamarca.

As relações entre a política e o jornalismo na Dinamarca não diferem muito de outros países, como o Brasil. Há relacionamentos moralmente promíscuos. Katrine Fonsmark (Birgitte Hjort Sorensen) é considerada uma repórter ética e idealista. Sua principal fonte é o namorado (depois, marido) Kasper Jull, o assessor de imprensa da primeira-ministra. Noutra temporada, ela mesma passa a assessorar Birgitte Nyborg, agora na oposição, e Kasper Jull se torna apresentador de um programa de televisão, ao lado do diretor-editor Torben Friis.

Há também jornalismo “marrom”, que se preocupa mais com audiência e sensacionalismo do que com a qualidade da informação.

A Dinamarca, que é muito menor do que Goiás e tem menos de 6 milhões de habitantes (o Estado brasileiro tem 7 milhões), é um país com alta qualidade de vida. Mas o que a série mostra é que, no fundo, seus problemas, inclusive os dilemas éticos e ambientais (como excesso de antibióticos na carne de porco), são parecidos com os de quaisquer outros países. Não deixa de ser sintomático que os episódios comecem com citações de Maquiavel e Churchill — dois realistas absolutos.

A atriz Sidse Babett Knudsen faz uma impecável e crível primeira-ministra Birgitte Nyborg. Assim como estão muito bem Birgitte Hjort Sorensen e Pilou Asbaek. Mas é ela quem, com sua atuação precisa, sua diplomacia e seu belo sorriso (às vezes natural), segura a série.

Janaína Paschoal, a superioridade moral e Jesus enquanto coach, Fabiana Moares, The Intercept Brasil

 A distribuição de alimentos na Cracolândia só ajuda o crime. O tema precisa ser debatido com honestidade”.

A FRASE ACIMA foi retirada de um tuíte que a professora da USP e deputada Janaína Paschoal, do PSL de São Paulo, escreveu no último final de semana. Aos seus quase 900 mil seguidores naquela rede, ela reclamava das ações realizadas pelo padre Julio Lancellotti e dezenas de voluntários nas imediações do Parque da Luz, Campos Elíseos e Bom Retiro, em São Paulo. Por ali, circulam todos os dias cerca de 2 mil pessoas (dados da Unifesp e Uniad). Quase todas estão doentes de crack, droga que há três décadas devasta a vida de milhares de famílias. Se você passou o olho pelas redes ou sites de notícias nos últimos três dias, deve ter visto o buruçu que o post da deputada provocou.

Janaína pediu um debate com honestidade. Atendendo ao seu chamado, puxo respeitosamente uma cadeira e me sento à sua frente.

Em primeiro lugar, é importante observar que “honestidade” não é uma qualidade sempre autoatribuída, e dela deriva não só um entendimento sobre nós mesmos, mas ainda daqueles que nos cercam. Também, que a “honestidade” que nos conferimos nunca é engessada e precisa estar aberta ao tempo vivido e aos desafios que ele nos impõe.

Durante décadas, por exemplo, nossos homens “honestos” matavam mulheres alegando “legítima defesa da honra”, tese aceita por centenas de tribunais e que, veja só, reiterava, institucionalmente, a honestidade de assassinos enquanto jogava no lixo a reputação da mulher já sem vida. Hoje, a tal legítima defesa da honra se tornou uma aberração e foi finalmente proibida pelo Supremo Tribunal Federal como argumento em tribunais de júri. O que era honesto há alguns anos hoje não é legal.

‘Ser “patriota” é que nem união civil: se casadas com o Brasil, precisamos estar com ele na alegria e na doença’.

Saio do campo jurídico, mas quero continuar iluminando essa tal honestidade com mais um pouco de ao redor, de vida vivida. Atualmente estamos eu, você, Janaína e milhões de pessoas no Brasil sendo atravessadas por calamidades sobrepostas, como a falta de comida, a falta de moradia, a falta de segurança, a falta de ar. Embora estejamos juntas sob a espada de todas elas, as vivemos de maneiras muito diferentes: nós, a partir de nossos confortáveis apartamentos nos Jardins, em São Paulo, ou no Espinheiro, no Recife, onde moramos. Outros milhões, diretamente a partir da falta de comida, moradia, segurança e ar. Para começar a conversa, é preciso sermos honestas sobre essa obviedade.

Há 5 anos o Intercept faz jornalismo que mexe com as estruturas. Ajude a fazer muito mais.Faça História Com A GenteHá 5 anos o Intercept faz jornalismo que mexe com as estruturas. Ajude a fazer muito mais.

Se queremos “propor uma reflexão” não só sobre o que se passa no centro de São Paulo, mas nas cerca de 29 áreas do país nas quais se concentram usuários e vendedores de crack, precisamos olhar essas ruas ocupadas por pessoas, e não por “zumbis”, e nos responsabilizarmos também por essa falência coletiva. A última deve ser compartilhada da mesma maneira com a qual dividimos, por exemplo, a felicidade pelas conquistas de atletas que acabaram de chegar das Olimpíadas. Vi que a deputada comemorou, como eu, as medalhas trazidas. Mas ser “patriota” é que nem união civil: se casadas com o Brasil, precisamos estar com ele na alegria e na doença.

Convocar um debate com o padre Lancellotti e tantas outras pessoas que realizam ações voltadas para a população em situação de rua requer no mínimo esses pressupostos antes de jogar a pedra, se é da pedra que falamos. Saber o que é esse dia a dia, acompanhar durante algum tempo as ações realizadas, se aprofundar em medidas anteriores e estudos, os erros, os acertos. A deputada joga para o padre a responsabilidade de solucionar problemas públicos em vez de mirar a si mesma e aos colegas eleitos. A sociedade civil, sejamos justas, tem feito muito pela população de rua, muitas vezes mais que o próprio Estado.

Lancelloti-laBWEAAhtoV

Padre Julio Lancellotti foi alvo das críticas da deputada por suas ações junto a população de rua. Foto: Daniel Kfouri

Os dados das citadas Unifesp e Uniad são pré-pandêmicos, de 2019, por isso não alcançam nossa catástrofe atual. Mas, neles, já sabemos que 48,4% dos respondentes que frequentam a desumanamente chamada Cracolândia possuem quadros de automutilação. Quase 60% (exatamente 58,3%) apresentam quadros psicóticos e 46,4% ideias suicidas. Imagine só puxar o banquinho, sentar e tentar convencê-los a procurar abrigo e tratamento, como sugeriu a senhora? Quase 80% dos frequentadores da área estavam sem qualquer atividade remunerada há pelo menos um ano, enquanto 52% não tinham trabalho há cinco. E mais da metade deles (53%) já procurou algum tratamento para parar com as drogas.

Sei que a senhora já esteve à frente da presidência do Conselho Estadual de Entorpecentes de São Paulo, e por isso confesso que me causa surpresa um raciocínio simplista como associar a distribuição de comida a adultos e crianças nas ruas à manutenção do crime. Mais surpresa ainda por se tratar de algo escrito e levado à praça pública justamente em um país detonado pela covid-19, com o segundo maior número de mortes do mundo e com milhões de pessoas lançadas atualmente à indignidade da fome; pessoas sem qualquer condição de ter, agora, um lar. Levantamento da Campanha Despejo Zero mostrou que somente entre março de 2020 e junho de 2021 14 mil famílias foram despejadas de suas casas. A Folha fez uma boa matéria e mostrou relatos de metalúrgicos, domésticas, músicos e entregadores de aplicativos que foram obrigados a ir para a rua.

Uma deputada e ainda docente de uma universidade pública – seja ela em São Paulo, no Recife, em Petrolina, no Recôncavo Baiano ou no Mato Grosso do Sul – tem a obrigação de compreender acima do senso comum a história de um Brasil que inaugura sua maioridade não só através de um pacto de manutenção da escravidão, mas de distribuição profundamente desigual de terras e propriedades.

O assunto é antigo? É sim. Mas ele é tão antigo quanto não resolvido. Se fosse superado, ter um teto nesse país não seria um luxo, principalmente ter um teto em um bairro com esgoto, escola e ônibus na porta. Bairro que não é recusado por questões de segurança quando você pede uma comida ou carro pelo aplicativo, sabe?  Quem escreveu bem a respeito foi o professor José Sacchetta Ramos Mendes, formado em Direito na USP, como a deputada.

No último domingo, Dia dos Pais, enquanto os jornais noticiavam a repercussão do post, ouvi o relato da mãe de uma mulher de 34 anos, três filhos. Na semana passada, a última se juntou aos cerca de 15 milhões de brasileiras e brasileiros desempregados. Trabalhava como doméstica. O filho menor está doente e ela, que vive de aluguel, precisa levá-lo ao médico com certa frequência, o que causou sua demissão. “A patroa disse à minha filha que precisava de alguém mais livre, com menos compromissos”. A esta mãe, que cria sozinha as crianças, resta a tarefa de ser heroína e dar conta do próximo aluguel – se fracassar, o problema é dela. Se seus filhos terminarem nas ruas ou em uma das dezenas de “cracolândias” existentes no país, a “culpa” é deles. Também lembrei de Patrícia e Bianca, irmãs que acompanhei durante algum tempo e que usavam crack há anos. Elas tinham uma casa, cedida pelos governos federal e estadual. Mas sabe o que tinha lá dentro da casa? Um pai que as molestava sexualmente. Elas preferiam a rua e foi lá que a droga as alcançou. Falharam também?

Jesus-e1450967632137

Na foto do Twitter, a deputada exibe uma escultura de Cristo como um escudo.

 

Foto: Reprodução/Twitter

Cristo empreendedor

Há ainda uma questão – ou melhor, um nome – crucial neste debate: Jesus. Reparei que a deputada está atrás de uma escultura de Cristo em sua foto no Twitter. Me fez pensar como, ali, ele serve também como um escudo, um cartão de visitas, uma espécie de senha para que nós estejamos antes de tudo cientes: Janaína é uma pessoa do bem. Mais: Janaína, uma pessoa pública, a deputada mais votada na história do país, 2 milhões de votos, é do bem. Mas espere: o padre, além de acreditar em Cristo, escolheu dedicar-se integralmente a ele. O padre é do bem? Será que um padre assim, meio progressista, pode sê-lo? Será que ele deveria abraçar uma escultura de Cristo e usar a imagem como avatar no Twitter?

Será que existe um Jesus para Paschoal e um Jesus para Lancellotti? A ver:

Nos últimos anos, estamos ainda mais íntimos de estratégias diversas a respeito da utilização política de Cristo, que se tornou para muitos, infelizmente, uma espécie de massa de modelar cuja forma é definida conforme a ocasião, o discurso, o partido, o projeto de lei. Nessa operação, muitas vezes, estão usualmente aquelas e aqueles que ostentam uma humanidade sob medida, uma humanidade prêt-à-porter, que sempre escolhe o corpo que melhor lhe cabe. Nela, Cristo é apresentado como uma espécie de coach, um cara que você precisa apenas ouvir e seguir as dicas, e assim alcançará o sucesso.

‘Nesse ato de modelar Cristo e entendê-lo enquanto coach, há também uma imensa e mal-disfarçada superioridade moral’.

Não conseguiu “vencer” as drogas? Não se esforçou o suficiente. Foi despejada? Idem. Se você não soube aproveitar esse Cristo da alta performance, volte para o fim da fila. Seu sofrimento é sempre causado por uma falha própria que esses grupos observam,  julgam e dão a nota. Não é exatamente religião; é bom ou mau desempenho. Aqui não existe passado, sociedade, coletividade: somos antes de tudo uma junção de histórias individuais divididas entre “perdedores” e “vencedores”.

O tuíte da deputada está preocupado com os últimos, os moradores (proprietários ou quem consegue pagar aluguel) e trabalhadores (quem faz o favor de ter um emprego), enquanto pessoas dependentes de crack estão zanzando por ali comendo a comida levada pelo padre e muitas vezes morrendo na contramão atrapalhando o tráfego.

Nesse ato de modelar Cristo e entendê-lo enquanto coach, há também uma imensa e mal-disfarçada superioridade moral. Os modeladores acham, por exemplo, que a “real” honestidade está com eles – por isso, não se sentem constrangidos em jogar um debate para a plateia sem estabelecer antes uma relação verdadeiramente dialógica com o destinatário de seu incômodo, como fez a deputada.

Há uma cena particularmente reveladora da superioridade moral observada na fala e na performance da professora de Direito: é quando ela chora no Senado Federal enquanto pede desculpas à ex-presidente Dilma Rousseff durante a votação final do impeachment, em 2016.  Com voz embargada, Janaína diz saber que lhe causou sofrimento, mas que “não podia se omitir”. “Eu peço que ela, um dia, entenda que eu fiz isso pensando também nos netos dela”.

Naquele momento, entre lágrimas, ela se autoconsagrava com o manto de heroína, de interventora moral da nação. Era aquela que, como Jesus, veio para salvar. Desta forma, assumia para si a prerrogativa de atuar pelo futuro dos netos, dos filhos e dos pássaros do Brasil. Quando os jornais noticiaram que a professora e o jurista Miguel Reale Jr. foram contratados pelo PSDB por R$ 45 mil para formular o pedido do impeachment, ela respondeu dizendo que, antes de tudo, agiu em nome de sua consciência e dos cidadãos indignados.

A indignação e a consciência, essas irmãs da honestidade. A indignação, esse sentimento que sempre transborda no peito dos seguidores de Cristo enquanto coach, esse Jesus orientado antes de tudo por uma moral, e não por uma humanidade. O Jesus da superior consciência, o que se preocupa com as crianças a caminho da escola nos Campos Elíseos, mas não necessariamente com as crianças cujos pais, doentes de crack, vivem nas ruas dali. Eles falharam, e quem mora e trabalha naquela região já não os aguenta mais. Nem Janaína e seu Jesus. Só resta esperar que estes dependentes, além de Lancellotti e seu Cristo, se recolham em um abrigo e comecem a se tratar.

 

Correção, 10/8, 10h46:
Janaína Paschoal é deputada estadual pelo estado de São Paulo, não federal. O texto foi corrigido.


DE SIMONE E SIMARIA A OTÁVIO MESQUITA: CELEBRIDADES RECEBERAM R$ 4,3 MILHÕES PARA FAZER PROPAGANDA PARA BOLSONARO, The Intercept Brasil

 À CPI da Covid, a Secom enviou 263 notas fiscais sobre “pagamento de cachê”, que juntas somam R$ 4.846.601,72. Entre esses documentos, o Intercept analisou 139 notas, que somam R$ 4,3 milhões. Foram considerados valores mais altos e desconsiderados pagamentos para emissoras locais com valores menores. Nas 263 notas sobre “pagamento de cachê”, não aparecem a TV Globo e afiliadas. A empresa é líder em audiência no país e um dos meios de comunicação que o presidente frequentemente ataca e chama de “lixo”.

No topo da lista de quem recebeu cachê estão Simone e Simaria. O governo pagou R$ 1 milhão para a dupla, que vendeu sua imagem para falar sobre o Combate à Violência Contra a Mulher.

No total, a Secom gastou R$ 1,7 milhão em celebridades para essa campanha. Os R$ 696 mil restantes foram distribuídos para apresentadores da Band (Datena e Catia Fonseca), da Record (Ana Hickmann, Luiz Bacci e Ticiane Pinheiro), da RedeTV! (Nelson Rubens) e do SBT (Lívia Andrade).

Top 5 do merchan bolsonarista
  • Simone e Simaria, dupla sertaneja – R$ 1 milhão
  • César Filho, apresentador da Record – R$ 591 mil
  • Ana Hickmann, apresentadora da Record – R$ 357 mil
  • Datena, apresentador da Band – R$ 174, 7 mil
  • Sikêra Júnior, apresentador da RedeTV! – R$ 120 mil

A prática do merchan, como a própria Secom esclarece em algumas notas fiscais, é “a contratação deste formato de mídia, no qual se utiliza da imagem/credibilidade do apresentador para divulgar um produto, marca ou serviço, implica além do custo de veiculação, conforme práticas comerciais dos veículos de comunicação, pagamento de valores referentes a direitos autorais/correlatos/cachês, normalmente estabelecido pela determinação percentual sobre o valor de veiculação”.

Precisamos de 5 mil novos parceiros para reagir ao Brasil de Bolsonaro.Ajuda Aqui!Precisamos de 5 mil novos parceiros para reagir ao Brasil de Bolsonaro.

Os pagamentos acontecem de duas maneiras. Ou diretamente aos CNPJs dos apresentadores, como nos casos de Sikêra Júnior, da Rede Tv!, Tino Júnior, da Record, e Marcelo de Carvalho, sócio e vice-presidente da RedeTV!, ou com pagamento por meio das emissoras. É o caso dos apresentadores da Record Ana Hickmann, César Filho, Tino Júnior, Ticiane Pinheiro e Marcos Mion; e da Band, Milton Neves, Datena e Catia Fonseca.

Hickmann-Print

O programa Hoje Em Dia em 24 de setembro de 2020. O tempo de 1 minuto e 11 segundos em que a ex-modelo segura uma nota de R$ 200 custou R$ 36 mil para os cofres públicos. A nota fiscal que documenta este pagamento indica que o governo desembolsou outros R$ 36 mil referentes ao mesmo merchan de Ana Hickmann em 15 de setembro. Essa ação publicitária de cerca de 2 minutos custou R$ 72 mil. 

Foto: Reprodução/Youtube

No caso da dupla sertaneja e dos influencers, as agências de publicidade que prestam serviço à Secom contrataram empresas que repassaram os pagamentos às celebridades. As notas não deixam claro o valor que vai exclusivamente para o bolso das celebridades e quanto fica para as empresas que intermediaram a venda. O SBT, vale lembrar, é comandado por Silvio Santos, sogro do ministro das Comunicações, Fábio Faria.

Merchan negacionista

Entre os pagamentos, foram direcionados R$ 746 mil para cachê das celebridades envolvidas na campanha sobre “cuidado precoce” – nome usado pelo governo para disfarçar a propaganda do falso tratamento precoce, que orientou o uso de cloroquina e outras drogas sem efeito contra o coronavírus. A maior parte do valor dessa ação foi distribuída entre influencers, R$ 352,6 mil, e radialistas, R$ 247,2 mil. As dezenas de locutores de rádio locais estão distribuídas por todas as regiões do país. Assim, a mensagem foi levada a públicos do interior, ouvintes de rádios locais.

Em janeiro deste ano, a Agência Pública já havia revelado que influenciadores digitais haviam sido contratados pelo governo na mesma campanha de “tratamento precoce”. No total, celebridades de Instagram receberam R$ 23 mil do governo pelo merchan em seus perfis.

Grana recebida pela campanha de 'cuidado precoce':
  • César Filho, da Record – R$ 93,6 mil
  • Sikêra Júnior, da RedeTV! – R$ 24 mil
  • Marcelo de Carvalho, da RedeTV! – R$ 10 mil
  • Milton Neves, da Band – R$ 7,2 mil
  • Operação Mesquita, programa do Otávio Mesquita no SBT – R$ 6,3 mil
  • Benjamin Back, do SBT – R$ 5,6 mil

Nas notas da Secom, o pagamento é feito através das empresas que têm contrato firmado com o governo: Profissionais de Publicidade Reunidos, Artplan Comunicações e Calia Y2 Propaganda. As três estão na mira da CPI e já tiveram seus sigilos fiscais quebrados.