sábado, 15 de setembro de 2018

Marcos Sawaya Jank Estratégia para o açúcar e o etanol, FSP

Nosso programa é único, robusto e flexível; é hora de internacionalizá-lo

O Brasil perdeu a posição de maior produtor mundial de açúcar para a Índia, que neste ano vai produzir 35 milhões de toneladas, contra 30 MT do Brasil. Logo atrás do Brasil vem a Tailândia com produção de 15 MT e exportações de 13 MT.
Até 2010 navegamos solitários e imbatíveis no mercado mundial de açúcar, graças aos ganhos de produtividade ocorridos após a desregulamentação do setor nos anos 1990, à existência de forte demanda no mundo e à introdução da frota de veículos flex-fuel no Brasil em 2003. O etanol consome 50 a 60% da cana produzida.
Mas nuvens negras foram se acumulando no horizonte deste setor. A primeira foi a política inconsequente de congelamento dos preços dos derivados de petróleo no Brasil, que destruiu a rentabilidade da Petrobras e dos produtores de etanol. Felizmente essa política nefasta foi desmontada no governo Temer.
A segunda, mais sutil, é que a crise gerada pela falta de investimentos no setor a partir de 2010 incentivou concorrentes a expandirem a sua produção. Até 2000, a produtividade de açúcar por hectare da Tailândia e do norte da Índia (em Uttar Pradesh, principal estado produtor) era cerca de metade da alcançada pelo Brasil. Hoje ela quase se iguala à nossa.
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Complexo produtos de cana-de-açúcar em Uttar Pradesh, na Índia - Mustafa Quraishi/Associated Press
Enquanto ficamos esperando uma política pública decente para o etanol, que ainda não se materializou, nossos principais concorrentes nos alcançaram na produtividade da cana e na beterraba açucareira.
Ocorre que esses países concederam pesados subsídios e proteções aos seus produtores, como a fixação de preços garantidos para a cana-de-açúcar, elevadas tarifas de importação, incentivos para conversão de terras para cana e pesados subsídios para insumos, crédito, fretes e exportações.
Isso criou um "círculo vicioso" em que altos preços fixos de cana geram excedentes de açúcar, que são jogados no mercado mundial com o apoio dos Estados, derrubando os preços internacionais e gerando pressão por mais protecionismo.
O drama do setor sucroenergético brasileiro é que o etanol perdeu competitividade para a gasolina entre 2008 e 2017 e agora o açúcar perde mercado com a expansão acelerada da cana e da beterraba no mundo, turbinada por vários governos.
A solução seria criar um "círculo virtuoso" no qual os países direcionassem o seu excedente de cana-de-açúcar para produzir etanol, em vez de açúcar, seguindo a experiência brasileira. China, Índia e Tailândia fixaram metas de misturar 10% de etanol na sua gasolina, mas jamais criaram os instrumentos para cumpri-las. Se o fizessem, poderiam consumir 26 bilhões de litros de etanol por ano até o fim desta década, reduzindo a sua dependência por petróleo e as emissões de gases de efeito estufa, melhorando a qualidade do ar e gerando renda e emprego nos países. Nesse último mês, o governo da Índia sabiamente adotou diversas medidas nessa direção.
Sempre poderemos recorrer à OMC (Organização Mundial do Comércio) para questionar subsídios e proteções que não respeitam as regras multilaterais de comércio, mas os processos levam anos para serem concluídos e o resultado é incerto, e nem sempre aplicado.
Temos uma rica experiência para transmitir a esses países em termos de flexibilidade de conversão da cana (em açúcar ou etanol), mandatos obrigatórios de mistura de etanol na gasolina (hoje fixado em 27% no Brasil) e de carros flex que dão ao consumidor a opção de abastecer com gasolina ou etanol.
Nosso programa de etanol é único, robusto e flexível. É hora de internacionalizar essa experiência na Ásia, ajudando os nossos concorrentes a encontrarem uma saída virtuosa para resolver o principal fator que hoje destrói a rentabilidade global do setor açucareiro.
Marcos Sawaya Jank
Especialista em questões globais do agronegócio, trabalha em Singapura. É livre-docente em engenharia agronômica pela USP.

Governo já é incapaz de suprir país com investimentos, FSP

Injeção de capital em infraestrutura é alavanca para retomada e ferrovias impulsionam novo ciclo

Cláudio Frischtak
É provável que a greve dos caminhoneiros tenha sido o momento definidor da economia brasileira em 2018 —fez um governo já fragilizado reinstituir o controle de preços, cartelizar um setor que operava em um mercado altamente competitivo, reintroduzir os subsídios a combustíveis (poluentes) e ampliar a insegurança jurídica que caracteriza o ambiente de negócios no país.
No beco sem saída que se colocou, o governo mirou as razões imediatas da greve e passou por cima da causa primordial: a falta de investimentos em infraestrutura de transportes e a distorção na 
matriz —um país continental ainda dependente do modal rodoviário.
A evidência é inconteste.
Protesto de caminhoneiros na rodovia Regis Bittencourt em maio - Zanone Fraissat/Folhapress
O estoque de capital em infraestrutura é de 35% do PIB (Produto Interno Bruto), enquanto uma infraestrutura moderna —ainda que não de fronteira— supõe um estoque acima de 60% do PIB. 
Esta brecha é mais acentuada em transportes e saneamento.
No caso de transportes, investimos em média 0,67% do PIB em 2001-16, e 0,59% do PIB em 2017-18 (projetado), menos de um terço do que se estima necessário para uma infraestrutura de qualidade 
(1,96% do PIB anualmente por duas décadas).
É uma ilusão acreditar que o setor público será capaz de cobrir essa brecha, mesmo que os próximos governos consigam reconstruir as contas públicas por meio das reformas que deem viabilidade ao Estado cumprir suas funções essenciais.
Na margem, os recursos virão do setor privado.
Ao mesmo tempo, o reequilíbrio da matriz de transportes supõe a ampliação e integração dos modais ferroviário, hidroviário e dutoviário.
Destes, talvez o mais premente e de maior impacto sejam as ferrovias.
Em 2018 os investimentos em ferrovias devem se reduzir a R$ 5,6 bilhões, principalmente em função do atraso na renovação das concessões existentes e das novas licitações previstas, além das dificuldades legais de se licitar trechos menores, economicamente viáveis (os chamados “short lines”), sob o regime de autorização.
Uma vez superado esses gargalos de natureza legal e regulatória, há a expectativa de um surto de investimentos neste modal, seja pelos potenciais ganhos de eficiência, seja 
pela demanda reprimida.
O mais urgente é a renovação das concessões já existentes, uma discussão que vem se arrastando desde 2015, mas que parece caminhar para um desfecho ainda neste ano com base na lei 13.448 de 2017.
A solução encontrada, com o aval do TCU (Tribunal de Contas da União), é a extensão do contrato de concessão, tendo por contrapartida investimentos em novos ativos ferroviários, consistentes com o PNL (Plano Nacional de Logística), e sujeito a garantias de direito de passagem, facilitado pela ampliação de capacidade.
Este modelo é consistente com o interesse público: amplia-se a malha ferroviária tendo sua prioridade estabelecida tecnicamente, e em uma perspectiva de médio e longo prazo (isto é, do PNL).
E mobiliza-se o setor privado para financiar e executar projetos ferroviários complexos e de elevado custo, com retornos comprovados, e cujas outorgas de concessão —quando entregues ao governo federal e licitados— serão carreadas para ampliar o sistema de transporte.
Em certa medida a alternativa é a antítese do que foi feito no passado, quando recursos públicos escassos foram desperdiçados em projetos ferroviários mal concebidos e executados.
Cláudio Frischtak é sócio da Inter.B Consultoria, especializada em infraestrutura  e concessões públicas

sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Participação cidadã nas eleições, José Carlos Martins, pres. Cbic. FSP

Pequenas doações em conjunto podem ter impacto

José Carlos Martins, presidente da Cbic (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), em foto de 2015
José Carlos Martins, presidente da Cbic (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), em foto de 2015 - Zanone Fraissat - 4.ago.15/Folhapress
Estamos discutindo quem será o novo presidente da República, mas não haverá nenhum presidente que possa fazer mudanças sem apoio do Congresso. Isso é inerente à democracia. Por isso, o mais importante é elegermos um Congresso sintonizado com o interesse dos cidadãos, que efetivamente fiscalize o Poder Executivo e represente a sociedade.

Hoje, criticamos o Congresso, que está distante da sociedade e dos seus anseios. Proponho, neste momento, uma discussão sobre a representação no Legislativo: lá serão feitas as leis que traduzirão o país que queremos.

A grande novidade da eleição deste ano é a participação cidadã de todos os brasileiros no pleito. Não é da nossa cultura participar ativamente e depois cobrar aquilo que nos prometeram. Como faremos isso é a grande dúvida.

Precisamos da participação dos cidadãos, aqueles que se doam, que cobram, que exigem do seu representante a defesa dos interesses da sociedade; com transparência, com ética, com lisura no exercício do mandato. Falo do condomínio, do clube, do representante na escola, falo de entidades de classe, falo de representação política.

Pessoalmente, sempre defendi o voto distrital, pois ele é a menor distância entre o cidadão e seu representante. Somente ele permite que o eleitor médio lembre em quem votou e se seu eleito está desempenhando adequadamente seu mandato.

Mas não existe jantar sem alguém que pague a conta, este é um custo da democracia. Sabemos do desastre que foi a relação espúria entre algumas pessoas e o sistema político e não podemos mais aceitar isso. Está claro nas pesquisas que o Brasil deu um basta a esse modelo; no entanto o custo existe, e alguém terá que pagar.

Esse é o momento para refletirmos sobre isso: se uma empresa doar, poderá ter interesse na doação; se o recurso sair do setor público, diminuirá o dinheiro para demandas essenciais ao país, como segurança, saúde, educação etc. Como sair disso?

Convido a todos que participem desta eleição com ideias, com propostas, com cobranças, mas também com contribuições às campanhas dos bons políticos.

Se não queremos doação de empresas, se não queremos que esse custo saia do Orçamento, que tal nos agruparmos e fazermos pequenas doações para viabilizar as candidaturas que nós, cidadãos comuns, acreditamos? Vamos deixar para poucos fazerem isso? Depois vamos reclamar, de novo, que nossos políticos só atendem aos interesses de poucos?

Precisamos, todos os cidadãos de bem deste país, escolher um lado. Escolher um candidato e trabalhar por ele em nossas comunidades, em nossas redes sociais, junto aos nossos familiares, mas também com contribuições financeiras. 

Não se faz campanha sem dinheiro. É melhor que o recurso venha do cidadão, por meio de pequenas doações que não serão relevantes individualmente, mas no conjunto poderão significar a eleição ou não de um candidato.

É legítima a defesa de segmentos organizados, desde que com transparência e que não visem exclusivamente aos seus interesses, mas sim que estejam sintonizados com os interesses maiores do país. Hoje vivemos uma ditadura de corporações, pequenos grupos com grande poder de mobilização que, com isso, mantêm privilégios inaceitáveis.

O interesse das maiorias silenciosas e trabalhadoras precisa ser priorizado. Neste momento não há necessidade maior que emprego. Nossos candidatos ao Senado Federal e à Câmara dos Deputados estão se comprometendo com medidas que busquem aumentar a oferta de empregos? Ou estão somente defendendo o que todos já cansamos de ouvir?

Mobilizados podemos cobrar. Essa cultura ainda não existe em nosso país mas, nas suas campanhas à Presidência dos Estados Unidos, Barack Obama recebeu doações de milhões de cidadãos americanos.
Assim, conseguiu seus dois mandatos. Queremos ou não construir um novo país? Queremos deixar um Brasil melhor para nossos filhos e netos?

Conclamo a todos para refletir sobre isso.

A hora é agora!
José Carlos Martins
Engenheiro civil e presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic)