Os micróbios que vivem no nosso corpo podem influenciar nosso comportamento
Com essa idade, aprendi que, mesmo sem estarmos doentes, somos habitados por bactérias, vírus, parasitas e fungos, que prosperam dentro de nosso organismo.
E me interroguei: esses micróbios, além de fazerem (eventualmente) com que a gente adoeça, não estariam dentro de nós como pilotos numa imensa espaçonave? Apesar de acreditarmos em nossa autonomia, quem sabe eles não estejam, de fato, no volante de nossa vida?
Justamente, os autores da pesquisa, Chris Reiber, J. Moore e outros, queriam saber se um vírus pode mandar em nós -não só alterar nosso humor, mas realmente influenciar nosso comportamento.
Eles descobriram que os infectados pelo vírus da gripe, durante o período da incubação (em que são contagiosos, mas não apresentam sintomas), tornam-se especialmente sociáveis. Em outras palavras, os infectados parecem agir no interesse do vírus, que é o de contagiar o máximo possível.
Claro, não é que os micróbios se sirvam da gente para levar a cabo um "plano" maquiavélico. Mas se entende, com Darwin, que um vírus que nos torne sociáveis durante a incubação só pode se dar bem na seleção natural, pois ele se espalhará facilmente. Ou seja, os micróbios mais eficientes seriam os que conseguem nos usar em seu interesse próprio, os que nos transformam em seus súcubos.
O que sobraria de nossa "autonomia" se todos os micróbios enquistados no nosso organismo influenciassem (silenciosamente) nossos pensamento e comportamento?
Kathleen McAuliffe, na "The Atlantic" de março (http://migre.me/8fwvb), conta a história de Jaroslav Flegr, um cientista que, há 20 anos, pretende que um parasita, o Toxoplasma gondii, manipule e transforme os que ele infecta.
O hospedeiro definitivo do Toxoplasma gondii é o gato, em cujo corpo o parasita se reproduz sexualmente. Seu hospedeiro intermediário típico é o rato, que se infecta ao ingerir o Toxoplasma (direta ou indiretamente) nas fezes do gato e, logo, ao ser comido por um felino, leva o parasita de volta para seu hospedeiro definitivo.
Agora, o Toxoplasma pode infectar qualquer mamífero, enquistando-se no tecido muscular e no cérebro. Nos humanos, ele é presente em 55% dos franceses (comedores de carne crua -claro, de boi infectado) e em 10 a 20% dos norte-americanos. Em tese, pouco importa, pois o Toxoplasma só seria perigoso na gravidez, quando produz malformações fetais. Mas será que esse é seu único efeito?
Há mais de uma década, descobriu-se que o Toxoplasma altera o comportamento dos ratos infectados, tornando-os atrevidos e fãs do cheiro da urina de gato (de que normalmente eles fugiriam). Ou seja, o Toxoplasma transforma o rato numa presa mais fácil para o gato, no estômago do qual o parasita quer acabar sua viagem.
Outra surpresa. Nos ratos (e só neles), o parasita pode ser transmitido por via sexual; ora, verifica-se que os ratos machos infectados são inexplicavelmente mais desejáveis aos olhos das fêmeas.
Um parasita capaz de influenciar o cérebro do rato, seu hospedeiro intermediário preferido, não teria efeito algum quando se instala no nosso cérebro?
Para começar, o Toxoplasma parece produzir em nós alguns efeitos parecidos com os que ele produz nos ratos: por exemplo, muitos humanos infectados passam a achar agradável o cheiro da urina de gato. Nada dramático: a gente é raramente comido por gatos (mas resta a pergunta: se você adora gatos, é porque gosta mesmo ou porque carrega o Toxoplasma gondii no seu cérebro?).
Há mais: a presença do Toxoplasma gondii no cérebro alavanca a produção de dopamina, um neurotransmissor cujo excesso é um dos fatores no conjunto de causas possíveis da esquizofrenia (http://migre.me/8fxYX).
Enfim, o fato é que estamos começando a descobrir que os micróbios aparentemente inócuos que vivem no nosso corpo podem influenciar nosso comportamento.
Não acredito que sejamos os títeres de germes, parasitas, fungos e vírus, mas, certamente, o ambiente que nos constitui e determina não é só o das interações com nossos semelhantes. É também o de interações misteriosas com seres que sequer enxergamos. Inquietante, hein?
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