quarta-feira, 11 de agosto de 2021

O papelão das Forças Armadas, Hélio Schwartsman, FSP

 Bolsonaro é um presidente fraco. Embora tenha transformado o voto impresso numa questão existencial, deve perder feio na votação dessa matéria, mesmo tendo entregado os melhores cargos de seu governo ao centrão para obter apoio parlamentar. A fim de desviar a atenção dessa derrota vexaminosa, Bolsonaro resolveu armar uma pirraça castrense. Convocou as Forças Armadas para um teatro patético, no qual finge estar por cima quando está por baixo.


Bolsonaro pode usar os militares dessa maneira? Penso que não. É verdade que a Constituição diz que o presidente é o comandante supremo das Forças Armadas, mas não é tão simples. Comandos, chefias e lideranças se exercem segundo regras, escritas e não escritas. Numa analogia caricatural, o presidente também é o "chefe" do Banco do Brasil, mas isso não lhe dá o poder de chegar a um caixa da instituição e requisitar-lhe o dinheiro. Se fizer isso e for atendido, ele e o caixa cometem crime.

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E qual a extensão dos poderes presidenciais sobre os militares? A regra geral é posta no artigo 84, XIII, da Carta, que estabelece, entre as competências privativas do presidente, a de "exercer o comando supremo das Forças Armadas, nomear os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, promover seus oficiais-generais e nomeá-los para os cargos que lhes são privativos". Se o constituinte tivesse querido atribuir ao presidente uma autoridade absoluta, do tipo "um manda e o outro obedece", teria parado no "exercer o comando supremo". Ao detalhar como se exerce esse comando, ele limitou os poderes do mandatário, que são restritos a nomear e promover. Se essa interpretação é a correta, como creio que é, isso significa que o presidente não pode dar ordens diretas à tropa nem aos generais.

Se as Forças Armadas se prestaram ao papelão da terça-feira, não foi por obediência devida, mas por golpismo ou pusilanimidade de seus oficiais-generais.


terça-feira, 10 de agosto de 2021

Governo libera postos para vender combustíveis de outras marcas, FSP

 


RIO DE JANEIRO

O governo decidiu antecipar-se a consulta pública da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis) e liberou a venda de combustíveis de outras marcas nos postos brasileiros por MP (medida provisória).

O texto libera ainda a venda de etanol diretamente das usinas para os postos, outro tema que vinha sendo debatido pelo órgão regulador. Em ambos os casos, as mudanças encontram resistência entre as maiores distribuidoras de combustíveis do país.

O lançamento da MP será feita nesta quarta (11), com presença do presidente Jair Bolsonaro. O MME (Ministério de Minas e Energia) defende que as medidas aumentarão a concorrência, beneficiando o consumidor final.

A MP trata da "tutela regulatória da fidelidade à bandeira", permitindo que os postos que exibam marca comercial de distribuidoras, como Shell, Ipiranga ou BR, possam vender combustíveis de outros fornecedores, desde que informado ao consumidor.

Ao anunciar consulta pública sobre o tema, em maio, a ANP defendeu que a fidelidade à marca da gasolina passaria a ser escolha do consumidor e não uma obrigação regulatória que dá hoje à agência função de fiscalizar contratos particulares.

Na época, o governo estimava que a medida poderia reduzir o preço da gasolina em até R$ 0,50 por litro, como resultado do aumento da competição.

A audiência pública da agência para discutir o tema teve fortes embates entre as empresas do setor e culminou com uma liminar obtida pelo Sindicom (Sindicato das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e Lubrificantes) suspendendo parcialmente o processo.

No pedido de liminar, o sindicato que representa as grandes distribuidoras alega que o tema foi discutido sem participação popular e que teve dificuldade de acesso a informações. A juíza federal Carmem Silva Lima de Arruda suspendeu o processo até que a ANP garanta acesso a todos os documentos.

As distribuidoras que se opõem à medida alegam que realizam investimentos nos postos e que a mudança abriria maior mercado a empresas que operam de forma irregular, seja com sonegação de impostos, seja com a venda de produtos de má qualidade.

Argumento semelhante é usado contra a venda direta de etanol aos postos, pleito defendido pelos produtores de cana-de-açúcar do Nordeste. Atualmente, os impostos sobre o etanol são recolhidos pelas distribuidoras. Com a venda direta, passariam a ser recolhidos pelas usinas.

Em 2020, quando abraçou a ideia, Bolsonaro disse que a venda direta representaria uma redução de R$ 0,20 por litro no preço do etanol, conta que é questionada pelo mercado de combustíveis.

A escalada dos preços dos combustíveis, que atingiram valores recordes em 2021, tem impactado a popularidade de Bolsonaro, que já cortou impostos federais sobre diesel e gás de cozinha, mas sem resultados no preço final dos produtos.

A alta nas refinarias, que acabou engolindo os descontos, reflete a recuperação do preço do petróleo e a desvalorização cambial, os dois principais indicadores usados pela Petrobras em sua política de preços.

Com a venda de combustíveis a preços historicamente elevados, a Petrobras registrou lucro de R$ 42,8 bilhões no segundo trimestre e decidiu antecipar a distribuição de R$ 31,6 bilhões em dividendos a seus acionistas. Maior sócio, a União ficará com R$ 9 bilhões.

Senado aprova texto-base que revoga Lei de Segurança Nacional, OESP

 Julia Affonso, O Estado de S.Paulo

10 de agosto de 2021 | 19h15

BRASÍLIA - O Senado aprovou nesta terça-feira, 10, o texto-base do projeto de lei que revoga a Lei de Segurança Nacional (LSN), remanescente da ditadura militar. A proposta também define crimes contra o Estado Democrático de Direito. A LSN foi usada pelo governo Jair Bolsonaro para investigar opositores e também pelo Supremo Tribunal Federal (STF) contra bolsonaristas. O projeto de lei foi aprovado, em maio, pela Câmara – no lugar dela, os deputados criaram a chamada “Lei do Estado Democrático”.

O texto aprovado pelos deputados se baseia em projeto apresentado à Câmara, em 2002, pelo então ministro da Justiça, Miguel Reale Jr. O constitucionalista também ajudou os parlamentares na atualização da proposta em tramitação.

Senado
Plenário do Senado Federal, em Brasília Foto: Dida Sampaio/ Estadão

O relator do projeto no Senado, Rogério Carvalho (PT-SE), afirmou que a aprovação da legislação "representará um dos mais importantes avanços democráticos dos últimos anos". 

"A Lei de Segurança Nacional estava submetida ao esquecimento quando, nos últimos tempos, foi recuperada do fundo da gaveta e foi promovida como instrumento preferencial de silenciamento do atual Governo", afirmou. Os senadores ainda vão votar destaques (sugestões de mudanças) ao projeto.

"Foram várias as tentativas de calar a crítica, com ações contra o influencer Felipe Neto e o cartunista Aroeira – e não somente eles; muitos outros jornalistas e manifestantes foram alvos de perseguição política apoiada por um diploma do foram alvos de perseguição política apoiada por um diploma do tempo da ditadura."

A LSN prevê pena de até quatro anos de prisão para quem difamar o chefe do Executivo, atribuindo a ele fato “definido como crime ou ofensivo à reputação”.  Sua última versão está em vigor no País desde 1983. Como mostrou o Estadão em março, o número de procedimentos abertos no governo Bolsonaro pela Polícia Federal,  com base na legislação para apurar supostos delitos contra a segurança nacional, aumentou 285% nos dois primeiros anos do governo atual em comparação com o mesmo período das gestões de Dilma Rousseff e Michel Temer. Entre 2015 e 2016 foram 20 inquéritos instaurados, enquanto entre 2019 e 2020, foram 77 investigações.

Entre os inquéritos abertos pela gestão Bolsonaro há os que se basearam no artigo 26 da lei, que prevê como crime calúnia e difamação dos presidentes da República, da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal Federal. Entre os casos recentes está a intimação do youtuber Felipe Neto por ter chamado Bolsonaro de “genocida”.