10 de outubro de 2021 | 05h00
Especial para o Estadão
De uns tempos para cá, é cada vez mais comum as pessoas postarem nas redes sociais fotos e selfies em lugares variados com a legenda “meu escritório é na praia”. Mas, diferentemente do autor da frase – o cantor e compositor Chorão, que viveu grande parte da vida na Baixada Santista –, essas pessoas se referem ao fato de que, com o trabalho remoto, tornou-se possível viver em qualquer lugar, desde que haja uma boa conexão de internet. Esse movimento ficou conhecido como nomadismo digital.
Segundo um levantamento do site Booking.com feito com 20 mil viajantes em 28 países, 43% dos brasileiros estão procurando reservas em lugares onde eles também possam trabalhar e 58% vão estender suas viagens de trabalho para aproveitar o tempo livre. Diana Quintas, sócia no Brasil da empresa de migração Fragomen e vice-presidente da Abemmi (Associação Brasileira dos Especialistas em Migração e Mobilidade Internacional), diz que há hoje cerca de 35 milhões de nômades digitais no mundo, e esse número deve chegar a 1 bilhão até 2035.
“Países onde os brasileiros podiam ficar até 6 meses como turistas, como Portugal, eram os mais procurados. Entretanto, com países criando vistos específicos para nômades digitais, onde a pessoa pode ficar até 2 anos com benefícios fiscais, como a Costa Rica, as escolhas têm mudado”, ela afirma, contando que a Estônia foi a primeira a criar um visto do tipo, ainda em 2019. Desde então, 20 países já possuem vistos voltados para esse público, sendo que dez deles estão na América Latina e no Caribe.
A especialista fala também que o perfil dos nômades digitais mudou. Se antes eram pessoas que não tinham raízes no trabalho, agora o grupo é diverso, formado por profissionais de diferentes cargos, setores e níveis, que trabalham de forma remota e viajam em busca de uma melhor qualidade de vida e acesso a experiências diversas.
Possibilidades
Para a empreendedora e escritora Bel Pesce, de 33 anos, que vive como nômade digital desde os 18 – quando o termo sequer existia –, as possibilidades do mercado imobiliário para o “anywhere office” são infinitas. “Eu sou uma pessoa que ama experiências diferentes. Amo morar com amigos, experimentar um hotel que acaba de abrir, procurar viver com pessoas diferentes por um tempo”, diz. “Eu gosto de desbravar e adoro a flexibilidade.”
Bel passou nos últimos tempos por cidades dos Estados Unidos como Seattle e Nova York, ficou um período em Salvador e na ilha baiana de Boipeba e, mais recentemente, antes de ir para os Emirados Árabes, onde está agora, morou cerca de três meses em São Paulo, experimentando mais de 20 tipos de estadias em 10 regiões diferentes da cidade.
Entre elas, ela cita as unidades da Casai, plataforma mexicana de locação flexível que está também no Brasil. A empreendedora fala que, ao mesmo tempo em que há uma padronização bem-vinda nas coisas que funcionam, como a tecnologia e o design, tanto os apartamentos com diversos quartos quanto os estúdios têm o charme do inusitado – um dos grandes apelos para nômades digitais. “Tudo é muito sinestésico, até a surpresa de você chegar na sua casa e ter uma curadoria que eles fazem de produtos locais. O xampu e sabonete com elementos brasileiros, a cerveja artesanal, o chocolate”, diz.
Liberdade
Outro que adotou o nomadismo digital como estilo de vida é o arquiteto, publicitário e empresário Gabriel Juarez, de 27 anos. “Isso vem desde a minha adolescência. Eu sempre fui muito independente em relação a laços familiares”, diz. Após morar por quase 10 anos nos Estados Unidos, onde passou por três Estados diferentes (Califórnia, Texas e Nova Jersey), ele conta que percebeu que estar em um único lugar não fazia sentido para ele.
De volta ao Brasil, em 2019, Juarez decidiu morar em um coliving da Yuca em São Paulo. Na sequência, foi para um apartamento individual da mesma empresa, só que em um bairro diferente. “Eu acredito que tudo muda o tempo todo, a vida é flexível e não dá para viver de certezas. Eu não quero ficar preso, não sei o que quero fazer daqui a três meses, um ano”, enfatiza. “Mas esse estilo de vida de conhecer cada vez mais pessoas, culturas e cidades só é possível com a tecnologia como meio, porque é com ela que conseguimos ter acesso a trabalho, notebook, celular, wi-fi, serviço de banco em aplicativo.”
A nutricionista Letícia Lanzi, de 31 anos, tem residência fixa em Balneário Camboriú (SC), mas já faz 6 meses que decidiu experimentar a vida também em São Paulo. Especialista em nutrição esportiva, ela fala que sempre assessorou muita gente da internet, como youtubers, e com isso já tinha o costume de fazer tudo online.
Acabou não vendo sentido em ficar no consultório da cidade natal, onde estava havia quase 10 anos, já que podia fazer os próprios horários com mais liberdade. Agora, ela se divide em períodos flexíveis entre as duas cidades. Para suas estadias na capital paulista, costuma se hospedar na Housi, plataforma de serviços de moradia por assinatura presente em mais de 50 cidades brasileiras. “Acabo associando tudo que eu mais gosto, que é a nutrição, o life style, passear e me relacionar com pessoas”, explica.
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